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“Os reguladores largaram toneladas de regulamentos que pesam no sistema”

“Moderadamente otimista para o segundo semestre”. É desta forma que o presidente da APFIPP (Associação Portuguesa de Fundos de Investimento, Pensões e Patrimónios), José Veiga Sarmento antecipa 2019.
13 Julho 2019, 17h00

Como caracteriza em termos de rendibilidade o comportamento dos FIM e dos FII (abertos) durante o 1º semestre de 2019 e quais as expetativas para o segundo semestre?
Excelente, excelente. Muito boa. Apesar de alguma volatilidade que se observou nos mercados financeiros, o primeiro semestre deste ano foi excelente, em termos das rendibilidades proporcionadas por estes instrumentos financeiros. Quase todos os FIM apresentaram, neste semestre, retornos positivos, que superaram os 10% (rendibilidade efetiva), no caso da maior parte dos fundos de ações e de diversos fundos multi-ativos e fundos flexíveis.

Também os fundos imobiliários têm beneficiado do bom momento que o sector vive, atualmente, em Portugal, e mais de metade dos fundos em atividade teve retorno positivo, neste semestre. Relativamente a expectativas para o segundo semestre nos FII, acreditamos que a tendência do primeiro semestre se vai manter ou mesmo intensificar, com os FII a evidenciarem rendibilidades bem acima da inflação e das taxas de retorno de aplicações mais conservadoras, como é o caso dos depósitos bancários. Já em relação aos FIM, um cenário aceitável é de que há condições para continuar a acontecerem boas notícias. Mas não será um período isento de volatilidade, num quadro geoestratégico muito instável. A guerra comercial que está a ser alimentada pela administração Trump nos EUA, bem como a escalada da tensão nas relações com o Irão, ou ainda a conclusão do processo do Brexit poderão condicionar negativamente os mercados financeiros, aumentando a volatilidade, com a possibilidade de inversão do ciclo de crescimento ou, pelo menos, tornando essa tendência menos pronunciada. Ainda assim, no cômputo geral, creio existirem motivos para estar moderadamente otimista.

Quais os fatores de mercado que mais impactaram no resultado dos fundos de investimento?
Nos fundos imobiliários, o momento económico do país, aliado a uma procura crescente por parte de investidores internacionais, tem contribuído para a manutenção do dinamismo no sector imobiliário, permitindo a obtenção de resultados positivos, quer por via do crescimento das rendas, quer pela valorização do património imobiliário detido pelos fundos. A performance dos fundos mobiliários, como referido anteriormente, está intrinsecamente ligada à dos ativos e mercados em que cada fundo, designadamente, a diferença de comportamento entre os mercados de dívida e de ações. No caso dos fundos de ações, o bom desempenho deveu-se, essencialmente, ao bom momento do mercado acionista, sobretudo no segundo trimestre do ano, influenciada pelo bom desempenho dos indicadores económicos dos principais países desenvolvidos. No entanto, mesmo no segmento obrigacionista, o comportamento negativo das taxas de juro, têm potenciado as rendibilidades positivas dos fundos que investem nestes mercados.

Por último, por que não enaltecer a qualidade da gestão de ativos que se faz em Portugal? Ou seja, o bom desempenho dos fundos portugueses não pode ser dissociado da capacidade e competência dos nossos gestores.

Em termos regulatórios o que pode ser alterado para melhorar o desempenho das várias classes de ativos?
Por regra, a preocupação dos reguladores não é a performance dos fundos, mas as questões de equidade no funcionamento do mercado e a proteção do investidor. Nos últimos 10 anos, em resultado da crise avassaladora que afetou o mundo inteiro, os reguladores excederam-se no seu zelo de aumentar o controlo, largando toneladas de regulamentos que hoje pesam sobre o funcionamento do sistema. É convicção de muitos especialistas, que as novas obrigações legais têm pouco a ver com a prevenção de uma nova crise, mas que constituíram uma oportunidade para “mostrar serviço” por parte dos reguladores. O caminho agora deveria ser o de simplificar e retirar a carga absurda, que tem, sim, um efeito negativo na rentabilidade.

Em termos de literacia financeira o que é necessário fazer para melhorar a compreensão destes produtos de investimento por parte dos aforradores?
O trabalho que está a ser feito pelo CNSF e pelo PNFF é muito válido e será com certeza continuado no tempo. Os operadores financeiros têm também um papel direto neste esforço de informação, explicando o melhor que puderem e souberem as características dos produtos que vendem.

A sustentabilidade, a ética, o clima e a demografia são temas para potencial investimento?
São temas inadiáveis, porque afetam de forma visível as preocupações dos investidores. Em qualquer das áreas do ESG, os investidores exigem transparência e respeito por valores que assumem uma importância crítica na nossa vida. A ética, porque é necessário recuperar padrões de comportamento perdidos nos últimos 30 anos. A demografia, que é um dos desafios mais evidentes da sobrevivência das nossas sociedades, tal como as conhecemos até aqui.

Quanto ao clima, o medo faz-nos pela primeira vez acordar para a crua realidade de que o essencial das condições de vida não está garantido, pelo contrário, entramos em risco de sobrevivência como espécie dominante do planeta. Apesar de ser um tema que nunca até hoje foi levado muito a sério – as alterações climáticas eram muitas vezes consideradas como uma invenção de uns lunáticos – hoje basta sair à rua ou ver televisão. E o medo é um poderoso instrumento para a ação. Num survey às preocupações dos investidores à escala europeia, a Allianz Global Investors conclui que quem está mais preocupado com as alterações climáticas não são os nórdicos que têm uma reputação de seriedade no tratamento das questões essenciais, mas pelo contrário são os países do sul, a Grécia, a Itália a Espanha e … Portugal. Como os gestores trabalham para servir os investidores, a atenção às questões do clima em Portugal é um dado adquirido.

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