[weglot_switcher]

Reestruturação empresarial: sobreviver numa economia de mercado

Quando é que deve ser feita a reestruturação de uma empresa?
21 Julho 2019, 12h00

1. Quando é que deve ser feita a reestruturação de uma empresa ?

2. Quais os fatores para ter sucesso?

3. Que erros devem evitar?

Celso Fernandes, Senior Manager na Mazars

1. Por norma as reestruturações são feitas quando, de forma reiterada, se começam a identificar sinais desfavoráveis em alguns parâmetros, designadamente decréscimo da faturação, redução do volume de encomendas, perda de clientes estruturais, diminuição dos níveis de rentabilidade, falta de liquidez, dificuldades no cumprimento do serviço de dívida, adiamento das decisões de investimento, entre outros.
A contínua apreciação das causas que concorrem para a performance menos favorável, permitirá ao Management, no âmbito do seu exercício prospetivo, antever se as causas são sanáveis com um plano de ação com medidas corretivas pontuais, ou se a emergência da situação obriga a evoluir para um cenário de reestruturação (com medidas estruturais de cariz económico e financeiro).
Os processos de reestruturação requerem tempo para colocar em prática as medidas delineadas e para interagir com os diferentes stakeholders da organização, pelo que a brevidade na tomada de decisão é crucial.

2. O foco e a ampla partilha do objetivo comum são fatores críticos para o sucesso das reestruturações. As medidas de turnaround apontadas numa reestruturação devem ser devidamente equacionadas e contrastadas com o envolvimento de equipas multidisciplinares. Por outro lado, convirá realçar que para monitorizar a implementação das medidas, os KPI’s e os impactos da reestruturação, os sistemas de informação das empresas deverão estar adequadamente dimensionados.

3. Quando o processo está em marcha é preciso “caminhar” convictamente (walk the talk). Alterações constantes nas medidas, falta de envolvimento dos stakeholders, comportamentos e mensagens errantes, adoção pelo management de práticas contrárias às veiculadas para a generalidade da organização, emotividade na decisão e não decisão, são sem dúvida erros crassos a evitar.

 

Lúcio Trigo, CEO da HM Consultores

 

Rafael Freitas, Manager HMBO, unidade de negócios da HM

1. A situação económico-financeira de uma empresa deverá ser alvo de uma monitorização constante, o que deverá acontecer em paralelo com um planeamento e uma definição da estratégia financeira que permitam antecipar constrangimentos futuros. Ao serem identificadas dificuldades, a empresa deverá agir, e em virtude da gravidade da situação, poderá ou não encetar um processo de reestruturação.
Quanto mais cedo forem detetadas as dificuldades financeiras, maior é a probabilidade de a empresa evitar o cenário de insolvência.
A própria União Europeia tem promovido mecanismos de early-warning para que seja possível evitar processos de insolvência.
Uma reestruturação deve ser iniciada no momento em que são detetadas as primeiras dificuldades da empresa em fazer face aos seus compromissos, antes mesmo da empresa entrar em incumprimento ou recorrer a financiamentos de emergência, que, dado o seu custo, poderão contribuir para um agravamento da situação no futuro.
Na nossa visão, uma empresa deverá ainda encetar um processo de restruturação, quando, no plano económico são detetados sinais estruturais de destruição de valor, ainda que a empresa possa apresentar cash-flows operacionais positivos.
De uma forma geral, as PME portuguesas apresentam problemas de capitalização (baixa autonomia financeira) e níveis de rentabilidade operacional reduzidos (EBITDA baixos) o que resulta numa pressão financeira elevada constante.

