Há semanas, infelizmente poucas, em que os portugueses parecem ter motivos para reclamar ser um povo educado, comprometido com a construção de um novo mundo, definitivamente na vanguarda da Europa. Mas, depois, há outras semanas, como esta em que se discutiu o Orçamento do Estado, que consagram de tal forma a rede de interesses tradicionalmente dominante que o desânimo faz pontualmente sentido.

Desde logo pela política: esquerda e direita já não se distinguem nem em questões civilizacionais. Mesclam-se de forma promíscua. Confluem em votações. Vergam-se perante a barbárie e as clientelas próximas. E, por isso, vamos continuar a ter caça aos pombos, a defender e promover as touradas e a não considerar urgente a cruzada contra o plástico.

O Parlamento é, definitivamente, um caso de estudo, nem que seja para tomarmos conhecimento do país que ainda somos. E o que somos é isto: uma sociedade na qual ir assistir à tortura de um touro, numa praça, custará, em  IVA, metade de um livro ou de um disco e quatro vezes menos do que ver um jogo de futebol; na qual a caça aos pombos continuará a existir e a praga dos sacos de plástico não vai começar a ser taxada de forma crescente, como deveria. No final, duas certezas: 1) cultura e tradição podem ainda ser um alegre álibi e 2) a sustentabilidade do planeta por aqui só anda a reboque de compromissos internacionais ou do assalto, via negociatas, aos cofres do Estado – não há outra maneira.

Mas o Parlamento diz-nos mais, muito mais. Os deputados do PSD, por exemplo, de forma contumaz, insistem em lembrar-nos como somos ainda um país de aldrabões, de gente capaz de agir dolosamente a reboque do pretexto certo. A falsificação das presenças nos trabalhos do Parlamento continua alegremente, com total impunidade, perante a passividade geral e a renúncia de diversos  presidentes.

Ferro Rodrigues é o adequado símbolo do desprestígio da instituição. Feliciano Barreiras Duarte, como José Silvano e outros (os que se conhecem e os que não se conhecem…), são apenas os rostos desse Portugal pequenino, miserável, capaz de tudo. E não pensem que sabemos isto por motivos bons. Nada disso. Devemos apenas o conhecimento destas práticas ao descontentamento de um grupo de malta que, no PSD, vive o drama de ficar desempregada às mãos de Rui Rio. Por isso, a vingança aparece assim, ao sabor do que há.

Do ponto de vista partidário, o resumo dos últimos dias torna-se simples. O PCP é um partido do Sul (e que pena não haver também um partido do Norte, pelo menos em algumas matérias). O CDS está vergado ao marialvismo, o que, apesar de tudo, resulta mais coerente sem Portas. O PS, para conservar a administração do poder, continua disposto a tudo e ao seu contrário num ‘geringoncismo’ sem limites, com António Costa à cabeça. O PSD revela-se desprovido de convicções nesta ilusão alimentada por Rui Rio de que o país reconhecerá “a responsabilidade”, seja lá isso o que for. O BE, em transição acelerada para o poder, fabrica Robles e outros abcessos, frutos da época.

Há períodos assim, difíceis, durante os quais há que manter a esperança e acreditar no jovem revolucionário Pedro Santana Lopes, político emergente, que nos avisa: “qualquer dia o Povo revolta-se e tem toda a razão”. Estamos bem entregues.