[weglot_switcher]

Setor do turismo reclama plano específico de apoios antes de chegar a vacina para a Covid-19

Ideia foi defendida por Francisco Calheiros, presidente da CTP – Confederação do Turismo de Portugal, na primeira das ‘web conferences’ a assinalar a V Conferência do Turismo Português, prevista para 28 de setembro, e que contou hoje com a participação de Paulo Portas.
8 Setembro 2020, 18h20

O setor nacional do turismo, encabeçado por Francisco Calheiros, presidente da CTP – Confederação do Turismo de Portugal, exigiu hoje, dia 8 de setembro, ao Governo português a adoção de um plano de medidas de apoio que ajudem as empresas e os operadores do setor a enfrentarem as quebras de receitas provocadas pela Covid-19 até que esteja garantida a administração de uma vacina eficaz contra a pandemia.

Na primeira das ‘web conferences’ que antecipa a realização da V Conferência do Turismo Português, prevista para 28 de setembro, Dia Mundial do Turismo, Francisco Calheiros defendeu a criação de um pacote de medidas de poio para as empresas do setor, um esforço que está a ser desenvolvido “em estreita colaboração com o Governo português”.

Também interveniente nesta ‘web conference’ promovida pela CTP, Paulo Portas advogou que “é preciso uma atuação cúmplice entre o Estado e os operadores privados para definir uma estratégia agressiva em termos internacionais, mas temos de trabalhar a sério para não nos acontecer o que nos aconteceu em junho e julho, onde penso que andámos a dormir um pouco na forma”.

“É preciso recuperar mercados, é preciso fazer um esforço de diplomacia económica, para aproveitar a próxima estação turística”, avisou Paulo Portas.

O ex-governante chamou a atenção para o facto de que “o turismo caiu em todo o lado, todos querem as sobras e nem todos lutam com as mesmas armas”. A este propósito, Paulo Portas questionou-se sobre porque é que a Espanha nunca comunicou até ao momento o verdadeiro número de fatalidades que teve devido à pandemia.

Para o futuro, Paulo Portas considera que ” não podemos voltar a confinar, senão a economia morre, e não podemos voltar a desconfinar na ‘rentrée’ com a mesma imprudência com que desconfinámos no final de maio”.

“Está à disposição do Estado português fazer tudo para desconfinar e salvar a economia, mas tenho a vaga sensação de que dormimos um pouco na forma e só descobirmos isso em junho ou julho”, criticou Paulo Portas.

O vice-presidente da Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa explicou que, “se o turismo depende da deslocação e da ideia de muita gente a fazê-lo ao mesmo tempo, o turismo também requer planos próprios, muito seletivos, para aguentar este intervalo até à vacina, que, na minha opinião, passa pela atribuição de fundos próprios, com mecanismos rápidos, pragmáticos, acessíveis”.

Por seu turno, Francisco Calheiros defende a tese de que “devemos voltar a ter uma vida normal”.

“A pandemia vai durar meses, a economia não aguenta. Sim, há o perigo de haver mais pessoas infetadas, se calhar haverá mais mortos, mas a nossa vida tem de voltar ao normal, não é só por causa do turismo”, sublinhou o presidente da CTP.

Críticas à diplomacia económica
Francisco Calheiros também expressou uma voz crítica em relação à atuação do Ministério dos Negócios Estrangeiros, no chamado esforço de diplomacia económica, que, no seu entender, tem enfermado de diversas lacunas.

“Proibimos os voos por nacionalidade das companhias aéreas enquanto os outros países proibiram por nacionalidade dos respetivos passageiros. Por isso, Portugal foi o último país da Europa para onde a Emirates voltou a voar. Por isso, a Turkish já mudou o seu ‘hub’ do aeroporto do Porto para Vigo”, denunciou o presidente da CTP.

Francisco Calheiros destaca ainda que “estamos a falar de uma pandemia completamente global, que não escolheu ninguém, atacou todos”.

“Eu diria que o turismo só é mais prejudicado, mais afetado que os outros porque o turismo tem uma palavra de ordem, que é deslocação, ou seja, é fundamental que as pessoas se movimentem. E, nesse sentido, eu diria, são dois dados que são perfeitamente elucidativos, que são os dados de abril e de maio, em que o turismo em Portugal baixou 95%”, lamentou-se o presidente da CTP.

Por isso, Francisco Calheiros perguntou a Paulo Portas como é que irá ser a evolução desta pandemia em termos de impacto, que na saúde pública, quer na economia.