2. Na nossa opinião, uma empresa apenas é passível de ser recuperada se o seu modelo de negócio tiver sustentabilidade e existir uma estrutura capacitada e competente em termos de recursos, gestão e know-how.
Efetuar um diagnóstico preciso (estrutura financeira, formas de capitalização, competências do management e viabilidade económica do negócio) afigura-se como uma fase crítica que permite desenvolver um plano de ação/viabilização adequado.
Muitas vezes uma restruturação não é suficiente visto que a empresa necessita de “almofada” financeira que lhe permita relançar a atividade operacional, tendo recursos suficientes para fazer face aos seus compromissos, não só o passivo de caráter financeiro, mas também as encomendas de matérias-primas, salários e impostos/contribuições. Ter acesso a new money é crucial. Se por um lado, na sequência da crise e do aumento dos non performing loans, a banca, de uma forma geral, desalavancou a exposição a empresas de maior risco, por outro, existem poucos fundos de investimento com vocação de restruturação, o que, conjuntamente, dificulta a obtenção de meios financeiros.

3. Entrar em situações de contencioso/conflito junto das instituições de crédito que quebrem a relação de confiança e os core stakeholders; Manter a equipa de gestão, quando a mesma se mostrou incapaz de fazer face aos desafios da empresa e cumprir o seu business plan, no passado; Apresentar um plano de reestruturação irrealista aos credores com pressupostos demasiado otimistas; Concentrar toda a análise no plano financeiro quando, em grande parte dos casos, é na esfera económica que a empresa tem capacidade de gerar valor e ultrapassar a situação débil (i.e efetuar apenas uma restruturação do seu balanço); Não assegurar o investimento (CAPEX) que permita assegurar os resultados operacionais futuros; Adotar uma tática cega de cost cutting que ponha em causa a continuidade do negócio.

 

Nuno Líbano Monteiro, Sócio e coordenador das áreas de Contencioso Cível e de Restruturação & Insolvência da PLMJ

1. A restruturação da empresa deve ser feita antes de a empresa se encontrar numa situação de insolvência, ou seja, antes de a empresa se encontrar totalmente impossibilitada de cumprir com as suas obrigações vencidas. O administrador da empresa tem aliás a obrigação legal de apresentar a empresa a restruturação logo que a empresa se encontre na eminência de se tornar insolvente. Existem hoje várias ferramentas legais ao dispor do empresário e dos credores para poderem operar a restruturação.
Podem recorrer a um PER, apresentando-se com um credor que represente pelo menos 10 por cento de créditos não subordinados. Se a empresa preferir uma solução que passe por uma maior discrição, por, por exemplo, a publicidade do plano de revitalização afetar o seu posicionamento no mercado em que se insere, pode optar pelo RERE – Regime Extrajudicial de Recuperação de Empresas – caso em que, acompanhado com credores que representem pelo menos 15 por cento do passivo não subordinado, deposita na conservatória do registo comercial um protocolo de negociação e, até três meses depois, o acordo que atingir com os credores.
Por último, numa situação em que já tenha sido declarada a insolvência, é ainda possível ser aprovado um plano de recuperação. É, no entanto, muito mais difícil recuperar uma empresa que já tenha sido declarada insolvente, pois tal determina por regra a morte civil no tecido empresarial.

2. O primeiro fator é o de o negócio a que se dedica a empresa ter viabilidade económica. De nada justifica salvar financeiramente uma empresa, através de um plano, se ela não tem condições para sobreviver numa economia de mercado. Associado a este temos o do timing da restruturação; se a empresa – apesar de ter mercado – já está na última fase do seu estertor financeiro, dificilmente sobreviverá.
O segundo fator é o de haver transparência na relação com os credores, em particular com os credores financeiros. Só se aposta em quem se confia e só se confia no que se conhece.
O terceiro é o de o empresário ter a coragem de amputar aquilo que não é estratégico para se focar no que merece ser salvo e restruturado.
O quarto é a necessidade de obter capital. Seja através de capitais próprios, que normalmente estão exauridos, seja através o recurso ao capital de risco. Se a empresa for boa, haverá seguramente quem veja na sua dificuldade uma grande oportunidade de negócio.
O quinto é o de entregar a negociação e a elaboração do plano a profissionais, mas sem nunca se afastar, se pretende que a empresa continue a ser sua.

