Passamos por momentos especiais. A Reserva Federal americana (Fed) recomendou às instituições financeiras que moderem os dividendos, colocando um limite ao que podem pagar a este título no terceiro trimestre. Pagar dividendos é interessante porque agrada aos acionistas existentes e atrai novos, o que faz subir mais a cotação e permite aos gestores ter prémios de desempenho confortáveis.

É verdade que pagar dividendos implica menor investimento no negócio, prejudicando o crescimento e a competitividade da empresa e vulnerabilizando-a face à concorrência. Mas a decisão da Fed surge na altura em que Wall Street teve o melhor trimestre desde 1998, com uma subida no segundo trimestre do S&P500 de 19% e do Dow Jones de 17%. Quid?

A Fed fez a recomendação porque quer as instituições preparadas para o risco de aumento do crédito malparado resultante da deterioração da situação económica provocada pela pandemia. Os testes de stresse feitos recentemente mostram que o sistema bancário consegue resistir a uma crise, mas que numa situação extrema pode ter perdas de 700 mil milhões de dólares e 25% dos maiores bancos podem atingir mínimos para os rácios de capital (dá-se uma queda de 12% para 7,7%). Pretende que os bancos estejam suficientemente capitalizados para suportarem uma degradação do balanço e a recomposição de reservas.

Com efeito, o risco de uma quebra da procura é significativo se atendermos a que há 50 mil novos casos de Covid por dia e se admite (Anthony Fauci) que possam atingir os 100 mil.

Este é, portanto, mais um sinal de que a pandemia não está ultrapassada do outro lado do Atlântico, e a Reserva Federal não quer passar outra vez pelo que aconteceu em 2008. Aliás, pela mesma razão a Fed está a recomendar que não sejam compradas ações próprias por estas instituições. É tentador comprar ações da própria empresa numa altura em que as cotações estão conjunturalmente baixas, não só porque é comprar barato, mas também porque permite manter a cotação dos títulos e evitar a debandada dos acionistas causada por má performance na bolsa. Mas reduz as reservas, críticas para repor rácios prudenciais.

Outro sinal das nuvens no horizonte vem da discussão na Commody Futures Trading Commision da obrigação dos High Frequency Traders revelarem o algoritmo que usam para realizar transações automáticas – se numa situação de crise todos “dispararem” ordens de venda no mesmo momento, provocam o afundar do mercado (uma das causas da crise de 1987). A proposta não passou, por envolver questões de constitucionalidade além de propriedade intelectual, mas fica o aviso.

Dizia Lorenz que o bater de asas de uma borboleta em Pequim provoca um tornado na Califórnia. Sábias palavras, só que não foi em Pequim, foi em Wuhan. De momento, impõe-se olhar para os EUA.