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Trump: um elefante na loja de porcelanas, sem partir nada

O presidente norte-americano está em modo ‘reeleição’ e só lhe faltam alguns pormenores internos. Na frente internacional as coisas dificilmente podiam correr-lhe melhor.
  • Kevin Lamarque/Reuters
21 Julho 2019, 13h00

Um dia depois de ter evoluído com assinalável êxito – a acreditar-se nos comunicados oficiais – na Cimeira do G 20 em Osaka e poucas semanas depois de ter averbado um evidente sucesso em mais visita ao Reino Unido, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, visitou o seu ‘amigo’ Kim Jong-un, líder da Coreia do Norte, no seu próprio país, coisa que nenhum outro inquilino da Casa Branca alguma vez conseguira fazer.

Ou seja: em poucos dias, e salvo a questão pendente com o Irão, Trump mostrou estar ao comando de todos os dossiês internacionais mais difíceis, tendo mais que margem de manobra para alardear vitórias em todos esses vários tabuleiros do xadrez internacional.

Uns dias em cheio
A Coreia do Norte era um dossiê que lhe pesava nos bolsos: a segunda cimeira com Kim Jong-un tinha corrido muito mal e, apesar de um ambiente inicial bastante festivo, resultara num fiasco inesperado. A ida à Coreia do Norte acima do paralelo 38 não só obliterou esse insucesso anterior, como recolocou as negociações entre os dois países nos eixos que tinham sido ‘construídos’ na primeira cimeira, em Singapura.

Tudo isto apenas um dia depois de ter participado na Cimeira do G20, durante a qual brincou com o presidente da Rússia, Vladimir Putin (a quem mandou, de dedo no ar, não interferir novamente nas eleições presidenciais norte-americanas), reatou conversações com a China (com cujo presidente, Xi Pinping, se encontrou pessoalmente) e voltou a tentar manter a chanceler alemã Angela Merkel em sentido (por causa das suas recorrentes más contas com a NATO).

Dificilmente as coisas podiam ter-lhe corrido melhor. E tudo isto na sequência de uma viagem ao Reino Unido, durante a qual teve finalmente o privilégio de jantar com a rainha e, mais importante que isso, deixou no ar (apesar de não promover qualquer concretização) a possibilidade de um acordo geral e muito abrangente entre as duas nações.

A ‘coisa’ caiu tão bem entre os desesperados britânicos – que continuam a não ver um fim para o penoso caminho de saída da União Europeia – que ninguém conseguiu levar verdadeiramente ‘a mal’ que Trump tivesse optado por intrometer-se na escolha do próximo líder do Partido Conservador (e por ‘inerência’ do próximo primeiro-ministro) – ‘correndo’, como seria de esperar, em favor de Boris Johnson. Desta vez, nem o bebé Trump, que regressou aos céus de Londres (e vai ser comprado por um museu) conseguiu de facto esconder o sol que iluminou toda a visita presidencial.

Na frente externa, o único dossiê que ainda se mantém em aberto é o do Irão. Mas a verdade é que, como pode ler-se em vários jornais norte-americanos, as reservas de Trump face aos iranianos são bem compreendidas pelos seus compatriotas. Aliás, quando o seu antecessor, Barack Obama, fez tudo o que estava ao seu alcance para desanuviar a má relação entre os dois países, não faltaram as críticas àquilo que uma parte substancial do país quis entender como o claudicar dos Estados Unidos face a um dos seus mais temíveis inimigos. No ‘cenário mental’ coletivo do país, continuam a pairar as imagens da Operação Eagle Claw (24 de abril de 1980), com a qual o presidente Jimmy Carter tentou libertar 52 norte-americanos mantidos reféns na embaixada em Teerão durante 444 dias.

Em campanha
Ou, dito de outra forma: a tensão com o Irão não é nada que coloque em perigo a imagem interna de Trump. Porque desde há várias semanas (ou meses, conforme as fontes) que a motivação do presidente é essa: a reeleição, com o ato eleitoral marcado para novembro de 2020.

Mas, se no plano internacional as coisas estão a correr bem para Trump, internamente ainda há algumas coisas que não estão ‘encarreiradas’. A questão da capacidade de crescimento da economia é, neste quadro, central. E é por isso que várias fontes afirmam sem qualquer exitação que Trump acabará por resolver a questão da guerra comercial com a China: o presidente já terá percebido, apesar de manter a ‘perrice’ que é possível (mais que em teoria) que os Estados Unidos percam mais que aquilo que têm a ganhar com o desentendimento com a China.

Para isso apontam estudos, cartas, discursos, relatórios e demais parafernália documental emanada de fontes da economia, dos mais diversos setores, que imploram ao presidente para que ultrapasse o diferendo. Não tanto pelo que os norte-americanos deixaram (ou deixarão) de importar, mas mais pelo que deixaram de exportar. Nem todas as empresas norte-americanas são exportadoras, mas o grosso do emprego é mantido pelas que têm no exterior uma das suas prioridades.

Outra frente onde as coisas não estão a correr bem é na relação entre a Casa Branca e a Reserva Federal (FED). A autoridades monetária estava apostada em continuar a subir as taxas de juro diretoras – mas subitamente, da última vez que se debruçou sobre o assunto, parou a subida e manteve-as.

Trump voltou a queixar-se, mas pareceu mais por desfastio que outra coisa: os analistas já incorporaram que em pouco tempo a FED acabará por fazer a vontade à Casa Branca. Num quando em que o Relatório Mueller já não é capaz de fazer qualquer mossa (o Congresso já nem se deve lembrar da sua existência), Trump parece cada vez mais imbatível.

Onde param os democratas?
Até porque do outro lado as coisas parecem bastante mais opacas. Depois de o ‘reincidente’ Bernie Sanders ter aparentado sair à frente de todo o numero pelotão de candidatos, acabou por atrasar-se. Foi ultrapassado por Joe Biden, ex-vice-presidente de Barack Obama, mas terá 78 anos na altura das eleições e isso não será com certeza um bom motivo para votarem nele.

Abaixo destes dois candidatos de topo, há mais de uma dezena de ‘guerreiros’ – mas o problema é que só guerreiam Trump nos intervalos das suas próprias ‘guerras civis’ e por isso pouca mossa fazem ao atual presidente.

Seja como for, será de não esquecer que falta mais de um ano para a votação.

 

Artigo publicado na edição nº 1996, de 5 de julho, do Jornal Económico

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