O setor dos media atravessa uma difícil fase de transição e são muitas as pressões sobre as linhas editoriais dos órgãos de comunicação social. A independência e a isenção dos media estão continuamente debaixo de fogo por parte dos poderes políticos e económicos, enfrentando ainda uma crescente confusão entre informação e novas formas de fazer publicidade.

Tal obriga a um esforço permanente para zelar pela  independência editorial dos meios. No caso das empresas de comunicação social do Estado, esse zelo é necessário sobretudo devido ao risco de manipulação por parte do poder político. Daí que seja importante ter mecanismos de governance que impeçam os políticos de utilizarem os meios de comunicação social do Estado em seu proveito. Foi isso que, bem ou mal, o anterior Executivo procurou fazer na RTP, criando um Conselho Geral Independente a quem cabe, entre outras funções, nomear a administração da empresa. O objetivo foi “desgovernamentalizar” a RTP, algo que todas as pessoas que trabalham na estação vêem com bons olhos. Certo? Errado.

Esta semana, os sindicatos dos Jornalistas, dos Meios Audiovisuais e dos Trabalhadores da Informação e Comunicações pronunciaram-se contra o modelo de governação da RTP. Contestam o facto de a administração liderada por Gonçalo Reis não se entender com o Governo quanto à escolha do futuro administrador financeiro  e querem que seja nomeada uma pessoa que tenha a “confiança técnica e política” do Executivo.

Não vou entrar na discussão sobre se a RTP está a ser bem gerida ou não. Outros mais conhecedores da situação financeira da empresa poderão fazê-lo melhor. Mas todos sabemos que a RTP nunca foi propriamente conhecida por ser uma empresa financeiramente sustentável, sobretudo nos tempos em que os governos nela mandavam e desmandavam.

É, de resto, curioso que os sindicatos não defendam apenas que a RTP seja melhor gerida, ou que o atual modelo seja aperfeiçoado. Não, querem também que o Governo coloque alguém da sua confiança “política” na administração, como se tal fosse garantia de boa gestão.  Seria para rir, se não fosse de chorar. No país das negociatas, “confiança política” não é algo que um bom gestor queira destacar no currículo.

Igualmente falacioso é o argumento de que, sendo o administrador financeiro da confiança do Governo, terá maior capacidade negocial com o acionista Estado, nomeadamente no que toca a conseguir financiamentos. Vamos supor que isto é mesmo assim: alguém acredita que a independência da RTP não fica em causa com o facto de existir um comissário político  na administração, com poder para decidir onde, como e com quem é aplicado o dinheiro? Alguém acredita que isso não aumenta o risco de interferências na linha editorial? Somos todos ingénuos?

A única explicação plausível para a necessidade de ter um administrador da “confiança política” do Governo é, pois, a mais óbvia: garantir que a administração da RTP está alinhada com a estratégia política da atual maioria (com quem, de resto, os sindicatos preferem lidar). Para muita gente, a independência da RTP é a menor das preocupações. Essa modernice de ser livre dá muitas chatices e nada como ter um bom ministro da tutela, daqueles à moda antiga, que mostra o caminho e ajuda a construir carreiras.