Sou a favor de todas as propostas que procurem promover o regresso de portugueses ao País. Por razões sociais, económicas, demográficas, de sustentabilidade, precisamos de mais gente. Somos poucos. E sabemos que, no futuro, se não invertermos a trajetória sistematicamente revelada por estudos vários, seremos cada vez menos. Essa evidência não precisa de mais demonstração. Portanto, toca aos governos promoverem condições para o retorno motivado pela livre iniciativa individual, para o aumento da taxa de natalidade e para a atração de imigrantes (escolhidos estes pela necessidade do mercado de trabalho e da sua previsível capacidade de se integrarem na sociedade nacional, como fazem os países orgulhosos da sua História e zelosos da segurança dos seus).

Dito isto, já posso acrescentar: a proposta revelada pelo Governo, nos últimos dias, de incluir um desconto de 50% do IRS aos cidadãos que tenham emigrado e voltem no próximo ano ou em 2020, é uma vergonha. Porquê? Porque não é uma proposta. É um acerto de contas político.

Eu explico.

António Costa só pretende incentivar o regresso de pessoas que tenham tido residência fiscal no território português até 2015 – ou seja, na lógica do Governo, pessoas que tenham saído devido à crise motivada pelos malvados da troika. Só por uma réstia de pudor não diz a verdade toda: que tenham saído enquanto Passos Coelho foi primeiro-ministro.

É isso que acho repugnante.

Os portugueses merecem mais do que continuar a ser discriminados por políticos vesgos. Todos devem ter os mesmos direitos – e não só aqueles que saíram nesse período, de 2011 a 2015, aliás consequência direta do descalabro do governo de José Sócrates, que pediu a intervenção da troika, coisa de que o PS se parece esquecer demasiadas vezes.

O que seria legítimo era um programa mais complexo, que não colocasse balizas políticas vingativas e reconhecesse o óbvio: quem saiu, quando quer que tenha saído, fê-lo para melhorar a sua vida e, provavelmente, também da sua família. E faz falta.

Pergunto: porque é que um português que tenha emigrado para Inglaterra no tal período deve regressar com mais condições do que outro da mesma idade que fuja agora da tragédia da Venezuela, onde viveu quase toda a vida?

Creio que, ao invés desta discriminação de faces várias – porque também aqui existe uma dimensão etária e de formação académica mais do que subliminar –, toda a gente compreenderá ser justo incentivar mais quem regresse no auge da vida de trabalho ativa do que na situação de reformado.

A intenção governamental é, pois, profundamente discriminatória. Por isso mesmo, aliás, a notícia foi mal recebida tanto à direita como à esquerda, embora por razões diferentes.

Eu acredito que o Governo nem sequer descortina que está a dizer-nos a todos que passa bem sem os compatriotas que foram saindo ao longo dos tempos, para trabalhos mais ou menos braçais, e que só pretende ver de volta alguns jovens cérebros que possam ter saído na enxurrada da grande crise. Como se gente jovem e bem sucedida pudesse decidir deixar uma vida feliz e de sucesso algures no mundo para vir aqui locupletar-se com 50% do IRS! Pobres cabeças seriam. E, nesse caso, bem merecedoras deste projeto tal como está.