Há um mal-estar na sociedade portuguesa. Há um sentimento de um bom momento de crescimento económico que pode acabar rapidamente. Há uma frustração porque todos os progressos não foram sentidos pela sociedade, apenas por alguns. Há uma convicção de que há negócios a florescer mas que apenas estão a beneficiar alguns. Há uma clara convicção de impunidade para os políticos, que estão longe de perceber o que é ética na política e serviço público.

Enfim, há um claro desassossego entre os portugueses. Não o manifestam pela convicção de que quanto mais cedo exigirem soluções estruturantes, mais cedo os problemas se transformarão em pesadelos e, por isso, à boa maneira lusa o melhor é ir deixando correr.

Toda esta estória vem a propósito de pessoas que querem fazer algo diferente e que fazem manifestos de missão para reformar a sociedade, mas depois vem o balde de água fria. Lembremos o recente caso do dirigente bloquista, mas anteriormente houve casos no desporto, como Bruno de Carvalho, que veio salvar o Sporting e combater as elites, e acabou “corrido” pela massa de adeptos. Ou ainda o exemplo de organizações como a geringonça que governa o país e que se vai adaptando às necessidades e aos jogos dos interesses dos três partidos que a integram.

Ora, este tipo de comportamento, quando detetado pelo cidadão, constitui uma matéria-prima altamente inflamável, parafraseando o dirigente socialista Daniel Adrião. É uma boa matéria de ignição em política e que um “salvador” consegue facilmente capitalizar. O rastilho está cá, apenas precisa de ser acionado e isso pode fazer-se com um dirigente populista de direita ou de esquerda. A maior dúvida do momento é perceber que rastilho pode criar Pedro Santana Lopes que, contra tudo e todos, abandonou o PSD, rejeita juntar-se a um movimento já constituído, o Democracia 21, e vai querer recriar um PPD tendo Sá Carneiro como ídolo. Será que consegue? Apenas umas eleições poderão aferir da sua capacidade de se posicionar no mercado da política dos descontentes. Existe um descontentamento face ao establishment e há uma pré-disposição da sociedade portuguesa para quebrar a amnésia em que está envolvida.

O “D. Sebastião” que se espera terá de ser populista, mas não necessariamente eurocético, até porque os portugueses sempre se deram bem com a UE, e terá que garantir mais de 1% ou 2% do eleitorado para fazer a diferença. Terá de ser um movimento capaz de influenciar e mesmo de integrar um governo reformista. Terá de ter um discurso fora do sistema e aproveitar o facto dos partidos mais à esquerda e mais à direita já estarem “queimados” por alinharem nas políticas dos dois grandes do arco da governação. Terá de ser um partido de experiências feitas por quem é impoluto. Terá de ter um resultado que faça dele (o novo partido) uma peça relevante para governar. As eleições europeias são a melhor experiência para testar qualquer novo partido que possa aparecer.