É lugar comum dizer, em situações como a que vivemos, que nada será como dantes. Mas não é verdade. O que todos ansiamos é esquecer o que se passou e voltar ao passado, aos bons velhos tempos. Mas desta vez vão ficar marcas, não vai ser como na crise financeira, que meia dúzia de medidas permitiu ter a sensação que se fez o que era possível para reparar o funcionamento da economia internacional, e voilá, businees as usual.

Os rendimentos de títulos da dívida britânica pisaram terreno negativo, mesmo para maturidades relativamente curtas, pondo no mesmo plano o Continente e o Reino de Sua Majestade. E não foi por causa da excursão de Cummings. As bolsas continuam a oscilar, como sempre, e recuperam as perdas que registaram desde o início do ano, se bem que também ainda estejam em terreno negativo. Mas se as bolsas sobem, não é por causa de melhores projeções de negócio, é por refletirem as medidas de apoio de governos e bancos centrais, o que cria uma perspetiva nova para o intervencionismo. E até as pessoas estão a mudar – 780 mil americanos fechados em casa passaram parte do tempo a jogar na bolsa através das casas corretoras e obviamente tiveram aquilo que acontece a quem se entusiasma na primeira ida ao casino. Portanto, a grande pergunta é “o que vai mudar?”, para não dizer – é o que se segue – “como vai mudar?” 40 milhões de americanos que foram para o desemprego (a taxa de desemprego passou de 3,5% para 19,5%) desde meio de março esperam ansiosamente que lhes digam.

Uma parte da resposta é que, sim, vai haver retoma. Mas para citar um ex-primeiro ministro, sei que ela vai acontecer, só não sei quando. O que não ajuda muito. Outra coisa que é relativamente segura é que desta vez a retoma será muito desigual, haverá setores mais estimulados que outros e havê-los-á que vão perder. Não é difícil de prever, pois também esta crise foi muito desigual, houve setores que até prosperaram com ela. Mas quais vão ser os ganhadores e quais vão ser os perdedores está no campo da especulação. Sem outra informação, agir é outra forma de jogar na bolsa, talvez até a mesma. É caso para relembrar que tudo o que pensamos que sabemos tem que ver com o passado, todas as decisões relevantes que vamos tomar têm que ver com o futuro e estamos num momento de potencial quebra estrutural. Ter sucesso é, como no livro de Vivek Ranadivé (ou Mr. Real Time), ter a “two second advantage” que dá a vantagem estratégica de estar à frente dos outros. Mas o problema é que, no presente, é muito difícil distinguir estar à frente dos outros de estar completamente errado.

Impõe-se prudência. Mas sem respostas rápidas e convincentes, que provem, estamos em vésperas de entrar na época dos messias. O nevoeiro já temos.