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Putin irrita sauditas. Videoconferência da OPEP+ pode “derrapar” até quinta-feira

Pouco antes da videoconferência que tinha sido agendada para hoje e que provavelmente só ocorrerá a 9 de abril entre os países da OPEP+, o presidente russo fez comentários que tornaram tensas as relações com os sauditas. Prevê-se que será difícil chegarem a um consenso para um corte na produção de petróleo que evite novas descidas nas cotações internacionais.
  • Maxim Shemetov/Reuters
6 Abril 2020, 07h58

Vladimir Putin e a Rússia irritaram a Arábia Saudita. Por isso, os russos entrarão enfraquecidos para a videoconferência que estava prevista para hoje, entre o grupo alargado da OPEP+ que ficou de debater a nova estratégia para travar a descida das cotações do petróleo e, eventualmente, conter as cotações internacionais do Brent e do WTI em níveis “aceitáveis” – leia-se, acima dos 30 dólares por barril. Agora, os contactos podem “derrapar” para a próxima quinta-feira.

Tudo por causa de um mal entendido diplomático russo. O que – diga-se – não é frequente entre responsáveis russos. Mas vamos aos factos: O príncipe Faisal bin Farhan – membro da casa real de Saud, com 45 anos, nascido em Frankfurt, a dominar o alemão como língua natal, educado e formado nos EUA, especialista da área aeroespacial da Boeing, ex-embaixador saudita na Alemanha e desde 23 de outubro de 2019, ministro dos Negócios Estrangeiros da Arábia Saudita, por nomeação do Rei Salman – não simpatizou nada com os comentários de Vladimir Putin sobre “supostas” culpas sauditas na rutura do acordo da OPEP+ a 5 de março. Teria sido essa culpa saudita que, segundo Putin, impediu o corte da produção petrolífera dos maiores produtores mundiais.

Por isso, a reação formal, em comunicado, do ministro dos Negócios Estrangeiros da Arábia Saudita, não se fez esperar: o príncipe Faisal bin Farhan referiu explicitamente que os comentários do Presidente da Rússia, Vladimir Putin, que culparam os sauditas pelo fim do pacto da OPEP +, em 5 de março, eram “totalmente desprovidos de verdade”.

A diplomacia russa sabe perfeitamente que não há nada que um saudita goste menos – e que não perdoe, porque entende como um insulto – do que ver envolvido o nome do seu Reino numa mentira. Mais: o ministro saudita da Energia, príncipe Abdulaziz bin Salman – trata-se do quarto filho do monarca Salman bin Abdulaziz, Rei da Arábia Saudita, Abdulaziz, nascido em 1960 e formado em gestão industrial pela Universidade do Rei Fahd de Petróleo e Minerais – também deu indicações de que neste enquadramento seria muito difícil chegar a um acordo com Putin. O ministro da Energia sublinhou que, além disso, a pandemia mundial da Covid-19 forçou a redução do consumo mundial de produtos petrolíferos para níveis caóticos.

No meio da gaffe diplomática de Vladimir Putin, as encenações do presidente dos EUA, Donald Trump, para dar a entender internamente – sobretudo ao lobby de produtores petrolíferos texanos que teme a falência das industrias de shale oil –, que ia promover um acordo para cortar a produção, parecem, no mínimo, estranhas, com os tuítes de 2 de abril, embora tenha surtido efeito nas cotações negociadas em Nova Iorque, em Londres e em Roterdão, para os barris de petróleo WTI e Brent do Mar do Norte. Na realidade, os contratos de futuros do Brent viram as cotações subir até aos 34,84 dólares por barril e os congéneres do WTI ficaram nos 28,97 dólares.

Assim, nos tempos que correm, com a pandemia da Covid-19 a matar milhares de pessoas diariamente, a reunião da OPEP+ feita em videoconferência promete ser adiada, ou prolongar-se vários dias até quinta-feira, 9 de abril, altura em que o maior número de países será ouvido, segundo indicações dadas aos principais participantes.

A situação atualmente vivida entre os produtores de petróleo é muito complexa. As projeções sobre a redução da procura foram atualizadas e ultrapassaram largamente os cenários mais pessimistas avançados na segunda quinzena de março pelos maiores bancos de investimento internacionais. De acordo com as informações mais recentes e precisas, a efetiva queda do consumo mundial de gasolinas, de gasóleos, do jet para a aviação e das bancas marítimas para navios atinge o equivalente a cerca de 35 milhões barris por dia.

No braço de ferro entre a Arábia Saudita e a Rússia, os sauditas sabem que ganham sempre. Comparativamente à qualidade do petróleo saudita – um dos melhores do mundo –, o petróleo russo é quase um sub-produto. “Mesmo a baixo preço, sai caro, porque o petróleo russo muitas vezes precisa de ser novamente refinado”, explicou ao JE um especialista do sector. E em receitas, então, “a diferença é gigantesca”, adianta.

“Quando em 2019 a Rússia terá encaixado uma receita de 161 mil milhões de dólares com o seu petróleo, os sauditas obtiveram mais de 208 mil milhões de dólares a vender a sua produção”, esclarece a mesma fonte, referindo que “no cenário da cotação internacional cair para um valor médio de 20 dólares por barril, os sauditas conseguiriam ter receitas de 61 mil milhões de dólares em 2020, enquanto os russos veriam as suas receitas a cair para os 53 mil milhões de dólares este ano, ou seja, sempre seriam menos oito mil milhões de dólares que as receitas sauditas”.

Mas o ministro dos Negócios Estrangeiros saudita – o quarto filho do Rei – já esclareceu Putin que “foi a Rússia que recusou o acordo no iníco de março”, porque, nessa altura, a Arábia Saudita, juntamente com mais 22 países, tentaram convencer os russos a avançarem para novos cortes.

Uma indicação de que o processo de conversações na OPEP+ pode prolongar-se em videoconferência até à próxima quinta-feira relaciona-se com o adiamento da divulgação dos preços de venda de petróleo para o mês de maio pela gigante estatal Saudi Aramco, que mantém em stand by a comunicação dos valores – o que é feito junto de um círculo muito restrito de grandes compradores internacionais – e geralmente ocorre ao quinto dia de cada mês.

Os preços do petróleo da Saudi Aramco servem de referência à maioria dos produtores petrolíferos do golfo da península arábica, que envolvem uma produção conjunta superior a 14 milhões de barris de petróleo por dia. Na Europa, a Noruega, que produz cerca de 1,75 milhões de barris de petróleo por dia, é um dos países que alinharia no corte de produção para promover a subida dos preços internacionais do petróleo.

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