António Costa, Mário Centeno e Vieira da Silva são os pesos pesados do Governo que estão a tratar do programa extraordinário de regularização dos precários do Estado. É natural que assim seja, é um processo histórico na Administração Pública e um dos pilares que suporta os acordos que viabilizaram o Governo.
Por isso, porque estamos a falar dos ministros mais importantes do Governo e do próprio primeiro-ministro, é de estranhar o acumular de erros a que temos assistido neste processo.
Esses erros são, aliás, o que levou no passado sábado a que os precários do Estado se manifestassem pela primeira vez em Lisboa e no Porto. Centenas de trabalhadores do Estado, que desde há décadas diversos governos têm condenado a contratos precários e fora da lei, saíram à rua para exigir que terminem os erros e que ninguém fique para trás.
Vejamos que erros são esses:
1) Falta de transparência
Durante todo o processo, o Governo tem-se furtado a apresentar os números do programa. A custo, após enorme pressão dos movimentos de precários, o ministro Vieira da Silva informou que tinham sido entregues cerca de 32 mil requerimentos e que apenas um terço tinha sido aprovado até à data pelas Comissões de Avaliação Bipartida (CAB). Para além disso, o Governo nunca divulgou o número de decisões favoráveis e desfavoráveis por parte de cada CAB.
2) Atrasos sucessivos
Todos os prazos iniciais já foram largamente ultrapassados. Os ministros já prometeram que a partir de agora o processo irá correr com mais celeridade, mas o que se sabe é que dos 32 mil requerimentos entregues apenas 7% já tiveram despacho dos ministros. Num momento em que se previa que a maioria dos concursos para recrutamento destes precários já estivesse a decorrer, apenas 43 foram lançados.
3) Não proteção dos precários envolvidos no processo
O Governo não apresentou garantias de proteção contra o despedimento dos trabalhadores precários que submeteram o requerimento. Assim, há notícias de serviços que estão a despedir os seus trabalhadores precários, apesar de estes estarem abrangidos pelo programa de regularização. Ou seja, as CAB podem decidir a integração de uma pessoa que foi despedida há poucas semanas pela chefia. É uma situação absurda, bastava que o vínculo precário se prolongasse automaticamente até à decisão da CAB, havendo depois integração ou dispensa.
4) Falta de coerência no processo
As Comissões de Avaliação Bipartida não estão todas a funcionar da mesma maneira. Algumas CAB inventaram regras próprias, onde o falso outsourcing, as bolsas ou os estágios estão excluídos do PREVPAP. A multiplicidade de critérios e o não cumprimento da lei por parte do Estado são situações graves que cumpria ao governo fiscalizar.
5) Buraco negro nas autarquias locais
Não se sabe quase nada sobre o avançar do procedimento nas câmaras municipais e nas juntas de freguesia. Não há informação e os testemunhos que têm vindo a público fazem temer o pior, com muitos presidentes de câmara a inventarem regras próprias ou a roçarem o despotismo. Relembre-se, os presidentes da câmara de Sintra, Amadora ou Leiria deram conta que não vão integrar muitos dos seus trabalhadores precários. Apesar da separação de poderes, o Governo tinha ferramentas para garantir a transparência dos processos nas autarquias locais.
6) Falta de ação aos boicotes
O exemplo do que se passa na área do Ensino Superior e Ciência é paradigmático: segundo dados da FENPROF, que participa nessa CAB, apenas 2% dos requerimentos de docentes foram aceites. E para perceber este número basta conhecer a posição divulgada pelos reitores da universidades portuguesas que recusaram reconhecer os investigadores e professores precários como necessidades permanentes. Como é que uma universidade, cuja finalidade é investigar e ensinar, o faz sem investigadores e professores? Infelizmente, o ministro da Ciência e Ensino Superior tem sido conivente com os reitores, ao arrepio da lei.
Ainda há tempo para resolver estes 6 erros e da sua resolução ou não se fará o balanço final da regularização dos precários da Administração Pública.