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‘To bite or not to bite’, uma (possível) explicação dos preços dos novos iPhones

Estará a empresa mais valiosa do mundo a perder terreno para as outras fabricantes? “No final do dia, a Apple não quer vender todos os telefones que se vendem no mundo”, diz Pedro Janela, especialista em marketing. “Quer vender aqueles que pode pela máxima margem de lucro possível”.
17 Setembro 2018, 07h15

Na semana passada, no dia 12 de setembro, a Apple lançou três novos iPhones e a quarta geração do Apple Watch. À semelhança do que aconteceu com o lançamento do iPhone X, há um ano, o Twitter tornou-se num repositório de críticas com a tónica no preço dos novos smartphones, depois do #AppleEvent2018.

Do lado dos investidores, o ticker AAPL registou ganhos e perdas entre os dias 12 e 14 de setembro, espelhando o sentimento misto sobre os preços dos novos iPhones entre analistas de Wall Street. No fecho da sessão do dia 12, as ações da Apple perdiam 1,24%. No dia seguinte, fecharam a valer 226,41 dólares, um aumento de 1,25%. Na sexta-feira, dia 14 de setembro, novo tombo de 1,14%, para os 223,84 dólares.

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Vamos diretos ao assunto: afinal de contas, o que aconteceu no evento da Apple? “A Apple não faz nada por acaso”, disse Pedro Janela, CEO do WYgroup, o maior grupo independente de marketing digital e de comunicação a operar em Portugal, com 300 colaboradores. Quanto às críticas, disse o especialista em marketing ao Jornal Económico, acredita que são infundadas “porque as pessoas não percebem o que está ali por trás (literalmente)”. Mas deixemos este último ponto mais para a frente e comecemos pela análise do preço dos iPhones, olhando para a marca da Apple.

Apple, a tecnológica de luxo

Janela foi taxativo quando disse que “a Apple é uma marca de luxo”. São cinco os vetores de uma marca de luxo. O primeiro, Steve Jobs. “Um fundador muito carismático que, em itens de luxo, é quase sempre (ele próprio) uma marca”. “Não há uma marca de luxo sem um criador louco que a tenha lançado”, disse Janelas. A esse respeito, “podemos falar do Louis Vuitton, da Chanel e do Gucci”. Seguem-se “os pontos de retalho absolutamente magníficos”, “um serviço ao cliente inacreditável” e “a escassez de produto”.

Finalmente, segundo o CEO português, o mais difícil de se fazer: “a beleza [do produto] e a capacidade de fazer a junção entre um objeto de arte e um objeto funcional que as pessoas queiram”. “A estética foi injetada na Apple, desde o primeiro dia, por Steve Jobs. Depois, quem transportou o testemunho da estética foi Jony Hive, que é a pessoa que acaba por ser o escultor dos produtos que a Apple faz”, explicou o especialista em marketing. “Não há dúvida nenhuma de que qualquer coisa que eles façam merece ser colocada num museu”. Afinal, tudo à volta da história da Apple tem a ver com os produtos extraordinários”, afirmou Janela.

De acordo com o relatório BrandZ, as cinco marcas valiosas do mundo são todas tecnológicas. Entre estas, só há uma que é de luxo – a Apple – ocupando a segunda posição, com uma brand value de 300,6 mil milhões de dólares, 1,4 mil milhões de dólares abaixo da Google. Seguem-se a Microsoft, a Tencent e o Facebook.

O valor de uma marca explica o premium no preço dos seus produtos e, na perspetiva do comprador, determinada “marca ajuda [a pessoa] a construir a sua própria marca”, afirmou Janela. Além disso, para o CEO português, os ‘Apple users’ continuam a ser leais à marca por causa do “ecossistema fechado entre os relógios, computadores e iPhones” que a tecnológica criou. “Dão uma segurança muito grande e [ninguém quer] transferir os seus dados de um lado para o outro”, disse. Em suma, “quem está habituado a esse sistema (iOS) encara a mudança com grande dificuldade”. No mundo da alta finança, segundo a revista ‘Forbes’, essa foi uma das razões que levou Warren Buffett a investir na Apple. Hoje, a Berkshire Hathaway tem 5% das ações da empresa, numa posição que vale cerca de 46 mil milhões de dólares.

A concorrência à distância

No mercado oligopolista dos smartphones – como em qualquer oligopólio – ganha quota de mercado aquele que praticar preços mais competitivos. De acordo com a International Data Corporation, empresa líder na análise das indústrias tecnológica e de telecomunicações, a Apple vendeu 41,3 milhões de iPhones no segundo trimestre do ano, com uma quota de mercado de 12,1%. Pela primeira vez desde 2010, saiu dos dois primeiros lugares, agora ocupados pela Samsung e a Huawei, com uma quota de mercado de 20,9% e 15,8%, respetivamente.

