Numa semana dominada pelas questões na Síria, pelo escalar da violência verbal a envolver a Coreia do Norte e as potências mundiais e ainda pela expetativa que está a gerar o resultado das eleições em França, vamos agarrar num tema bem nosso. Falamos do arrendamento em Lisboa e Porto, da pseudo reabilitação a que os cascos históricos destas cidades assistem diariamente, da substituição da população indígena por uma classe média, essencialmente turistas de média e longa duração e a resposta política e social ao tema. Vamos usar o termo de “turisficação acelerada”, o qual tem direito de autor reservado a António Frias Marques, da Associação Nacional de Proprietários.
Todos os que vivem nas duas maiores cidades do país convivem diariamente com uma nova fauna (não é pejorativo) de moradores, que começaram a pulular nos cascos históricos para rapidamente migrarem até às periferias das cidades. O que de dramático está a acontecer é a formação de uma espécie de parque Disney (a frase também tem direito de autor, mas não sei de quem), onde dificilmente se vê um indígena nestes territórios. Foram ocupados por uma nova classe, mais endinheirada e que permanece nas habitações por períodos curtos ou longos, mas que fruto de uma opção pela rentabilidade rápida dos imóveis acabou por substituir os ocupantes tradicionais e que caracterizavam os bairros, quer em termos de comportamentos sociais, quer de afazeres económicos. E pergunta-se se isto é mau, tendo em conta as questões económicas ligadas à indústria do turismo e da construção/reabilitação. A resposta é fácil nos dias de hoje. Há zonas profundamente descaracterizadas em termos populacionais e a resposta política não é de todo a melhor. Ainda no recente pacote aprovado pelo Governo e relacionado com o tema, foram pensados assuntos importantes como é o caso das lojas históricas ou a legislação dos despejos, mas foi esquecido algo simples como os subsídios de renda. Os custos anuais estimados situar-se-ão nos 50 milhões de euros, algo insignificante no OE e que seria reaplicado pelos senhorios na reabilitação das habitações. O grande trunfo da medida seria manter os atuais inquilinos, os tais que caracterizam os bairros e que evitam que a Madragoa e outras zonas se tornem parques Disney, nos locais de origem.
Depois é discutível a reabilitação que se faz, sobretudo em Lisboa. Será melhor alterar a designação por fachadismo, pois de reabilitação têm pouco. É fácil encontrar donos de obra a deitar fora cantarias pombalinas e a optar por materiais novos, que são mais duráveis mas que nada têm a ver com o histórico da cidade, ou a substituir as “gaiolas” pombalinas por paredes em betão. O que justifica o facto de a baixa pombalina não ter conseguido ser candidata a Património Mundial da Unesco? A resposta é óbvia.