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Tomás Correia: “Não fui eu a levar as ‘Boats Caravela’ ao conselho de administração”

“Há aí um erro fundamental a aceitar essas cláusulas. Eu tenho muitas dúvidas que o argumento de investidor qualificado permitisse ao Credit Suisse levar vencimento disso. Não percebo porque é que discutimos em tribunal, não percebo porque é que pagámos e calámos”, disse o antigo administrador da Caixa.
  • Cristina Bernardo
28 Maio 2019, 16h57

Tomás Correia, atual presidente da Associação Mutualista Montepio Geral, está a ser ouvido na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) à recapitalização da Caixa Geral de Depósitos. O presidente da Associação foi administrador do banco público entre 2000 e 2003. O relatório da EY sobre a gestão ao banco público abrange o período entre 2000 e 2015.

A CPI começou por interrogar Tomás Correia sobre a operação ‘Boats Caravela’. O antigo administrador da CGD disse que “não fui eu que apresentei a operação ‘Boats Caravela’ ao conselho de administração do banco público.

A operação ‘Boats Caravela’ foi uma das mais ruinosas para o banco do Estado, tendo gerado perdas de 340 milhões. Durante a administração de João Salgueiro, a CGD comprou obrigações do tesouro, no valor de 447 milhões de euros, mas vendeu-as a um veículo especial de financiamento, chamado ‘Boats Caravela’ porque as obrigações tinham um baixo valor no mercado secundário.

O banco Crédit Suisse criou um veículo que absorveu essa dívida pública e emitiu títulos conhecidos como ‘Boats Caravela’. Mas, esses títulos também desvalorizaram, gerando ainda mais perdas. “A Caixa não se conseguia livrar deles e foi registando disfarçadamente as perdas no balanço até se resolver completamente o problema”, escreveu Helena Garrido, no livro “Quem meteu a mão na Caixa”.

Questionado pelo deputado do PS, João Paulo Correia, sobre quem é que tinha falado pela primeira vez na operação ‘boats caravela’, Tomás Correia disse “não fui eu”.

O deputado do PS, descontente, realçou que houve inúmeras deliberações ao mais alto nível da CGD sobre esta operação ruinosa, onde estiveram sempre presentes Tomás Correia, Vieira Monteiro (atual chairman do Santander Totta) e o CEO da altura, João Salgueiro.

“Vivi situações de ‘vamos lá votar estas concessões de crédito'”

Questionado pela deputada do Bloco de Esquerda, Mariana Mortágua, sobre se alguma vez tinha dado parecer negativo a concessões de crédito, Tomás Correia respondeu positivamente. O ex-administrador contou como o “ambiente” e a “cultura” de “apreciar e decidir operações de crédito” mudou.

Numa primeira fase, Tomás Correia explicou que, nas operações de concessão de crédito, havia uma regra: “conceder crédito é uma atividade de risco e, mesmo que estivéssemos convencidos que as operações corressem bem, às vezes corriam mal”. Aliás, continuou, “a regra prudente era: se há aqui alguém que se sente desconfortável, estamos todos desconfortáveis”.

E, mais tarde, salientou Tomás Correia, “vivi situações ‘vamos lá votar estas coisas'”. “Era um ambiente diferente e uma cultura diferente de estar a apreciar e a decidir operações de crédito”, contou.

Conselho de administração nunca foi alertado para as cláusulas do contrato com Crédit Suisse

Tomás Correia, a questão da deputada do BE, Mariana Mortágua, explicou que operação ‘Boats Caravela’ respondeu que foi apresentada “com equilíbrio patrimonial”.

De resto, Tomás Correia salientou por diversas vezes que, nem o conselho de administração, nem o departamento financeiro, na altura liderado por Vieira Monteiro, que tinha a responsabilidade de analisar a operação, nunca foram alertados para as cláusulas do contrato celebrado pela CGD com o Crédit Suisse, cláusulas essas que originaram as perdas para o banco do Estado. “Nenhuma das cláusulas foi a conselho”, disse.

No entanto, Tomás Correia salientou que, embora o “departamento jurídico da Caixa não tenha participado”, “houve um erro crasso”. “Eu não consigo encontrar uma explicação para isso, dentro daquilo que era o normal funcionamento da Caixa”, frisou.

Tomás Correia, de resto, disse na Comissão Parlamentar que se mostrou “estupefacto” quando, mais tarde, leu o contrato celebrado com Credit Suisse sobre os ‘Boats Caravela’.

“Há aí um erro fundamental a aceitar essas cláusulas. Eu tenho muitas dúvidas que o argumento de investidor qualificado permitisse ao Credit Suisse levar vencimento disso. Não percebo porque é que discutimos em tribunal, não percebo porque é que pagámos e calámos”.

Quando chegou a vez da deputada do CDS, Cecília Meireles, Tomás Correia explicou que quem tinha a função de verificar o contrato com a Credit Suisse, “era o departamento financeiro”, na altura liderado por “Vieira Monteiro, que tinha imensa competência na gestão de tesouraria”.

(atualizada às 17h58)

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