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O que concluiu o relatório preliminar da CPI ao NB sobre a Resolução do BES?

O legado do BES estava sobreavaliado no balanço de abertura e o Novo Banco nasceu com capital insuficiente, são algumas das conclusões do relatório preliminar da Comissão Parlamentar de Inquérito.
20 Julho 2021, 14h15

No que se refere ao período da Resolução e da constituição do Novo Banco o relatório preliminar da Comissão Eventual de Inquérito Parlamentar às perdas registadas pelo Novo Banco imputadas ao Fundo de Resolução, a que o Jornal Económico teve acesso, tira várias conclusões. A mais relevante é a insuficiência de capital inicial.

Recorde-se que na CPI foram abrangidos quatro períodos: o “período antecedente à resolução e relativo à constituição do NB [Novo Banco]”, o “período antecedente e relativo à alienação”, o “período após alienação” e ainda pretende “avaliar a atuação dos governos, BdP [Banco de Portugal], FdR [Fundo de Resolução] e Comissão de Acompanhamento no quadro da defesa do interesse público”.

A resolução do BES e constituição de um banco de transição, nos termos da BRRD [Bank recovery and resolution directive], foi a primeira experiência no quadro europeu, revestindo-se, assim de uma natureza experimental e que não mereceu continuidade, contextualiza o relatório da autoria do deputado do PS, Fernando Anastácio.

Factos preliminares à medida de resolução 

Os elevados prejuízos verificados pelo BES no final do primeiro semestre de 2014, que ascenderam a 3.577 milhões de euros, quando o expetável eram cerca de 1.500 milhões de euros, assim como a notificação promovida pelo BCE ao BES e ao BdP de que iria retirar ao BES o estatuto de contraparte, com as gravosas consequências financeiras dessa decisão e a ponderação que foi feita sobre a existência de riscos sistémicos, no caso, do colapso desordenado do BES e, ainda a inexistência, no momento, de alternativas à liquidação ou à resolução, são factos que condicionaram a decisão de resolução por parte do Banco de Portugal.

A decisão tomada pelo BdP, no dia 3 de agosto de 2014, de aplicar a medida de resolução ao BES, criando um banco de transição, nos termos da BRRD, o denominado “Novo Banco”, está fundamentada na relevância que a instituição BES tinha no sistema bancário e no financiamento da economia; na existência de risco sério de colapso deste banco, que acarretaria risco sistémico, pondo em causa o sistema de pagamentos nacional e o sistema financeiro; na proteção de clientes depositantes e da estabilidade financeira.

“A medida de Resolução teve ainda como pressupostos da sua determinação a impossibilidade de recapitalização pública ou privada – a primeira não foi formalmente solicitada pelo acionista e – implicava para este, medidas muito gravosas e, a segunda não estava disponível no imediato ou a curto-prazo. Assim, na ausência de melhor alternativa para o erário público e para a estabilidade do sistema financeiro, a resolução era a única medida suscetível de ser considerada num tão curto espaço de tempo”, conclui o relatório.

O BdP, enquanto autoridade de resolução, definiu o perímetro do Novo Banco e os termos da separação entre o denominado banco mau (BES) e banco bom, o NB, chamando, num primeiro momento, os acionistas, credores subordinados e membros ou ex-membros do Conselho de Administração do BES, a suportar os custos relacionados com a Resolução.

O balanço de abertura (inicial) consolidado, do denominado Grupo NB, reporta-se a 4 de agosto de 2014 e só veio a ser aprovado pelo BdP a 3 de dezembro de 2014, depois de incorporar os ajustes decorrentes da auditoria e validação efetuadas pela PWC. O referido balanço foi elaborado tendo em consideração os ativos, passivos e elementos extrapatrimoniais que o BdP transferira do BES para o NB, no momento da Resolução.

Para determinação do valor dos ativos foi utilizada a informação que estava disponível, à data, nas contas do BES e que resultou de todos os exercícios transversais que tinham sido desenvolvidos, desde 2011, pelo BdP, incluindo o ETRICC 2 e, também, a informação que estava disponível no AQR [Asset Quality Review], que já estava a ser conduzido e controlado pelo BCE e a ser realizado pela Ernst & Young (EY), com o controlo da Deloitte.

Recorde-se que em setembro de 2013, o Banco de Portugal decidiu complementar os trabalhos desenvolvidos no âmbito do ETRICC (Exercício Transversal de Revisão da Imparidade da Carteira de Crédito dos principais grupos bancários nacionais) com uma avaliação dos planos de negócio dos principais grupos económicos devedores do sistema bancário cuja recuperabilidade dos créditos se encontrava fortemente dependente da geração de fluxos financeiros do negócio. Este exercício – designado ETRICC2 – teve como referência as contas em 30 de setembro de 2013.

