O turismo AL

Uma pessoa anda meio-dia, um dia, pela cidade, ao sábado de preferência, porque há menos carros, há mais vagar, e só sente bater, bater nas paredes, no interior e no exterior dos prédios, à mistura com o barulho do berbequim eléctrico.

Sinal de alvoroço de obras em prédios velhos, sobretudo em zonas ou bairros mais antigos, como o bairro das colónias, Almirantes Reis, Arroios, Penha de França, Santa Engrácia, Graça. Digo estes porque mais próximos das minhas paragens e onde observo semelhante ambiente. Mas, segundo me dizem, em outros mais distantes, a azáfama não anda longe.

Muito bem, pensa-se, mais um a ser recuperado. Será mesmo? Em muitos casos, arregalando o olho um pouco mais, surgem as dúvidas.

À distância fica a ideia de que se trata de uma pintura a disfarçar, um esconder de mazelas para alinhar no Alojamento Local (AL). Atenção, não é tudo mau, uns foram mesmo recuperados (o que dá alguma dignidade) e colocaram a placa AL e até antigas pensões reabilitadas são agora AL.

Em Lisboa, e em algumas outras cidades, a contrapartida de tudo isto são as rendas a subir e os despejos da lei Cristas do arrendamento a facilitar e, em muitos casos, a incentivar aqueles.

Não sei quantificar, mas sei que há bastantes pessoas, sobretudo da geração 30/40 anos, em grandes dificuldades e a serem escorraçadas de bairros onde escolheram viver, mais expostos por esta movimentação de funções no alojamento, pelo facto de os senhorios exigirem aumentos anormais devido à alternativa habitação permanente/AL, sobretudo quando os arrendamentos são anuais, uma situação incentivada pela lei Cristas. Há aqui verdadeiros pesadelos e quanto mais pequenos os apartamentos (T0, T1) pior, porque de mais procura. E de maior adaptação ao AL.

Declaro que sou defensor do AL como actividade económica, mas tem de haver regras e penso que não estamos a acertar no equilíbrio. Muita discussão, poucas ideias e decisões. Defendo assim que a Lei Cristas tem de ser imediatamente suspensa. Admito que não previu esta movimentação, mas agora está a ser prejudicial por demais. Ninguém já duvida dos efeitos nefastos, incluindo os seus seguidores.

O turismo de cruzeiros

Estou numa situação privilegiada para observar este tipo de turismo, sentir os barcos a apitar e, uma vez ou outra, presenciar até aquele “despejo” enorme de gente na cidade.

Há a convicção na base de estudos de que se vai processar, em meia dúzia de anos, uma duplicação do número actual de turistas de cruzeiros, em torno dos 500 mil, que aportam hoje a Lisboa, com reflexos faseados já a partir de 2018.

Há uma estratégia de captação deste tipo de turismo com o aumento do número de partidas e chegadas de cruzeiros a partir de Lisboa. Como produto dessa estratégia, o porto de Lisboa ganhou a realização, pela primeira vez, em 18 e 20 de Setembro, da SEATRADE, o principal evento da indústria de cruzeiro, o que é um bom indicador deste crescimento esperado.

Lisboa, sem dúvida, comanda no país este tipo de mercado, mas em outras zonas como Leixões as perspectivas são interessantes.

Para as regiões autónomas, designadamente a Madeira, o mercado de cruzeiros continua a ter elevado significado, mas sem atingir a dimensão de Lisboa, até porque é difícil pensar em organizar partidas e chegadas do Funchal por constrangimentos vários, entre outros, os condicionamentos aeroportuários. São cruzeiros de passagem apenas.

E o Turismo? Algumas nuvens?

Enfim o turismo, em geral. Quem anda pelas cidades, por certas zonas sobretudo, encontra turistas por todo o lado. É um dado. E continuará por muito tempo?

Os nossos governantes apostam em grande nesse sector. Só lhes desejo muito bom sucesso. Para o país continua a ser importante. Mas há que pensar em muita coisa.

Para além da dinâmica do turismo, das exigências cada vez maiores na procura, da diversificação de interesses, da necessidade de organização de respostas diferenciadas e atenção à dinâmica dos mercados concorrentes.

Apesar de não estar aí uma crise, uma queda abrupta de turistas, aparecem sinais e alguma preocupação de que se vislumbra instabilidade nos mercados. E Portugal tem zonas muito sensíveis a essa situação. Quase todo o país seria afectado por mudanças pronunciadas, mas sem dúvida, zonas como o Algarve ou a Madeira seriam muito afectadas com rupturas de fluxos no mercado.

Já não basta uma ou outra falência de certos grupos de “alimentação” de turistas (operadores) como tem acontecido, com os transtornos financeiros correspondentes. Agora uma mudança nos fluxos de mercado teria maior impacto.

Não afirmo que isso esteja a acontecer em grande escala. Mas há sinais de que mercados como a Turquia, Egipto, Tunísia e outros estão em grande retoma e atenção, essa tendência vai ter impacto em certas zonas turísticas do país. Há que pensar em alternativas. Uma certa acalmia de actos terroristas começa a desviar turistas do país, que só por acaso vieram cá parar por algum tempo.

A retoma começa a ser real e ainda bem, pois o turismo vive de calma e sossego. Ele em si, pelo menos em certas camadas, cria o seu próprio desassossego. Por outro lado, já se fazem sentir alguns efeitos negativos do Brexit. Uma redução de turistas no Algarve e na Madeira. Há indícios de quebras significativas.

Fala-se numa certa compensação com turistas de outras origens, mas, como se viu, os movimentos aqui também não são lineares. Quero com isto dizer o quê?

Para que não haja surpresas, toda a atenção é pouca a fenómenos novos de que começam a surgir indícios. Será talvez necessária maior ponderação em certos investimentos anunciados no turismo em termos de oferta e não de infra-estruturas e organização, essas continuam a necessitar de modernização e de maior funcionalidade.

Outra área importante é a dos recursos humanos, a nunca descurar e a desenvolver a todos os níveis para consolidação e aumento da nossa competitividade. Tudo indica que 2018, embora com taxas de crescimento mais baixas, vai continuar favorável, sobretudo em termos de receitas, o que é um bom indicador de valorização do sector. Para os anos que se seguem ficam as interrogações.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.