3. A empresa não deve cometer os erros que cometeu no passado. O mais frequente e existente em quase todos os casos de restruturação em que tenho trabalhado prende-se com o recurso a capital alheio. O fim da empresa começa quando o curto prazo começa a financiar aquilo que deveria ser financiado a médio/longo prazo.
As empresas devem reduzir os custos ao mínimo para manter o seu core business e é só nesse que se deve focar. Durante o processo não devem praticar qualquer ato que possa ser entendido como uma quebra de confiança junto dos credores. A empresa em dificuldade é, na prática, dos credores, pois são eles que vão votar o seu sucesso ou insucesso. Qualquer ação ou omissão incompreendida pelos credores pode ser fatal e por um voto se perde uma restruturação!

 

José Nogueira, Managing Partner da RSN Advogados

1. A resposta a esta questão é o elemento fundamental, em minha opinião, do qual depende uma verdadeira reestruturação com o sucesso. E digo isto porque, na maior parte das situações, as empresas somente avançam para os mecanismos de reestruturação – seja RERE, PER ou mesmo o P. Insolvência – quando já é demasiado tarde! E esta situação não resulta de nenhum acto masoquista ou da ignorância dos empresários ou gestores, mas sim de um conjunto de práticas e realidades de mercado, que levam os gestores a fazer, na minha convicção, uma avaliação errada de quando devem agir.
Com efeito e desde logo, como fundamento primordial desta realidade, a ausência total de financiamento bancário para as empresas em reestruturação. O sistema bancário não encontra modelos de financiamento, nem soluções, que lhes permita continuar a apoiar estas empresas. Ora, os empresários, já sob enorme stress de tesouraria, tentando proteger as poucas linhas de financiamento que ainda dispõem, procuram, até ao último momento, evitar que seja colado às suas empresas o rótulo de “empresa em reestruturação”.
Por outro lado, os fornecedores continuam ainda muito desprotegidos, do ponto de vista legal, quando trabalham com uma empresa em reestruturação, o que os leva, igualmente, a cortar quaisquer linhas de crédito e a optarem por somente vender a pronto.
Finalmente, o estigma geral que se abate sob a empresa, que leva a que as sociedades, nesta situação, vejam muitas das oportunidades naturais de negócio serem-lhes sonegadas. Veja-se, a título de exemplo, a maioria dos concursos públicos, onde uma empresa em reestruturação fica automaticamente excluída!
Pese embora tudo o exposto, continuo absolutamente convicto de que as empresas teriam muito a ganhar se avançassem para a reestruturação em tempo, sendo este tempo basicamente definido pelo momento em que a empresa, apesar de já denotar uma operação deficitária, ainda tem capacidade económica para lidar com as alterações que se impõem no seu caso concreto: seja através de uma redução de custos, seja pela reconversão de uma área de negócio, seja pela venda de determinados activos não essenciais. E há vários mecanismos legais para esse efeito. Numa frase, serem pro-activos em vez de reactivos!

2. Uma apresentação atempada ao processo e não somente quando a empresa já está moribunda; Uma assessoria jurídica e financeira especializada, com know-how especifico destes processos e das dificuldade a evitar e antecipar; Uma politica agressiva de comunicação, capaz de, junto dos seus recursos humanos (comunicação interna) e dos seus parceiros, sejam bancos, fornecedores e clientes (comunicação externa) impedir que se crie a imagem e a ideia de que a empresa já está numa antecâmara de liquidação.
3. A resposta é novamente a mesma: não agir somente quando já é demasiado tarde, empurrados pelos acontecimentos.
Devem liderar o processo, com pro-actividade, na constituição de uma autêntica equipa multidisciplinar (jurídica, económica e de comunicação), e não depositar o grosso das suas acções em meros pedidos de auxilio, seja junto de institutos públicos, seja junto de credores, sem qualquer verdadeiro plano de reestruturação subjacente!

