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Teletrabalho obrigatório é “uma medida cega” e “equivale à quase paralisação das empresas”, diz CCP

A Confederação do Comércio e dos Serviços contesta a obrigatoriedade do teletrabalho nos concelhos de maior risco de Covid-19 abrangidos pelas medidas mais restritivas anunciadas pelo Governo. E critica confinamento “indiscriminado” da população trabalhadora, alertando que no setor do comércio “equivale à quase paralisação das empresas”.
2 Novembro 2020, 15h02

A Confederação do Comércio e dos Serviços (CCP) emitiu esta segunda-feira um parecer a algumas das medidas mais restritivas anunciadas pelo Governo para travar a pandemia nos concelhos de maior risco de propagação da covid-19 no qual aponta baterias à obrigatoriedades do teletrabalho, defendendo que “tem virtudes óbvias na contenção do contágio da doença, mas equivale ao confinamento generalizado que o Governo diz querer evitar”.

A CCP critica a atribuição de subsídio de refeição – e outras prestações estritamente inerentes à prestação presencial de trabalho – em situação de teletrabalho – e alerta que se trata de um custo acrescido para empresários, por uma situação que não provocaram, a que se somam ainda outros como os de equipamentos de trabalho e de comunicação necessários.

“O confinamento indiscriminado da população trabalhadora, ainda que circunscrita a certos concelhos, é uma medida cega, que peca por falta de critério. Se em certas atividades é perfeitamente compatível com o exercício da atividade laboral com um mínimo de perturbação, em muitos segmentos da laboração produtiva e, sobretudo, na atividade comercial e de prestação de serviços de proximidade, que requer contacto pessoal presencial com os clientes, equivale à quase paralisação das empresas”, sinaliza a CCP no seu parecer às medidas excecionais face ao surto de doença, nomeadamente quanto à alteração do regime excecional de reorganização do tempo de trabalho (o teletrabalho), que foram anunciadas pelo Executivo no sábado passado.

A CCP contesta ainda o facto de os empregadores só poderem recusar esta modalidade aos trabalhadores por escrito. O Governo decidiu que esta modalidade regressa apenas nos concelhos mais afetados pela pandemia — a vigorar para todas as empresas, independentemente do número de trabalhadores –, sendo que os empregadores que recusem ter os trabalhadores a desempenharem as suas funções a partir de casa terão de o comunicar “fundamentadamente e por escrito” ao trabalhador.

“Por outro lado, deixar à demonstração «fundamentada e por escrito», pelo empregador ao trabalhador, a prova da «possibilidade / impossibilidade» de adoção do teletrabalho nada resolve”, defende a organização patronal, liderada por João Vieira Lopes. No seu parecer, a CCP questiona: “como se prova que é impossível? Com argumentos de razoabilidade, de bom senso? Apresentando as brutais e abruptas quebras de faturação que as empresas do comércio e serviços sofreram com o confinamento indiscriminado de Março-Maio? Como tem a ACT competência para aferir estes indicadores?”.

A obrigatoriedade de comunicar por escrito aos trabalhadores a oposição ao teletrabalho por parte das empresas é uma das principais novidades do diploma enviado para os parceiros sociais e que visa regulamentar o regime excecional de teletrabalho que entrará em vigor na próxima quarta-feira em 121 concelhos do país.

Este diploma, que prevê um conjunto de garantias e proteções aos trabalhadores, prevê que caso o trabalhador discorde da decisão da empresa, este pode pedir à Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT) que verifique os factos invocados pelo empregador. A CCP nota aqui que o projeto decreto lei prevê, ainda, que o trabalhador invoque “impedimento” para recusar o teletrabalho, quando “não disponha de condições para exercer as funções”. E questiona o Executivo: “e qual é a solução nesse caso? Fica dispensado de prestar atividade, ou deve prestá-la presencialmente? E, no primeiro caso, mantém todos os direitos laborais dos restantes trabalhadores, incluindo os teletrabalhadores, que se encontrem a trabalhar?”.

Confederação alerta para custo adicional de fornecer equipamentos aos trabalhadores

Outra questão que suscita “preocupação” à CCP é a das regras sobre equipamentos de trabalho e de comunicação a utilizar pelo teletrabalhador.

“Impor que o empregador forneça os equipamentos adequados e fazer depender do «consentimento» do trabalhador a utilização de equipamentos próprios deste não é solução”, alerta a Confederação, lançando novamente um conjunto de questões: “ se nem o empregador nem o trabalhador dispuserem de equipamentos adequados, onera-se o empregador-empresário que queira fazer sobreviver a sua empresa, mantendo a laboração, com a aquisição de novos equipamentos? E o Governo apoia mais este custo?”

Manter direitos dos trabalhadores, como subsídio de refeição, “não é justo”

A CCP dá ainda conta que o projeto decreto-lei enviado aos parceiros sociais apresenta uma solução legal para a questão dos direitos dos trabalhadores em teletrabalho, mantendo todos os direitos anteriores a esta situação, e os mesmos direitos dos trabalhadores que exerçam a sua atividade presencialmente, incluindo quanto ao subsídio de refeição. “Não é justo e não é adequado à situação”, realça a CCP no seu parecer.

A Confederação defende que o subsídio de refeição “é uma prestação inerente à prestação efetiva e presencial de trabalho: destina-se a custear as despesas que o trabalhador suporta com a sua refeição e que não suportaria normalmente se não estivesse deslocado para trabalhar. Assim, o subsídio de refeição não é devido quando o trabalhador falta ao trabalho, adoece ou goza férias, por exemplo”.

A CCP afirma não compreender a atribuição de subsídio de refeição – nem o de outras prestações estritamente inerentes à prestação presencial de trabalho – em situação de teletrabalho, e, diz, “nem parece aceitável onerar o empregador com um custo extraordinário por uma situação que não provoca”.

“A não ser assim, abre-se a porta a que o empregador tenha de duplicar custos de funcionamento: os que suporta mantendo a empresa a funcionar como habitualmente, mais os que passaria a suportar com o exercício de atividade, nas suas instalações próprias, pelos trabalhadores em teletrabalho. Quem suportará mais este custo?”, conclui.

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