“Diria, desde já, que tudo o de que nós estávamos à espera foi ultrapassado. Ainda ontem tivemos uma reunião de direção, onde estavam representados diferentes ‘stakeholders’ e ninguém estava minimamente confiante, não tanto com o que já se passou, mas sobretudo com o que aí vem. Ou seja, das companhias aéreas aos aeroporto, hotelaria, agências de viagens e restauração, todos os indicadores que temos são maus”, resumiu o líder da CTP, dizendo que “ainda estamos muito longe de poder ver o fim desta pandemia”.

Francisco Calheiros colocou uma segunda questão a Paulo Portas: qual o seu entendimento, no que diz respeito, nomeadamente, a alterações de viagens para o futuro.

“Eu, desde já, diria que oo dois grandes blocos [de turismo], o de ‘corporate’ e o de lazer, diria que em termos de ‘corporate’, hoje em dia, habituámo-nos a usar o que estamos a fazer: ‘webinar’, o Zoom, o Microsoft Teams passou a fazer parte do nosso dia a dia, mas nada substitui uma reunião presencial. E, portanto, acho que vamos assistir a uma certa diminuição desse tipo de viagens, mas no que diz respeito a lazer, penso que nada disso vai acontecer. No dia em que tivermos uma vacina, no dia em que as pessoas se sentirem seguras, aí vai ser o que aconteceu quando abrimos durante uns dias os corredores para o mercado britânico. Tivemos 50 voos por dia do Reino Unido para o Algarve, de Manchester, de Birmingham, era a perfeita loucura”, revelou o presidente da CTP.

Dos turistas a mais para os turistas a menos
“Lembram-se do tempo em que diziam que havia muita gente, não os turistas, a dizer que havia turismo a mais em Portugal? Eu acho que hoje se percebe a consequência de ter turismo a menos em Portugal. Não foi o turismo que criou esta crise. A seguir à crise financeira, foi o turismo um dos pilares essenciais da capacidade de recuperação do país. É absolutamente extraordinário o caminho que Portugal fez nas últimas duas décadas, para não ir mais longe, do ponto de vista do crescimento como destino turístico e da especialização como destimo turístico”, assinalou Paulo Portas.

O vice-presidente da Câmara de Comércio e Indústria de Portugal relembrou que no ano passado o nosso país registou um total de 49 milhões de dormidas e um total de 16 milhões de turistas estrangeiros.

“Nós não resolvemos, senão parcialmente, o problema da substituição do turismo internacional pelo turismo doméstico, dado que temos uma população relativamente pequena. Portugal precisa do turismo e tenho a certeza de que quando se criarem as condições, que são várias e têm de ser simultâneas, para ganhar confiança, o turismo vai ser essencial na recuperação do país”, salientou Paulo Portas.

O ex-governante acentuou que “perante estas circunstâncias é que podemos avaliar se temos turistas a mais ou a menos, e como precisamos do turismo, em que condições, para termos uma economia em condições”.

 

Pandemia global, mas assimétrica
Respondendo a Francisco Calheiros, Paulo Portas admitiu: “É verdade que a pandemia é global, como, aliás, quase todas foram. Não é uma invenção da globalização. A gripe espanhola chegou a Espanha três meses depois de ter nascido nos Estados Unidos, e começou na Ásia. Mas pela simples razão de que as pandemias vinham de barco. Não vinham de avião. Esta pandemia é global pela simples razão de que as pandemias são globais. Só que quero chamar aqui a atenção de que uma coisa é dizer que a pandemia é global, outra coisa é dizer que ela é simétirca”.

“Esta pandemia é global, mas não é simétrica. Não atinge os continentes da mesma maneira, não atinge as economias da mesma maneira, não atinge os setores económicos da mesma maneira. Para vos dar uma linha de evolução, se repararem bem, se olharem para os números económicos globais dos três grandes blocos económicos, China e Ásia, Estados Unidos e Europa, se olharem para os números do primeiro trimestre, a economia americana ainda cressceu. 0,3%, mas cresceu”, adiantou Paulo Portas.

O consultor salientou; “Sabemos que sendo os Estados Unidos um país federal, a fgstão da crise da saúde pública é muito complexa e muitas vezes pouco competente, mas há uma inclinação geral para colocar o interesse da economia tão acima, pelo menos, como o da saúde”.

“Se olharmos para os números do segundo trimestre, a China, que já tinha caído brutalmente, cerca de 6,8% no primeriro trimestre, já cresceu 3,6%. Não cresceu de forma assimétrica. A queda das compras de bilhetes de avião na China continuou perto dos 30% e o défice de lotação dos hotéis também continuou 19% abaixo do ano homólogo. Em qualquer caso, no segundo trimestre, a China já crescia, quando a Europa caiu fundo. A Europa caiu mais fundo que os Estados Unidos”, alertou Paulo Portas.