 

Filipe Lowndes Marques, Sócio da Morais Leitão

Nuno Gundar da Cruz, Advogado sénior da Morais Leitão

1. Por princípio e de modo a garantir a maior chance de sucesso, uma empresa deve ser reestruturada o mais cedo possível. Em termos de reestruturação, o tempo é, de facto, um fator “chave”, pois, muitas vezes, o que acaba por conduzir ao insucesso de uma operação de reestruturação é ter sido realizada tarde demais, ou seja, quando a empresa já não reúne as condições necessárias para ser reestruturada.
Pela razão referida no parágrafo anterior, tem sido feito um esforço, nomeadamente da parte do Estado, para disponibilizar aos empresários ferramentas que facilitem o diagnóstico rápido e confidencial das empresas em situação económica difícil.

2. Para que uma reestruturação seja bem sucedida é, em primeiro lugar, fundamental que a empresa o faça no tempo certo. Ou seja, que não o faça tarde demais, isto quando a sua situação já não permite que seja reestruturada, pois, na prática, está já insolvente.
Em segundo lugar, importa que o acionista e os demais envolvidos na operação, incluindo os assessores, estejam alinhados e esteja bem definido o “step plan” da operação e, claro, que o “business plan” da empresa seja realista e exequível.
Finalmente, e talvez mais que tudo, tem que haver uma real disponibilidade e vontade, fundamentalmente dos acionistas e dos credores, em chegar a bom porto.

3. É fundamental que os objetivos e premissas fundamentais da reestruturação estejam claros para todos os envolvidos, por forma a evitar “surpresas de última hora”. Depois há que garantir que os assessores envolvidos estão alinhados com os seus clientes, de modo a garantir que, no contexto das negociações, todos falam “a mesma língua”, assim evitando-se equívocos.
Uma postura de cooperação e de cordialidade, isto é não beligerante, por parte dos envolvidos, sejam os acionistas ou os credores, ou os seus assessores, pode, igualmente, dar um contributo relevante para que se logre chegar a “bom porto”.

Maria Ferreira, Partner da Thames consultores

1. O termo restruturação, quando aplicado às Empresas, tem normalmente um significado negativo, uma vez que está directamente associado a processos dolorosos de redução de custos e despedimentos colectivos.
Uma empresa deve evitar processos de reestruturação, antecipando as tendências do mercado, valorizando a capacidade de adaptação da organização a novas situações e evitando incobráveis em Clientes.
Uma empresa deve possuir métricas de gestão que permitam detetar e corrigir em tempo útil, situações de destruição de valor na organização.
Se a única métrica for a falta de dinheiro em caixa ou o corte do financiamento por parte da banca, normalmente já é tarde para atuar.

2. Os principais fatores para o sucesso duma reestruturação são:
Timing de aplicação, uma reestruturação deve ser implementada o mais cedo possível, assim que os primeiros sinais de destruição de valor forem visíveis. Daí a importância da equipa de gestão definir e analisar regularmente as métricas chave do negócio. Neste parâmetro a Gestão tem muito em comum com a Medicina.
Comunicação Interna, a comunicação da equipa de gestão com a generalidade dos funcionários é de fundamental importância para o sucesso. Os problemas devem ser colocados frontalmente e debatidos com franqueza. O mais importante é evitar rumores e boatos que só servem para envenenar o ambiente interno da organização e assuntar Cliente e Fornecedores.
Comunicação Externa, a comunicação é também importante em relação aos principais Clientes e Fornecedores. Rumores de reestruturação sem comunicação eficaz podem provocar o cancelamento de encomendas nos Clientes e/ou a redução de crédito por parte dos Fornecedores.
Liderança, a capacidade de liderança da equipa de gestão é, nesta fase, mais necessária que nunca, porque muitas decisões são duras, a resistência à mudança vai ser enorme e vários intervenientes, a todos os níveis, vão argumentar “o remédio vai ser pior que a doença”.

