Marcelo Rebelo de Sousa voltou a falar da crise na comunicação social. Infelizmente voltou a não trazer nada novo, nada de prático e, por muito boa vontade que possa ter, voltou a sugerir medidas pouco exequíveis e a ignorar algumas das principais causas da situação de emergência que o setor atravessa.

Não é preciso trabalhar na comunicação social para reconhecer que há problemas graves. Tal como o Presidente da República referiu, de ano para ano vemos jornais, rádios e grupos de media a fechar. Mesmo quando não fecham, ficam sem meios suficientes para cumprir a dupla missão crucial de confortar os aflitos e afligir os confortáveis, tal como a definiu Mr. Dooley, um bartender fictício que protagonizava uma coluna satírica no Chicago Evening Post no final do século XIX.

Marcelo Rebelo de Sousa falava no evento do lançamento de um programa do “Público” para dar acesso gratuito a assinaturas do jornal a estudantes universitários. Incentivar os jovens a ler jornais é certamente um passo certo, mas ao contrário do que o Presidente afirmou não é nova. Vários jornais já o fazem há alguns anos, incluindo o Jornal Económico em parceria com 18 instituições de ensino superior. A iniciativa do “Público” tem o apoio de nove empresas privadas, que aparentemente podem escolher as instituições e os cursos cujos estudantes podem beneficiar do projeto.

O Presidente aproveitou, no entanto, para dizer que “isto que é feito pelos privados” também deve ser feito pelos poderes públicos, reiterando o apelo ao apoio estatal ao sector, que havia feito antes das eleições. Agora, foi mais direto ao pedir que sejam incluídas medidas no Orçamento do Estado. Marcelo não quis entrar em pormenores, citou só uma medida, o porte pago, e até admitiu que são medidas “pequenas”.

Sim, senhor Presidente, tendo em conta a extensão dos problemas, essas medidas são pequenas, panaceias até.
O chefe de Estado aproveitou também para praticar o seu gosto de emitir alertas. Apesar de não falar em medidas concretas, avisou que os apoios não sejam favores, concedam privilégios e não financiem ou comprem fidelidade política dos media.

O elefante na redação que o Presidente ignorou está precisamente aí. Uma das grandes causas da situação trágica na qual a comunicação social se encontra em Portugal é a interferência. Grandes grupos privados já foram indevidamente influenciados por poderes políticos ou financeiros. Não preciso de dar exemplos, todos sabemos quais são. O resultado não foi, e não está a ser, bom: os meios são dedicados a agradar quem ‘apoia’’, a falta de isenção leva à perda de credibilidade e os leitores e ouvintes desertam.

O alerta que o Presidente devia dar é este. Apelar aos poderes políticos e financeiros para não pressionarem as administrações dos órgãos. Alertar estes administradores que têm responsabilidades. No fundo, avisar que quando os interesses se metem entre os jornalistas e o público quem perde é a democracia.

Claro que nem todos os problemas do setor advêm daí. Os meios de comunicação social continuam a tentar reagir às alterações tecnológicas e a perceber como podem continuar a gerar receitas num mundo de notícias gratuitas.

O crescente poder de gigantes como a Google ou a Facebook na distribuição de notícias não entrou no discurso do Presidente. É pena, porque aí também precisamos de apoio e, porventura, de alguma proteção.

Isso, sim, seria elevar a discussão para um patamar superior.