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“Se nada fosse feito no Reino Unido, esta catástrofe teria proporções ainda mais assustadoras”, alerta reitor português da Imperial College Business School

O “Jornal Económico” entrevistou Francisco Veloso, dean da Imperial College Business School, que considerou fundamental o estudo da Imperial College Heatlh Centre na mudança de estratégia de Boris Johnson, tendo em conta a real capacidade de resposta do serviço nacional de saúde britânico.
30 Março 2020, 08h17

Francisco Veloso, o reitor português da Imperial College Business School acompanhou de perto o estudo efetuado pela escola de saúde (Imperial College Heatlh Centre) desta faculdade, valência liderada pelo epidemiologista Neil Ferguson. Este estudo científico, baseado em projeções matemáticas e divulgado a meio deste mês, vaticinava que, se nada fosse feitos pelos governos e pela população para travar a pandemia do Covid-10, poderiam morrer 2,2 milhões de pessoas nos EUA e 510 mil pessoas no Reino Unido. Além disso, o estudo previa também uma pressão insustentável dos sistemas públicos de saúde.

Assim, este estudo foi absolutamente decisivo na mudança de estratégia de Boris Johnson. No dia seguinte à sua apresentação, o primeiro-ministro britânico, dava uma volta de 180 graus à estratégia inicial face à pandemia: “Chegou a altura de todos pararmos, de reduzirmos os contactos sociais e de deixar de fazer viagens desnecessárias. A partir de agora temos de ir mais a fundo”. A partir daqui, foram tomadas medidas mais restritivas e foi escolhido o modelo de supressão, ou seja, quebrar as cadeias de transmissão e promover políticas de isolamento, inclusivamente para quem não tem sintomas, tal como foi feito na China e adotado em Portugal.

O “Jornal Económico” entrevistou Francisco Veloso, dean da Imperial College Business School que considerou fundamental o estudo da Imperial College Heatlh Centre na mudança de estratégia de Boris Johnson, tendo em conta a real capacidade resposta do NHS.

 

Como é que um estudo mudou toda a abordagem de saúde pública no Reino Unido relativamente à Covid-19?

A questão principal teve a ver com os cálculos de avaliação do impacto que teria na estrutura do National Health Services (serviço nacional de saúde britânico sob a sigla NHS). Há aqui vários fatores importantes. O primeiro é que este grupo liderado por Neil Ferguson tem enorme experiência, credibilidade e utiliza modelos muito testados e robustos que são amplamente reconhecidos a nível internacional. Neil Ferguson e a sua equipa trabalha há muitos anos com a Organização Mundial de Saúde sendo que esta equipa teve ligada à modulação do Ébola. Portanto, é uma pessoa com muita credibilidade e com vasta experiência. Numa situação como esta que é muito nova e muito imprevisível, ouvir pessoas com este nível de experiência faz muita diferença. Como é evidente, há muitas perspetivas diferentes e confiar em alguém que está há muitos anos no terreno e com trabalho feito nestas áreas é decisivo. Como esta equipa é muito credível, quando é publicado um estudo da Imperial College Heatlh Centre, as pessoas desta comunidade ouvem-nos com atenção.

 

Era importante perceber como o sistema nacional de saúde poderia responder a esta pandemia?

O segundo facto é que nos estudos iniciais não era muito clara qual é que era a evolução que existia ao nível do impacto nos serviços de saúde. Ou seja, uma coisa é perceber a evolução do número de pessoas infetadas assim como a taxa de mortalidade, portanto, os indicadores que chamam mais à atenção. Numa fase inicial, tudo se fixou nestes dois aspetos. Depois começou a haver dados mais detalhados sobre as hospitalizações e o tipo de apoio médico que era necessário para que as pessoas infetadas pudessem sobreviver, ou seja, ventiladores, cuidados médicos mais intensivos, etc. O principal elemento que alterou esta perspetiva foi esse trabalho de modulação mais fino que olhou não apenas para a propagação da doença na população e mortalidade mas sobre o impacto que iria ter no sistema de saúde no apoio às pessoas que vão precisar de cuidados médicos mais intensivos no hospital, sobretudo ao nível da ventilação. O que o estudo mostrou é que se não fossem tomadas medidas muito significativas, a quantidade de pessoas que iriam necessitar desse tipo de apoio em virtude de um crescimento exponencial da propagação doença, iria destruir completamente a capacidade de resposta do NHS. Só ouve essa perceção quando o grupo de Neil Ferguson recebeu informações mais detalhadas da China e de Itália, os países que tinham um maior avanço no combate à doença.Quando eles colocaram esses números nos modelos e começaram a calcular o impacto, perceberam que iríamos ter números absolutamente avassaladores que iriam aumentar muito a taxa de mortalidade, não porque as pessoas fossem morrer da doença mas devido à incapacidade do sistema nacional de saúde de dar resposta a tantos casos. Esse foi um elemento muito importante na alteração do comportamento porque não era só uma questão de se as pessoas iriam ficar imunes ou não, se morrem ou não, mas sim devido à incapacidade de resposta da NHS que faria com que a taxa de mortalidade subisse por aí acima.

 

Foi importante olha para a China e para Itália?

Este é um dos aspetos que tem ajudado a perceber o que tem acontecido em Itália e quais as razões porque as taxas de mortalidade estão acima das da China. Uma das coisas que tem ficado patente passa pela dificuldade dos sistemas de saúde em dar resposta a esta situação e algo que infelizmente nunca vamos saber é qual a quantidade de pessoas que não teriam falecido se o sistema de saúde não tivesse sido completamente ultrapassado pelo número de casos que vieram a acontecer. Se não tivessem sido adotadas estas recomendações da Imperial College Heatlh Centre, esta catástrofe, que já o é, teria ainda proporções ainda mais assustadoras.

Como encarou o facto de ter sido decretado o Estado de Emergência em Portugal?

Parece-me que o Estado de Emergência decretado em Portugal pareceu-me adequado e inevitável.

 

 

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