Dizem os jornais ingleses que as sondagens estão desacreditadas, mas aparentemente nenhum político deixa de olhar para elas mal acorda todos os dias de manhã – e esse foi até ontem o pior momento do dia de Boris Johnson, ainda primeiro-ministro do Reino Unido: os dados apontam para que o ‘gap’ entre conservadores e trabalhistas era maior há apenas uma semana. Ou seja, hoje, dia de eleições, está tudo em aberto e o país vacila entre a maioria absoluta dos conservadores ou a maioria simples – que, segundo os analistas deixará o país mais ou menos como está desde 2016: sem capacidade para resolver de vez o seu destino próximo.
O dia de ontem foi o último da campanha eleitoral e os líderes de todos os principais partidos convergiram nos pungentes, quase emocionados, apelos para que ninguém fique em casa – como sucedeu, recorde-se, no dia 23 de junho de 2016, quando o ‘sim’ ao Brexit ganhou o referendo, em parte porque as camadas mais jovens e mais europeizadas do Reino Unido (para quem um visto, um passaporte ou uma fronteira são coisas esquisitas) acharam coisa melhor para fazer que exercer o seu direito de voto.
Boris Johnson destacou-se nesse desiderato: revelando uma imaginação de que nunca ninguém duvidou, o primeiro-ministro desdobrou-se em manobras, algumas delas muito cómicas (tendo mesmo arranjado um aborrecimento com o ator Hugh Grant), para convencer os seus eleitores que a vantagem dos conservadores não é tão extensa que dê margem para militâncias ociosas.
A outra linha de força da campanha conservadora esteve concentrada na diabolização do programa eleitoral dos trabalhistas liderados por Jeremy Corbyn – mas, a acreditar nas sondagens, e contra todas as expectativas dos analistas, os britânicos ficaram razoavelmente pacíficos com as ‘ameaças’ de nacionalizações, fiscalidade persecutória dos mais afortunados e intensa gastação de dinheiros públicos em áreas tão pouco modernas como a segurança social e o serviço nacional de saúde.
Os trabalhistas, e principalmente Jeremy Corbyn, mantiveram-se iguais a si mesmo – iguais ao que são desde que são liderados por Corbyn, entenda-se: o presidente do partido não se desviou uma vírgula do enunciado que foi apresentado como o programa do partido e não cedeu a retirar-lhe as partes consideradas mais de esquerda radical, como há muito não se viam nos países europeus e em ‘casa’ de um partido com possibilidades de chegar à governação.
Com os restantes partidos a ‘riscarem’ cada vez menos, os britânicos vão a votos num dia que será decisivo para o seu futuro próximo. Ou não. Se os conservadores vencerem com maioria absoluta, o Brexit passará a ser uma certeza. Mal a rainha lhe dê posse, Boris Johnson apressar-se-á a correr à Câmara dos Comuns pedir o apoio geral ao acordo com Bruxelas e tentará (a 1 de janeiro ou o mais tardar a 31 do mesmo mês), sair finalmente do agregado dos 28.
O problema é que, se a maioria conservadora for apenas simples, fica tudo na mesma: os trabalhistas insistirão num novo referendo – mesmo que seja apenas sobre o acordo que está em cima da mesa – e o país continuará a afundar-se em debates e discussões que até agora, mais de três anos depois, se revelaram completamente estéreis e muito pouco proveitosas.
Seja como for, logo no dia seguinte está marcada uma reunião geral do Conselho Europeu para debater os resultados das eleições – e para os chefes de Estado ou de governo dos 27 perceberem o que se seguirá. E o que se seguirá volta ao mesmo: com uma maioria absoluta é o Brexit, com uma maioria simples é o regresso à confusão total, num quadro em que Bruxelas já esgotou a paciência e a capacidade de ceder aos caprichos dos britânicos. Em princípio, tudo ficará esclarecido no final da noite de hoje.
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