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Vítor Bento alerta que fiscalidade discriminatória pode levar à deslocalização das sedes dos bancos para fora do país

“Só a banca instalada em Portugal, apesar das fragilidades reveladas, continuou a financiar a economia portuguesa”, lembrou o presidente da APB para alertar que “os obstáculos de origem nacional à competitividade dos bancos aqui estabelecidos são um incentivo à sua deslocalização”.
5 Novembro 2021, 09h52

O presidente da Associação Portuguesa de Bancos (APB) falava na Money Conference, organizada pelo Dinheiro Vivo do grupo Global Media, quando recorreu à metáfora do corpo humano e do papel importante do estômago, para falar do “papel essencial que a atividade bancária desempenha no funcionamento de uma economia e no bem estar da sociedade e o mal que podem fazer a ambos estes desideratos as abordagens e atitudes estigmatizantes do sector”.

“Ainda recentemente, na crise pandémica, o sector demonstrou, mais uma vez, a sua relevância social, funcionando como estabilizador financeiro e contribuindo decisivamente para o amortecimento dos danos económicos e sociais da quebra económica provocada pela pandemia”, disse Vítor Bento que lembrou que Portugal foi o terceiro país europeu onde mais se recorreu às moratórias bancárias para apoiar as empresas e as famílias durante a pandemia (22,5% do PIB), “contrastando com uma das mais reduzidas dimensões dos apoios do Estado à economia (11,2% do PIB)”.

“É, pois, bom para todos que se perceba o relevante e insubstituível papel social e económico que a banca desempenha e o seu contributo para o bem-estar económico e social”, frisou o presidente da associação que lamentou “a grande desconsideração sobre os bancos”, que paira nos opinion makers.

Essa “esquizofrenia opinativa” contrasta com “o persistente reforço dos depósitos bancários, a que vimos assistindo nos últimos anos, mesmo em contextos de crise, não pode deixar de ser lido como testemunho de confiança” e com os “elevados níveis de satisfação dos clientes” nos inquéritos de satisfação.

Vítor Bento reconheceu que quando a última crise financeira bateu à porta, “há mais de uma década, vários analistas de inspiração liberal, onde eu me incluía, consideraram que a fragilidade então apresentada pela banca em Portugal iria permitir uma rápida penetração dos bancos do estrangeiro, que rapidamente aqui expandiriam a sua atividade e ganhariam quota de mercado”. No entanto “aconteceu foi precisamente o contrário”. Isto porque a banca no estrangeiro, “que tinha financiado despreocupadamente o insustentável endividamento do país, retirou-se apressadamente quando a crise caiu sobre nós, exigindo reembolsos intempestivos”.

“Só a banca instalada em Portugal, apesar das fragilidades reveladas, continuou a financiar a economia portuguesa e teve que cobrir o buraco de financiamento aberto pela referida fuga. Não fosse esta banca e a recessão económica teria sido muito mais profunda e socialmente muito mais penosa”, disse Vítor Bento que lembrou que sem os bancos portugueses “as PME teriam tido sequer acesso a crédito” porque não passavam no modelo de um analista de crédito situado numa qualquer capital europeia. Só passa numa banca que conheça de perto o ramificado tecido empresarial que forma a economia do país. Ou seja, requer uma presença e uma proximidade física e cultural”.

O presidente da APB revelou que as autoridades responsáveis europeias têm sido bastante explícitas a louvar e incentivar a consolidação bancária transfronteiriça e a defender – passo a citar declarações oficiais – “que os bancos dependam mais amplamente de sucursais e da livre prestação de serviços [crossborder], em vez de usar subsidiárias”, pois que isso permite “otimizar as sinergias que existem dentro dos grupos bancários”.

Vítor Bento apelou à conclusão da União Bancária – “à qual falta o pilar mais importante para ser o que pretende ser – desencadeou um processo centrípeto de localização da atividade bancária, que acelera o que já é inerente à própria integração europeia”.

O presidente da APB salientou que a pobreza económica relativa do país, constitui como que uma adversidade natural à sediação de atividade bancária em Portugal. Por isso “todos os entraves competitivos que as autoridades e os reguladores nacionais introduzam sobre os bancos estabelecidos em Portugal são objetivamente amplificadores dessa adversidade natural e aceleradores da força centrípeta que tende a afastar do país a localização da sua atividade bancária”.

Entre estes entraves destacou “a fiscalidade discriminatória dirigida especificamente ao sector, como são as contribuições extraordinárias para o Fundo de Resolução Nacional (em cima daquela a que, como todos os outros os bancos europeus, também estão sujeitos para o Fundo de Resolução Europeu) e o Adicional de Solidariedade, criado para a emergência de 2020, mas que se pretende estender para além da emergência; proibições de cobrança direta de alguns serviços prestados; e outras restrições limitadoras dos seus modelos de negócio”.

O economista que lidera a APB deixou por fim uma alerta sobre todos “os obstáculos de origem nacional à competitividade dos bancos aqui estabelecidos são um incentivo à sua deslocalização – seja de sedes para sucursais, seja de sucursais para representações, como aconselham as autoridades europeias – e que esta deslocalização, a ocorrer, acarretará para o país a perda de empregos qualificados, de valor acrescentado e, através deste, de base fiscal. O que, tudo junto e numa palavra, significa empobrecimento. Além de estreitar a autonomia estratégica do país”.

“Tal resultado não será fruto do azar, da globalização, ou de outras habituais desculpas para os nossos insucessos; será o resultado de escolhas políticas concretas”, concluiu.

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