Um dos desafios que se colocam aos decisores políticos em qualquer área de governação é o de fazer escolhas. Escolher como e onde se aplicam os recursos públicos, em que áreas e quais os beneficiários.

Claro que há quem não goste que o Estado intervenha na economia, que apenas seja um mero regulador (embora a “não intervenção” seja ela própria uma escolha). Mas, na prática, não há casos concretos de países onde isso aconteça. Mesmo nos EUA, que muitas vezes é apontado como exemplo de liberalismo económico (muito devido à fase Reagan), isso não acontece. Aliás, os EUA são um bom exemplo de país que faz escolhas em termos de política económica, que direciona os recursos públicos para as áreas que considera vitais para a sua competitividade (casos dos setores da aeronáutica, do Espaço, do automóvel, da biotecnologia das TIC, etc.).

Historicamente, os EUA têm utilizado não só a política fiscal, mas também os apoios diretos à indústria ou a setores de atividade, tendo nas últimas décadas desenvolvido uma política de clusters para esse fim (nomeadamente pela Administração Obama). Também é importante mencionar os fortes recursos públicos direcionados para a Ciência e a Inovação e para a produção de conhecimento avançado no último século, muito impulsionados pelos objetivos estratégicos de desenvolvimento das várias fases do programa Espacial e das políticas de Defesa. Atualmente, os EUA apoiam financeiramente cerca de mil infraestruturas públicas (ou público-privadas) de investigação fundamental e aplicada em vários domínios e áreas temáticas.

Na Europa, o apoio à política científica e à inovação nas últimas décadas tem encontrado nos Programas-Quadro de I&D o principal instrumento de financiamento público. O atual e ainda em vigor Horizonte 2020 (8º Programa-Quadro), contemplava cerca de 80 mil milhões de euros para o período 2014-2020, a aplicar em áreas concretas escolhidas pela Comissão Europeia e pelos Estados-membros (por exemplo, na área industrial ou em desafios societais, como o envelhecimento ativo ou as alterações climáticas).

Atualmente, está em curso o processo de definição do próximo Programa-Quadro, com envolvimento de vários atores a nível local e regional, estando em discussão quais as prioridades e as temáticas alvo de investimento público para a próxima década. Para este trabalho, o Comissário Europeu da Investigação e Inovação, Carlos Moedas, conta com a colaboração da Professora Mariana Mazzucato, uma das mais conceituadas economistas em política de inovação.

Mazzucato há muito que defende o papel intervencionista do Estado na promoção da inovação: o Estado é um ator importante na indução da inovação, do empreendedorismo e na criação de novos mercados e não apenas um ator regulador da economia. O Estado (políticas públicas) deve definir quais as prioridades e áreas de desenvolvimento de longo prazo (por exemplo, a descarbonização da economia), desenhando as “missões” para atingir esses objetivos (ou seja, quais as políticas necessárias, para onde direcionar os recursos, que metodologias de intervenção utilizar, etc.).

Os primeiros contributos de Mariana Mazzucato para o Comissário Carlos Moedas, com as suas sugestões de prioridades para o próximo Programa-Quadro de I&D e Inovação, estão vertidos do relatório “Mission-Oriented Research & Innovation in the European Union”. Entre outras sugestões, é dada importância ao envolvimento dos atores locais (regionais e nacionais) no desenho e implementação de políticas (promovendo o cruzamento de competências e de experiências intersetoriais e multidisciplinares), à criação de um sistema robusto de monitorização de resultados (criação de evidências) ou à introdução da experimentação e teste nas políticas de inovação.

Contudo, Mariana Mazzucato relembra a importância de se olhar para os contextos nacionais e regionais aquando da definição e implementação da política de inovação (no “one size fits all”). Pois o que resulta bem na Alemanha pode não resultar bem por cá…