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“Seguros de saúde deveriam ter sistemas de financiamento partilhados”

Como financiar os futuros seguros de doença para idades avançadas. Ana Mota, diretora de Employee Benefits da MDS defende que os seguros deveriam ser progressivos e a funcionarem em sistemas de financiamento partilhado.
8 Dezembro 2019, 18h55

Os acréscimos de produtividade vindos da robotização terão de contribuir e financiar a subsistência dos humanos. Esta é uma das ideias de Ana Mota, diretora da broker de seguros MDS.

 

A longevidade é uma preocupação ou uma oportunidade para a indústria seguradora?
Uma oportunidade que decorre da preocupação de no futuro haver mais velhos do que novos. Viver mais é positivo e um desafio para ajustar a oferta das soluções do mercado segurador às necessidades de uma população mais velha.

 

Será que a sociedade está equivocada quando analisa a necessidade de mais creches ou escolas quando, na verdade, a população que está a crescer é a dos reformados e a 3ª idade de grande longevidade?
Sem dúvida. Esta é uma realidade em que o Estado e a sociedade civil e empresarial de uma forma geral ainda atuam como a avestruz… . No futuro vai ter sucesso quem criar oferta específica para esta população, não só porque serão a maioria, mas também porque obrigatoriamente terão de ter respostas adaptadas às suas necessidades. Quer em cuidados de saúde, quer em cuidados de assistência.

 

Genericamente que respostas dão hoje os seguros à necessidade de uma população envelhecida quer em termos de rendimentos de poupança de longo prazo, quer em termos de benefícios para a saúde?
As respostas do mercado segurador são ainda muito escassas. A nível da poupança os estímulos são insipientes e há ainda uma fraca literacia financeira. A grande maioria dos jovens não tem consciência que tem de ser um dos principais financiadores da sua própria reforma. Esta realidade só pode mudar a longo prazo com a introdução destes temas (poupança e previdência) nas escolas.
Em termos de saúde, ainda há um caminho para percorrer, mas já se nota uma preocupação do mercado em se adaptar. Por exemplo, hoje já a grande maioria dos seguros de saúde não tem idade limite de permanência (ao contrário do que acontecia há poucos anos). Também na área da prevenção se notam evoluções positivas no mercado segurador.
Passou-se da visão do seguro de saúde como mero pagador de despesas a agente de prevenção, com a introdução de check-ups na sua oferta e privilegiando medidas ao nível de cuidados de bem-estar.

 

A expansão da oferta de seguros oncológicos é suficiente para responder à necessidade de uma população com uma ongevidade a crescer?
Claramente que não. As doenças prevalecentes com o envelhecimento vão muito para além das doenças oncológicas. Outras doenças crónicas com as do foro cardiovascular e da diabetes (entre outros) poderão ter também um grande impacto nos custos da saúde na população mais velha.

 

Em que áreas deve a oferta alargar-se? Deve a mutualização abranger doenças crónicas pré-existentes? Deve alargar-se a cuidados continuados e paliativos?
Seria o ideal, mas Portugal é um país pequeno (somos poucos e com uma média de rendimentos baixa) em que o mutualismo na sua vertente totalmente liberal não é financeiramente sustentável. Se os seguros continuarem a ser complementares num regime totalmente facultativo, não será viável. No entanto, se houver abertura política para os seguros assumirem um papel de alternativa complementar ao Estado, em modelos de seguro público (como no fundo é a ADSE e outros sistemas como o SAMS), haverá muito provavelmente mais possibilidades para incluir doenças crónicas preexistentes e suportar custos com cuidados continuados e paliativos.

 

E a que custos? Os futuros seguros de doença para idades mais avançadas poderão ser pagos pelos cidadãos com rendimentos médios?
De acordo com o atual modelo, será muito difícil. Mas se o financiamento passar a ser numa lógica de longo prazo – seguros vitalícios e num modelo de seguro público, acredito que seja viável. Em vez de termos prémios em função da idade, que implica custos exponenciais para os mais velhos, os custos com os seguros deveriam ser progressivos, mas nivelados e em sistemas de financiamento partilhados com as contribuições para o sistema público.

 

Deverá esse acréscimo de custo com cuidados a segurados mais idosos ser suportado por entidades públicas?
Tal como referi anteriormente o que faz sentido são sistemas mistos, embora ao Estado deva sempre caber o suporte dos cuidados básicos para a população de mais baixos rendimentos.

 

Com a robotização de determinadas tarefas nos seguros e a utilização da Inteligência Artificial que irá substituir humanos em determinadas áreas da indústria, deverá o custo das gerações futuras de reformados ser “suportado” pelas máquinas? As máquinas poderão pagar a longevidade dos humanos perante a redução da população ativa?
Acredito que sim, e este futuro não está assim tão longe… . Se cada vez mais as máquinas nos estão a substituir, os impostos sobre as pessoas também vão ter também menor expressão, logo, os acréscimos de produtividade vindos da robotização, terão de contribuir / financiar a subsistência dos humanos.

E a montante como deverá ser incentivada a poupança de longo prazo para a reforma? Os PPR são suficientes? Falta literacia financeira para a geração “millennial” e geração “Z”?
O incentivo à poupança passa pela educação. É na escola que estas bases têm de ser passadas. Mas também à sociedade cabe um papel educativo, nomeadamente pais e empresas. Não deixa de ser preocupante que os jovens, na sua grande maioria, tenham sido educados no facilitismo e muito pouco preparados para pensar no futuro.

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