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Siza Vieira: “A União Europeia tem de encontrar o seu lugar na economia do futuro”

Num debate onde a veia corrosiva de João César das Neves esteve em máximos, o ministro da Economia considerou a resposta do bloco à crise pandémica como um exemplo de ‘como fazer bem’.
  • António Cotrim/Lusa
9 Abril 2021, 19h39

“Há um ano, quando começámos a gerir a pandemia na União Europeia – com um tremendo impacto económico – muitos esforços foram feitos para percebermos que tipo de resposta teria de ser dada. Percebemos que a resposta não podia ser idêntica à que tinha sido gizada contra a crise de 2008”, e o bloco percebeu que, desta vez, o combate teria de ser comum, eficaz e rápido, disse o ministro da Economia, Pedro Siza Vieira. A resposta, disse, está na necessidade – talvez na obrigação – de “a União Europeia encontrar o seu lugar na economia do futuro num quadro em que o bloco seja competitivo”.

O ministro falava no âmbito de um debate organizado pela Nova Economics Club e pela Associação de Estudantes da Nova SBE, com o aval institucional da Nova School of Business and Economics e em colaboração com a Comissão Europeia. O tema em debate esta sexta-feira era dedicado à ‘Presidência Europeia e o Plano de Recuperação e Resiliência’– num debate moderado por Ricardo Santos Ferreira, editor do JE. Para além do ministro, participaram no debate Miguel Faria e Castro, economista da Reserva Federam norte-americana (Fed de St. Louis e João César das Neves, professor Católica de Lisboa, e João Amador, diretor do Departamento de Estudos Económicos do Banco de Portugal.

A gestão desse impacto tornou possível a criação de um novo programa, o Next Generation EU’ e o Programa de Recuperação Resiliência (PRR), “provendo à solvência das empresas e à salvação dos empregos”. Mas o Next Generations está focado “no financiamento dos investimentos nas reformas necessárias”, lembrou, pelo que é um programa que vai bem mais longe que o ‘simples’ suporte dos impactos da pandemia.

Recordando os pilares do programa – clima, digitalização, sociedade – Siza Vieira disse que o programa “vai alavancar significativos investimentos” que permitirão lançar uma economia comum mais forte e competitiva. O ministro disse que “os problemas com que estamos a lidar não teriam uma resposta tão positiva se cada país europeu estivesse a responder aos impactos de forma individual”. É uma aposta para o futuro, comentou – que por certo permitirá novas respostas comuns, como por exemplo a área fiscal.

Miguel Faria e Castro optou por proceder a uma comparação entre a forma como a Europa e os Estados Unidos responderam à pandemia. Em termos de ajudas diretas, os Estados Unidos foram o país no mundo que mais dinheiro ‘atirou’ sobre a crise pandémica, mas está apenas em quinto lugar quando à ajuda direta se acrescentam as ajudas indiretas (como por exemplo as moratórias). Nessa soma, os Estados Unidos são ultrapassados pela Itália, Alemanha, Reino Unido e França (por esta ordem). Mas, disse, para já é difícil chegar a uma conclusão sobre qual das duas posições (mais ajudar diretas ou mais ajudas indiretas) será a que, no final, corresponderá à resposta mais eficaz à crise.

“Vamos ter um grande sucesso, conectados com grandes desastres”, disse João César das Neves, que recordou que a última presidência portuguesa coincidiu com a assinatura do Tratado de Lisboa – que resultou na Constituição europeia que nunca chegou a ver a luz do dia. Para o economista, é bem possível que o bom desempenho de António Costa e da sua equipa acabe por ‘esbarrar’ num insucesso futuro: a ineficiência do PRR.

“A Europa está a preocupar-se com as únicas coisas em relação às quais a pandemia nos ajudou: a descarbonização e a digitalização”, ironizou o economista – para recordar que a titubeante resposta e as dificuldades de haver ‘uma resposta’ e não uma sucessão delas, acabará por ser pernicioso para a Europa. “Como não estamos a lidar com o problema mas com outra coisa qualquer, o crescimento da União Europa vai ser metade da dos Estados Unidos”, concluiu – não sem antes perguntar para que ‘raio’ precisará Portugal de um Banco de Fomento quando “já temos um banco público tão grande e de que tanto gostamos”.

João César das Neves disse ainda que “o grande problema da União Europeia é que o seu modelo de desenvolvimento está errado: “temos o pior da China com o pior dos Estados Unidos” e “é por isso que a Europa está a decrescer e os seus concorrentes a crescer”.

João Amador, que recordou não estar no debate como representante do Banco de Portugal, disse por seu turno que “foi um grande passo aquele que a União Europeia deu” para criar o PRR e o Next Generation EU – sendo “uma grande oportunidade para Portugal tentar evoluir para um nível de crescimento semelhante ao da União”. “É importante que os fundos que aí vêm sejam usados de uma forma mais eficiente”, disse o economista – que recordou que o posicionamento do país mudou: está mais virado para as exportações, é certo, “mas temos de ir mais depressa”.

Como de algum modo tinha dito César das Neves, “as prioridades do PRR já lá estavam antes da pandemia”, o que abre dúvidas sobre a sua ‘bondade’. “A Comissão fez o que se podia esperar, e os Estados-membros limitam-se a seguir”.

“Com tempo limitado e recursos limitados, Portugal tem um plano” e isso de algum modo é o mais importante: é preciso ter um fim a atingir, disse o economista. Mas seria preciso “clarificar” algumas reformas e dar a entender que conceitos estão por trás de determinadas escolhas.

“Os constrangimentos inerentes à utilização do dinheiro – tanto em termos de sectores como de tempo” – são, para João Amador, um problema que o poder político tem o dever de identificar e de esclarecer. E recordou que “há Estados-membros que estão a ajudar diretamente as empresas, o que é um risco” não só em termos de concorrência, como de tensão futura entre mercados. Ou, dito de outra forma: há no horizonte um problema de eventual protecionismo – que a União devia escusar.

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