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Será isto um sinal de alerta para os administradores em Cupertino? Deste lado do Atlântico, Janela foi perentório ao dizer que não tem “dúvidas nenhumas que no dia em que a Apple se começar a importar com a Huawei, é o dia em que se começam a vender as ações” da empresa. Isto porque, disse o especialista, enquanto a “Huawei acha que está a competir na fabricação de smartphones”, a “Apple acha que não (…)”. E foi mais longe: “a Huawei continua a vender telefones, que são aparelhos funcionais, e a Apple está noutro campeonato, que é vender aparelhos pessoais que são obras de arte”.

Essa diferença é, desde logo, visível no preço premium de um iPhone versus, por exemplo, um Huawei. Em Portugal, o Huawei Mate 10 Pro de 128GB encontra-se à venda a partir dos 549,99 euros, enquanto o novo iPhone XR, a versão low-cost da Apple, com 64 GB, custa 879 euros. Enquanto a Huawei “vive a vender produtos bons mas com uma margem barata para poderem competir [com a Apple] e, sendo mais baratos, têm menos margem no produto”, explicou Janela. “Por isso, é-lhes difícil competir com a Apple em I&D e, sobretudo, no momento em que se coloca um preço mais baixo, é o momento em que se deixa de comparar com um produto de luxo”.

Certo. Mas o que fazer em relação às pessoas que as outras fabricantes de smartphones estão a amealhar?  “A Apple não se preocupa com os consumidores que não só não conseguem [comprar um iPhone], como não sentem que o produto lhes vá fazer diferença pessoal. Só se preocupa com as pessoas que são design conscientious ou brand conscientious”, afirmou o português.

#AppleEvent2018, o regresso ao futuro?

 Além do preço, algumas críticas nas redes sociais acentuavam a (aparente) falta de inovação presente nos novos iPhones. Parecia que o Apple Watch Series 4 que, além de detetar a queda do utilizador, consegue realizar um eletrocardiograma em tempo real, quando e onde se quiser, foi a jóia da coroa. Entre risos, Janela arrisca ao dizer que será “o presente de natal para todos pais que tenham problemas de coração”.

Mas a grande inovação foi outra e mede sete nanomilímetros. Segundo o site  “The Inquirer”, o A12 Bionic da Apple, o micro-processador que equipa os novos iPhones, representa “um salto gigante” em relação ao seu antecessor de há um ano. O novo chip da Apple tem uma capacidade computacional para fazer 5 biliões de operações por segundo, contra as ‘meras’ 6 mil milhões do A11 Bionic. No espaço de um ano, a Apple conseguiu contrariar a Lei de Moore, que diz que a capacidade computacional dos micro-processadores duplica a cada dois anos.

E é neste ponto que Janela acredita que “as pessoas não percebem o que está ali”, quando Tim Cook e companhia lançaram os  novos produtos. O especialista em marketing não se recorda “de um incremento de capacidade computacional, sem gastar mais bateria, de um ano para outro”. “Estamos a falar de uma capacidade computacional inacreditável, que lhes permite (à Apple) fazer uma série de coisas que constituem o futuro da [empresa]”, disse. No evento da Apple, “foi dito taxativamente que a realidade aumentada e a realidade virtual só é possível por causa daquele processador”.

Os processadores são a parte fundamental de um smartphone e também, neste domínio, a empresa da California parece demarcar-se dos outros fabricantes de smartphones. Janela explica que a Apple “é a única marca que pensa no processador para aquela cápsula e aquele software” enquanto as outras marcas “têm de esperar pelo roadmap dos fabricantes de chips que tenham outras valências”. “A Apple paga aos fabricantes de chips para fazerem em fábrica os seus chips , o que é bastante diferente”, rematou.

Sobre o futuro, que passa pela massificação da realidade virtual e da realidade aumentada, o CEO português aposta que o departamento de I&D da Apple está a desenvolver “algum tipo de interface” que permita “ver informação nos olhos sem olhar [para um dispositivo]”, só possível por causa do A12 Bionic. Por exemplo, “a Apple não lançou um Google Glass porque o processador que tinha não conseguia fazer as contas necessárias para processar a realidade aumentada em tempo real e com uma experiência de utilização extraordinária”, revelou Janela. “Mais cinco anos ou menos cinco anos, esse produto há-de aparecer no mercado”, antecipou. “E Apple vai ganhar esta batalha”.

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