Legado do BES estava sobreavaliado no balanço de abertura e Novo Banco nasceu com capital insuficiente

A Comissão de Inquérito conclui, no relatório preliminar, que os ativos do legado do BES e que transitaram para o NB estavam sobreavaliados e, por isso, o valor pelo qual foram contabilizados não correspondia ao seu efetivo valor.

O BdP encarregou a PwC de avaliar os ativos e passivos do balanço de abertura e verificar se seriam necessários ajustamentos aos mesmos, tendo esta concluído que eram necessários ajustamentos de 4,937 mil milhões de euros. “Apesar da dimensão desses ajustamentos, estranhamente, e por força da natureza dos ajustes, veio a manter inalterado o saldo entre ativos e passivos no seu conjunto, conforme foi considerado aquando da resolução, valor esse que condicionou o montante da capitalização inicial”, diz o relator.

O BdP estabeleceu uma previsão de necessidade de capitalização do Novo Banco em 5,4 milhões de euros e, “após uma reunião, no Ministério das Finanças, realizada na manhã de sábado do dia 2 de agosto de 2014, em que estiverem presentes Pedro Duarte Neves, Vice-Governador do BdP, Luís Costa Ferreira, Diretor do Departamento de Supervisão Prudencial do BdP e Maria Luís Albuquerque, Ministra de Estado e das Finanças do XIX Governo Constitucional, resultou que o valor da capitalização a comunicar pelo BdP ao BCE seria de 4,9 mil milhões de euros”, diz o relatório que já mereceu críticas do PSD.

“Na decisão final sobre o valor de capitalização no montante de 4,9 milhões de euros e que veio a ser comunicada ao BCE, foi determinante a intervenção da, então, Senhora Ministra de Estado e das Finanças, Maria Luís Albuquerque”, aponta o deputado socialista no relatório preliminar.

O Novo Banco nasceu com uma capitalização insuficiente, o que foi um factor determinante na sua “vida”, realidade percecionada desde a primeira hora, “constituindo essa insuficiente capitalização um constrangimento adicional à atividade do banco, que, desde o início, já se mostrava condicionada pela sua natureza de banco de transição”, conclui o relatório preliminar.

O BdP, enquanto autoridade de resolução nacional, tomou a decisão de resolução quanto ao BES com competência legal, à data, para decidir, executar e implementar uma decisão de resolução bancária, criando um banco de transição, o Novo Banco (NB).

“O XIX Governo Constitucional, no quadro das suas competências próprias reconheceu que a decisão do Conselho de Administração do BdP tinha sido tomada dentro do enquadramento legal nacional e europeu e que a medida de resolução visou garantir a estabilidade do sistema financeiro e salvaguardar os depósitos, os serviços bancários e os postos de trabalho, constituindo um contributo positivo para o sistema financeiro português, tendo manifestado a sua concordância” com a medida, refere o relatório preliminar.

O Governo do PSD/CDS, “no âmbito das suas competências, assegurou a solução de financiamento encontrada, materializada num empréstimo do Tesouro ao FdR, o qual seria reembolsado pela venda da nova instituição bancária entretanto criada – o NB – e pelo sistema bancário”.

O Governo de Pedro Passos Coelho conduziu e realizou as negociações com a Comissão Europeia, nomeadamente com o BCE e com a DGComp “referentes à determinação do âmbito e natureza das ajudas de Estado a conceder ao sistema financeiro, em concreto, na Resolução do BES”. Maria Luís Albuquerque “assegurou o acompanhamento da decisão de resolução, nos termos que lhe foi solicitado pelo BdP”, diz o documento.

“A ação do BCE e da DGComp condicionou de forma crucial a condução de todo o processo prévio à resolução e a decisão de resolução nas suas diferentes dimensões”, aponta o relatório.

O BCE, através do seu Conselho de Governadores, no dia 31 de julho de 2014, ponderou e equacionou a retirada do estatuto de contraparte ao BES, intenção que comunicou ao BES e ao BP, o que, a ser concretizado, equivaleria ao colapso do banco devido à obrigação daí resultante de este devolver de imediato a ELA [Emergency Liquidity Assistance] no valor de 10 mil milhões de euros.

O relatório relata que “a DGComp interveio desde os momentos iniciais da preparação da resolução, validando o valor da capitalização inicial e condicionando a decisão sobre o âmbito e natureza das medidas de ajuda de Estado que teriam de ser aprovadas, bem como os respetivos compromissos subsequentes”.

Estes compromissos “viriam a condicionar fortemente o futuro do NB, porquanto eram limitativos da operação e medidas como: o banco de transição ter de ser vendido dentro de um prazo de 24 meses sob pena da revogação da licença bancária e da liquidação do banco; o banco não poder pagar depósitos acima do valor de mercado; o banco ter de se desfazer de rapidamente de ativos por forma a minimizar as necessidades de capital”.

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