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“O Governo vai levar-nos à catástrofe”. Médicos suecos exigem medidas mais rigorosas para conter o vírus

“Existem sinais de uma taxa de duplicação superior à de Itália”, conta a imunologista sueca que critica a falta de medidas de restrição no país. Governo pede aos suecos que se comportem “como adultos” e que não espalhem “pânico ou boatos”.
  • DR Jonathan Nackstrand/AFP via Getty Images
31 Março 2020, 14h55

A pandemia global  da Covid-19 pôs um travão nas economias mundiais, confinou milhões de pessoas em todo o mundo às suas casas e encerrou maioria dos estabelecimentos. Porém, a realidade vivida na Suécia é uma exceção à regra. A resposta dos suecos ao avançar da pandemia contrasta em toda a linha com as medidas que se têm multiplicado um pouco por todo o mundo.

Face a esta discrepância, o primeiro ministro, Stefan Löfven, pediu aos suecos que se comportem “como adultos” e que não espalhem “pânico ou boatos”.

O pânico, porém, é exatamente o que muitos elementos da comunidade médica e científica da Suécia estão a começar a sentir. Numa petição assinada por mais de dois mil médicos, cientistas e professores na semana passada – incluindo o presidente da Fundação Nobel, Carl-Henrik Heldin – pede-se ao governo que sejam introduzidas medidas de contenção mais rigorosas para estancar a propagação do vírus.

“Não estamos a testar o suficiente, não estamos a rastrear, não estamos a isolar o suficiente – o vírus anda à solta”, contou Cecilia Söderberg-Nauclér, investigadora de imunologia do Instituto Karolinska, ao “The Guardian”. “[O governo] vai-nos levar à catástrofe.”

Segundo os dados do Worldometer, o país da Escandinávia tem nesta altura 4.435 casos positivos da Covid-19 (mais 407 que ontem) e 180 vítimas mortais, face a uma população semelhante à portuguesa, sempre à volta dos 10 milhões de habitantes.

Neste momento, no país escandinavo, só os liceus e as universidades estão encerradas. Até aos 16 anos, todas as crianças continuam a ir à escola diariamente e sem qualquer constrangimento. Concertos e grandes eventos desportivos foram cancelados, as manifestações estão proibidas por ultrapassarem precisamente o limite das 50 pessoas, mas os centros comerciais e hipermercados permanecem abertos. Cafés, restaurantes e bares funcionam normalmente, sendo que a única limitação é o serviço de bar, que está proibido, com os estabelecimentos a disponibilizarem apenas serviço diretamente à mesa. As fronteiras permanecem abertas, ao contrário do que acontece nos países vizinhos, Noruega e Dinamarca. E os únicos voos cancelados são os das companhias aéreas que reduziram e eliminaram ligações. Não há, para além disso, qualquer indicação de uma quarentena obrigatória para estrangeiros que cheguem ao país. Só pessoas recém-chegadas que demonstrem sintomas têm de ficar em isolamento.

Depois da quarentena imposta no Reino Unido na semana passada, a Suécia é dos poucos países europeus que ainda não implementou uma quarentena encorajada e generalizada.

A resposta do governo

Anders Tegnell, epidemiologista-chefe da Suécia, que lidera a gestão desta crise no governo, defende uma estratégia de mitigação: permitir que o vírus se espalhe lentamente, sem sobrecarregar o sistema de saúde e sem recorrer a restrições draconianas. Apenas pede que não chame à medida “imunidade de rebanho”, uma frase que Tegnell e as autoridades se recusaram firmemente a usar.

Tegnell explica que a rejeição da ideia de encerrar fronteiras e decretar a quarentena obrigatória baseia-se no facto de isso “cansar o sistema”. “Não podemos manter o bloqueio durante meses. Seria impossível”, cita o jornal britânico as declarações do especialista.

“O governo acha que não pode parar, por isso decidiram deixar as pessoas morrer”, contra-argumentou Söderberg-Nauclér. “Não querem ouvir os dados científicos que são apresentados. Confiam cegamente na Folkhälsomyndigheten [Agência de Saúde Pública], mas os dados que têm são fracos – são embaraçosos”, sublinha.

“Existem sinais de uma taxa de duplicação [de contágio] superior à de Itália. Estocolmo terá uma grave escassez de recursos nos cuidados intensivos em breve e [o governo] não entende que até então será tarde demais para agir. Tudo isso é muito perigoso”, apela a imunologista.

Embora exista uma constante reavaliação da situação, o conselheiro do governo diz que a Suécia tem a situação sob controle. “Acreditamos que já temos as medidas mais importantes em vigor. Claro, talvez tenhamos que fazer mais coisas, mas ainda não chegámos lá. ”

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