No entender deste analista, “aqui também decorre uma consequência, que é relativamente simples e que pode ser útil para a maneira como nós podemos gerir estas coisas melhor: quem agiu muito depressa e sem grandes contemplações, e não falo apenas de países autoritários, falo de países democráticos da Ásia, geriu francamente melhor a pandemia do que quem não agiu depressa, do que quem não deu importância. Com uma diferença: os países asiáticos que geriram a pandemia, dentro do possível, nenhum deles fez ‘lockdown’ completo. Nenhum deles fechou a economia completamente. O que agiram foi muito depresssa, o processo de decisão foi muito rápido”.

Paulo Portas chamou ainda a atenção para um ‘detalhe’: “os primeiros testes feitos por Taiwan [em relação à Covid-19], que conhece bem a China, foram feitos no dia 31 de dezembro, quando ainda nem sequer o famoso oftalmologista que denunciou a epidemia na China tinha faladdo; mas o rumor de que se passava qualquer coisa grave levou as autoridades de Taiwan a fazer testes, ainda genéricos à época, no aeroporto, de todos os voos que vinham de Wuhan”.

“Quem agiu depresssa, saiu mais depressa de uma depressão da economia. Quem agiu, como a Europa e os Estados Unidos, mais lentamente, sai mais lentamente, mais tarde dessa depressão. As pessoas podem ter todas as opiniões políticas sobre os Estados Unidos, mas há uma coisa que é indiscutível: olhem para a criação de emprego em junho, julho e agosto. E é muto mais rápida, porque na América é muito mais fácil fechar uma empresa e abrir outra, é muto mais rápido e expressivo do que na Europa”, esclareceu Paulo Portas.

O ex-governante insistiu que “a pandemia é assimétrica, e dentro da assimetria, é óbvio que o turismo é ainda mais assimétrico”.

No entender deste responsável, Portugal está mal colocado em dois ‘rankings’ internacionais de turismo: no conjunto da OCDE, Portugal posiciona-se entre os quatro primeiros países que mais dependem do turismo em termos de peso no PIB e de peso no emprego, além de estarmos entre os quatro países deste universo em que mais difícil é substituir o turismo internacinal pelo turismo doméstico.

“O turismo foi afetado muito depressa; em março, abril e maio os números já eram crescentemente catastróficos. E é evidente que é dos últimos setores de recuperação, pela simples razão de que depende a ideia de turismo. Convém dizer que tudo o que tem a ver com a ideia de multidão, espera mais tempo para recuperar”, tendo de aguardar pelo que Paulo Portas chama o ‘game changer’, a chegada de uma vaicina eficaz.

“Em condições normais, demora à universidade e à indústria cerca de dez anos para conseguir uma vacina. Se agora conseguirmos em dois anos ter uma vacina eficaz é uma proeza enorme, das universidades, dos centros de esquisa, dos Governos”, exaltou Paulo Portas.

Sobre a evolução dos diferentes segmento de turismo a nivel interno e internacional, Paulo Portas resumiu: “A ideia de que tenho de ir para o aeroporto com muita gente, não está assim lá tanta gente, eu já fiz a experiência. A ideia de que vou para uma convenção com muita gente, não há convenções com muita gente. Que eu vou para um hotel onde me cruzo com muitas pessoas, seja no ‘buffet’, seja na receção, seja nas áreas comuns, a ideia de que um avião pode pode estar cheio de gente e não necessariamente com distância social, a ideia comum destes setores que andam à volta do turismo, e que, no caso português, depende muito do turismo internacional e do turismo para além de Espanha – os espanhóis são muito importantes para o nosso turismo, mas precisamente por causa da situação de Espanha, precisamos de acautelar os outros destinos – tudo o que depende da ideia de multidão, depende da criação de segurança e de confiança. Mas certo é que o turismo é determinante para a economia portuguesa em termos de emprego e de geração de riqueza”.

A pandemia da Covid-19 ja causou a morte de 880 mil pessoas ea infeção de mais de 27 milhões, tendo já começado a falar-se em alguns países da possibilidade de estarmos já perante uma segunda vaga da pandemia.

As receitas do setor do turismo em Portugal no primeiro semestre deste ano atingiram um valor de cerca de 3,4 mil milhões de euros, o que representou uma quebra de cerca de 54,4% face ao período homólogo de 2019.

A próxima ‘web conference’ deste ciclo patrocinado pela CTP decorrerá no próximo dia 14 de setembro, a partir das 10 horas, com a presença de Pedro Nuno Santos, ministro das Infraestruturas e da Habitação.

Copyright © Jornal Económico. Todos os direitos reservados.