3. Atrasar implementação da reestruturação para um momento em que já não há recursos financeiros, internos e externos, para inverter à destruição de valor da organização; Não implementar uma política de comunicação interna e externa eficaz. O secretismo fomenta os boatos e a desmoralização interna bem como a desconfiança nos Clientes e nos Fornecedores; A equipa de gestão implementa medidas duras de redução de custos na organização, mas mantem para si todas as “mordomias”; A resistência à mudança é um dos principais problemas uma vez que as organizações sedimentaram ao longo dos anos hierarquias, lay-outs, rotinas e direitos adquiridos, que são incapazes de questionar e poucos estão dispostos a prescindir.

 

Fátima Pereira Mouta, Advogada da Pereira Mouta Mendes & Associados Sociedade de Advogados

1. Uma reestruturação numa empresa deve ser feita, logo imediatamente, de forma a evitar o incumprimento com os seus credores, quando o volume de facturação não é suficiente para fazer face às suas despesas correntes, nomeadamente, salários dos trabalhadores, finanças, segurança social, fornecedores, rendas ao senhorio, água, luz, internet, etc.; e também com as prestações mensais a que empresa se encontra vinculada, com os bancos e entidades de crédito.

2. A reestruturação deve ser devidamente planificada por gestores qualificados para o efeito, com aplicação de critérios rigorosos de gestão e eficiência, de modo a que se consiga reduzir as despesas mensais sem colocar em causa a qualidade dos produtos/serviços, mas cumprindo-se escrupulosamente o plano de recuperação estabelecido, sob pena de colocar a empresa numa situação de insolvência.

3. Durante o processo de reestruturação, as empresas não devem “improvisar”, ou seja deixar de cumprir o plano recuperação, de modo a chegar a bom porto, sendo que, para tal as empresas têm de ter uma boa assessoria, quer jurídica, quer de gestão e económico-financeira.

 

José Monteiro Gomes, Advogado MG Advogados

1. A reestruturação deve ocorrer quando a empresa começa a sentir, com intensidade, dificuldades em satisfazer pontualmente as suas obrigações: é o primeiro sinal de alerta de que algo se alterou negativamente na vida da empresa e que é necessário rever o modelo de gestão existente.

2. Além do timing (factor determinante), é essencial ao sucesso: a humildade. A empresa tem de saber reconhecer as suas limitações, a sua incapacidade de manter uma visão estratégica e a inevitabilidade do recurso a apoio externo, como seja a assessoria jurídica e a consultoria especializada.
É ainda fundamental conseguir manter confiança e a boa vontade dos stakeholders durante todo o processo negocial. A comunicação, na forma e no conteúdo, é muito importante: é necessário fazer passar uma mensagem credível de viabilidade da empresa, convencer os credores a acreditarem no projecto e manter o ânimo dos trabalhadores.

3. A reacção típica dos stakholders de uma empresa que vai ser reestruturada, é o medo. Trata-se de uma atitude defensiva que resulta do facto, óbvio, de temerem sofrer um prejuízo e que é condicionante.
Por seu turno, ao medo, a empresa tende a reagir com uma versão exagerada da sua viabilidade (não forçosamente falsa, mas excessivamente optimista).
Na minha perspectiva, a empresa deve transmitir aos stakeholders uma versão sóbria da realidade, sem excessos que afectem a sua credibilidade. A empresa tem de ser transparente.
Com o início do processo existe a tentação, por parte de alguns credores, de procurarem, de forma abusiva, condicionar o apoio à reestruturação à aplicação de condições que lhe sejam discriminatoriamente mais favoráveis. Abusam do seu poder e exploram a fraqueza da empresa. A empresa não deve ceder a estas exigências sob pena de alienar os restantes credores ao criar situações injustas.

