O preço das casas está a subir rapidamente e a criar uma pressão cada vez difícil de sustentar para a classe média. Esta é uma conclusão possível que se pode retirar de um estudo do Banco de Portugal publicado nos últimos dias e que liga a subida do preço da habitação a interesses dos estrangeiros (residentes não habituais) e ao turismo.

Mas será que esta é a leitura correta? Quando conversamos com gente do setor, nomeadamente a nível de promotores imobiliários e senhorios, a ideia que fica é bastante diferente. Antes de mais, o parque imobiliário habitacional em Portugal não pode ser tratado como um todo. Uma coisa é a habitação nos centros de Lisboa e Porto, outra é o preço da habitação nos arredores, que são dormitórios, e depois vem o resto do país. E comecemos por esta última parte. O parque imobiliário na província não se valorizou, houve subidas modestas em zonas de dormitório, continuam a subir os preços nas duas maiores cidades e entrou-se na especulação nas zonas históricas das duas cidades.

E chegados aqui vamos responder a três questões. A importância do património imobiliário é relevante para os portugueses? O mais recente relatório da SaeR diz, no trabalho “A habitação como herança patrimonial dos baby boomers” e tendo por base dados de 2015, que “o valor do património dos particulares, englobando o património das famílias e das instituições particulares de solidariedade social, ascendia a 630 mil milhões de euros, cerca de 350% do PIB”, para mais à frente os analistas da SaeR concluírem que, “genericamente, as famílias portuguesas apresentam uma situação patrimonial sólida, com o valor da dívida acumulada a representar aproximadamente 26% do total dos ativos”. A resposta é que o imobiliário é relevante.

O segundo é perceber se o imobiliário nacional funciona como um offshore para dinheiro vivo e como paraíso fiscal para alguns. A questão não é fácil, porque não sabemos se por cada “visto Gold” há uma investigação aprofundada sobre a proveniência do dinheiro. É curioso perceber-se que há ruas em Lisboa que estão a ser compradas por empresários de países asiáticos que conhecemos habitualmente pela pobreza da população e da sociedade em geral, mas que aqui são verdadeiros “poços de ouro”. Por outro lado, temos por cá cada vez mais franceses e naturais do Norte da Europa que ficam isentos de pagamento de impostos durante 10 anos e apenas precisam “fingir” que cá habitam 180 dias por ano. Claro que houve reabilitação habitacional nos cascos históricos, mas, muita dela, feita dentro do conceito de reabilitação do pladur, o que para entendidos é suficiente!

E o último tema é recorrente: Lisboa precisa de 25 mil habitações para a classe média e a preço compatível para manter os nativos na cidade. Compete às entidades públicas resolver o drama, ou seja, reabilitar e construir onde as pessoas querem viver e não para onde os querem mandar viver.