É inacreditável a forma como a maioria dos partidos políticos com assento parlamentar aprovou uma lei à medida das suas necessidades, a poucos dias do Natal e com a discrição possível que a lei permite. Há uma ironia triste nesta constatação: os principais partidos portugueses não se entendem sobre as reformas estruturais de que o país necessita para se tornar mais justo, competitivo e moderno, mas os consensos partidários passam subitamente a ser possíveis quando o que está em causa é o seu próprio modelo de financiamento.

Mas o principal problema da nova lei do financiamento partidário não está na alteração aos limites de donativos (embora questionável) ou na possibilidade de dedução do IVA em todas as atividades partidárias. Está antes na forma pouco transparente como estas medidas foram discutidas e aprovadas. A situação chegou ao ponto de não existirem atas das reuniões e de a exposição de motivos do diploma nem sequer referir os pontos polémicos da lei. “Alterações pontuais cuja introdução se tornou necessária”, lê-se nessa introdução.

É sobretudo esta forma de agir que constitui motivo de escândalo e descredibiliza a classe política aos olhos dos cidadãos que é suposto servir. Trata-se do ‘modus operandi’ próprio de um cartel que domina um mercado e não está interessado em abrir a porta à concorrência, seja ela externa ou interna. Assim se explica a decadência de um grande partido como o PSD, que nos últimos anos não foi capaz de gerar novos líderes que se apresentassem às eleições internas de janeiro. Dá que pensar: a escolha está limitada a dois homens que já eram “papabile” no século passado. Um deles até já foi primeiro-ministro. Não estão em causa a honestidade e a competência das pessoas, mas tudo isto faz lembrar o politburo da velha União Soviética, com as suas esfíngicas figuras alinhadas no cimo dos muros do Kremlin, a verem a tropa marchar, ano após ano, por décadas a fio.

Porém, não tenhamos ilusões: sem partidos políticos não existiria democracia parlamentar. E sem democracia parlamentar passaríamos a ter uma ditadura das maiorias. Isto no melhor dos cenários.

Por isso, o debate sobre o financiamento dos partidos políticos deve ser feito com a consciência de que o radicalismo e o populismo são maus conselheiros. Precisamos de um debate sério, alargado à sociedade civil, sobre o financiamento dos partidos e sobre as regras de transparência que devem ser seguidas. Sem leis feitas às escondidas e sem medo de falar abertamente sobre um assunto que, embora não dê votos, é fundamental para a nossa democracia.

A democracia tem custos, mas os outros regimes têm custos maiores.

Nota: Em nome de toda a equipa do Jornal Económico, desejo a todos os nossos leitores, parceiros e anunciantes um excelente ano de 2018.