 

João Salvador, Sócio da Albuquerque & Almeida

1. O lançamento de uma reestruturação empresarial a nível dos quadros de pessoal e da força de trabalho decorre geralmente de uma situação de crise, resultante de factores económicos ou de mercado que obriga a empresa a reduzir os seus custos operacionais ou a reagir face a alterações da procura dos seus produtos ou serviços.
Em geral, as reestruturações reactivas são a defesa possível da empresa perante uma situação de desequilíbrio económico e financeiro que a obriga a reduzir custos de maneira a manter-se competitiva ou mesmo a sobreviver como agente económico. E aqui, geralmente, as medidas de reestruturação, para além a consolidação e reforma de dívida, passam pela redução dos custos salariais e sociais que representam geralmente uma fatia importante dos gastos fixos da empresa, que não se podem fazer variar em função dos resultados da actividade. Infelizmente, quando não devidamente planeadas, este tipo de reestruturações tem custos sociais muito elevados – despedimentos, essencialmente – e pode representar uma perda de talentos séria e irreversível para a empresa, pondo em causa a sua recuperação.
As empresas com métodos de gestão mais avançados procuram acompanhar e prevenir as variações de mercado, antecipando transformações sociais, económicas e tecnológicas e procurando adaptar-se atempadamente. Aqui, os custos sociais tendem a ser mais reduzidos, pois através da formação de colaboradores cujas valências podem estar a perder relevância e sua preparação para novas condições, podem ser evitados impactos sociais graves e evitar alterações traumáticas que marcam profundamente e de forma negativa o ambiente de trabalho numa empresa – despedimentos colectivos, etc.
Infelizmente e apesar de algumas evoluções, a falta de reformas estruturais na Lei laboral Portuguesa impede muitas empresas de efectuar estas transformações preventivas sem recorrer a despedimentos. Importa agilizar e introduzir soluções novas e socialmente responsáveis numa economia cada vez mais aberta e em permanente transformação.

2. Os factores mais relevantes são o planeamento antecipado em função das condições de mercado previsíveis e, sempre que estejam implicados ou ameaçados postos de trabalho, uma política de comunicação e transparência total perante a força de trabalho. As vantagens dos processos de informação e consulta com os colaboradores são imensas e permitem gerir as crises e as reestruturações mais complexas em ambiente de paz social. Por outro lado, o planeamento preventivo ou por antecipação das reestruturações empresariais vem geralmente permitir que as condições aplicadas às situações em que não é possível manter os contratos de trabalho sejam as melhores possíveis. Também aqui seria da maior utilidade que se repensasse o elevado nível de tributação das indemnizações por cessação de contrato de trabalho que retiram às empresas e trabalhadores uma flexibilidade negocial que sempre existiu e equilibrou o mercado de trabalho em Portugal nos últimos 40 anos.

3. Em geral, as empresas devem evitar sempre que possível o secretismo e o imobilismo. Quando uma reestruturação ainda não é inevitável mas já é recomendável, cabe à empresa lançar as bases do processo, quanto mais não seja por uma questão de responsabilidade social, dando tempo e oportunidade para que os seus colaboradores – tanto os que têm de partir como aqueles que permanecem -, possam adaptar-se pessoal e profissionalmente aos desafios futuros. A manutenção de situações de desequilíbrios económico-financeiros por períodos longos ou a falta de reação às alterações de mercado resulta quase sempre em custos desnecessariamente elevados tanto para as empresas como para os trabalhadores. Como em tudo, a tónica tem de ser colocada na prevenção e planeamento do futuro da actividade da empresa, que deverá assumir e implementar as medidas necessárias à manutenção da sua competitividade tendo sempre em conta a prevenção de impactos sociais e a melhoria constante das suas competências.

Copyright © Jornal Económico. Todos os direitos reservados.