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O ensino profissional deve estar aliado às empresas, sublinha Albuquerque

Em entrevista ao Económico Madeira, o Presidente do Governo Regional da Madeira, Miguel Albuquerque, além de falar nas mais-valias da ligação entre o ensino profissional e as empresas, diz que quer criar um cluster de empresas tecnológicas na Madeira. O único impasse é o Estado português.
  • Foto DR
20 Junho 2019, 07h45

Miguel Albuquerque defende que não vale a pena andar a fazer cursos profissionais com professores muito formais. Em vez disso, mais vale ligar o ensino profissional às próprias empresas. Elas é que sabem quais são as prioridades numa empresa e as tecnologias em vigor.

Como é que a Madeira evoluiu nestes últimos anos?

Nós estamos a crescer a 2,3% e queremos crescer mais, mas, obviamente nós temos aqui um handicap: estamos muito condicionados por um quadro legislativo nacional complicado.

O que é que era preciso mudar?

Vou dar um exemplo simples. Um dos problemas que nós temos no registo de navios é que os grandes navios que estão registados, quando passam ao largo da Somália, precisam de ter guarda armado a bordo por causa da pirataria ao largo nacional. Estamos há dois anos, vou repetir, dois anos e tal à espera de uma autorização de uma legislação de uma portaria a nível nacional, porque já existe em todos os registos europeus e em Portugal ainda estamos à espera ao fim de dois anos para resolver isto.

Isso é o Ministério do Mar?

É um ministério qualquer, daqueles milhões de ministérios que tem para lá. Aquilo está tudo engonhado. Tem aqui um bom exemplo de um problema que nós temos de resolver.

Dê-me mais um exemplo.

Como é que é possível nós termos neste momento uma situação em que, por exemplo, nós queremos fazer agora, e vamos avançar, se bem que estamos muitas vezes dependentes do quadro nacional, uma empresa em meia hora. Mas tem um conjunto de burocracias a nível nacional que é um inferno. Ou seja, nós estamos emaranhados num quadro legislativo complicadíssimo. Se dissermos a um investidor para vir a Portugal, a primeira coisa que ele vai ver é quanto tempo é que demora o processo judicial, e, quando lhe disserem que o processo judicial em média, em Portugal, para resolver um problema demora um ano ou dois anos, uma simples execução… É extremamente complicado. Não há segurança jurídica nenhuma para investir em coisa nenhuma.

Quanto ao Centro Internacional de Negócios da Madeira (CINM), aceitaria uma solução que passasse por ter mais autonomia fiscal para a Região, em troca de deixar cair o Centro?

Deixar cair um centro… Agente quando tem as coisas nunca deixa cair, porque isso é uma estupidez. O que é preciso é ter novas áreas de baixa redução fiscal, porque uma região ultraperiférica como a Madeira precisa, na verdade, de ter atratividade. Uma das formas de ter atratividade é ter reduções fiscais e quadros de redução fiscal para um conjunto de atividades, com efeitos multiplicadores bastante vastos na economia. Vou dar um exemplo, nós podíamos, eventualmente, ter um conjunto de atividades, nós estamos a criar, e vamos ter agora uma zona, que está a correr bem, que é as empresas tecnológicas. Duas das grandes empresas tecnológicas, aliás, três nacionais, estão aqui sediadas na Madeira e nós queremos criar um cluster, e estamos a criar, de atratividade e conectividade entre estas grandes empresas na Ribeira Brava e as grandes empresas tecnológicas mundiais.

Como?

Porque um dos problemas que a Europa teve nos últimos cinco anos, e Portugal poderia ter aproveitado, mas isso temos que reforçar uma maior ligação aos Estados Unidos, é que a Europa neste momento atrasou-se na área tecnológica. As grandes empresas tecnológicas, que é quem vai definir a economia mundial, estão, a maioria delas, sediadas nos Estados Unidos, pelo menos 17 delas estão nos Estados Unidos e tem o problema da China, mas a China não deixa de ser um problema porque é um estado totalitário, é autoritário, isso é um problema.

Mas nessa tentativa de criação do cluster já há grandes empresas norte-americanas que estejam…

Não, temos de fazer o contacto, mas é preciso haver uma política nacional para as atrair, porque não há política. Vejam, quando se trouxe a Autoeuropa foi um esforço concertado do Governo na altura para trazer uma empresa fundamental para o Produto Interno Bruto português.

Isso é uma crítica direta ao Primeiro-Ministro?

Não. É uma crítica às políticas do país, não vamos personalizar as questões.

Ou seja, é uma questão crónica do país?

Não é uma questão crónica, é uma questão de vermos o que é que a gente quer. O grande objetivo do país deve ser produzir riqueza, os portugueses terem mais riqueza, terem mais rendimento, viverem melhor, terem um Estado mais eficaz. Mas para terem um Estado mais eficaz e terem mais dinheiro no bolso é preciso mudar uma cultura e essa cultura só se muda através de uma concertação de políticas estratégicas, e as coisas não se fazem em cima do joelho. Vou dar um exemplo, porque é que um grande número de investimentos em aquacultura em Portugal falharam todos e o nosso não falhou? Porque nós definimos em 94 e criámos um centro de pesquisa aqui na Madeira, na Calheta, o Centro de Maricultura da Calheta, que é dos mais avançados hoje a nível de investigação científica. Ou seja, hoje produzimos quatro espécies na Madeira sem nenhuma falha, porque foram testados desde 94, fez-se experiências para ver o habitat, a alimentação dos peixes juniores, como é que se desenvolvem, os seus diversos estados, portanto, os índices de mortalidade aqui do peixe em aquacultura são reduzidos, porque tem uma base científica que é desenvolvida desde 94 e que permite hoje alavancar investimentos com segurança pelas grandes empresas. Um dos principais investidores aqui na Madeira é o Pingo Doce. E o que é que é preciso? Nós temos de ter políticas com princípio, meio e fim. Mesmo quando a gente está a falar aqui das empresas tecnológicas, nós aqui na Madeira já introduzimos a robótica nas escolas secundárias e nas primárias. A robótica já está introduzida na maioria das escolas porque sabemos que através da robótica os alunos têm uma noção e começam a familiarizar-se com as matemáticas aplicadas, porque cada movimento do robô é uma fórmula matemática. Portanto é uma forma de eles estarem ligados às tecnologias e nós hoje temos resultados nas matemáticas excecionais aqui na Madeira, porque uma coisa é estar num quadro a dar matemática, outra coisa é ligar a matemática à realidade concreta. Vou dar outro exemplo, muitas das áreas de formação profissional nós já fazemos com as empresas. Por exemplo, pedimos à ACIN para dar um curso de formação profissional. Como a tecnologia evolui rapidamente, pedimos e fazemos parcerias com as próprias empresas tecnológicas para elas próprias darem a formação em função daquilo que são as prioridades das empresas tecnológicas e daquilo que é a tecnologia que está em vigor. Porque se fizermos um curso muito formal com professores e não sei quê, quando saírem do curso essa tecnologia já está ultrapassada, portanto é preciso fazer uma ligação entre o ensino profissional e as próprias empresas.

Portanto o caminho é cada vez mais de adaptação?

É fazer um pouco como os alemães fazem. Ou seja, é as empresas estarem ligadas e serem parceiras da formação

E em termos políticos como é que se pode fazer essa adaptação?

Através de instrumentos de candidatura das próprias empresas, isso é uma questão de ligação.

Leia a entrevista a Miguel Albuquerque na edição de 07 de junho de 2019 do Económico Madeira.

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