Porque o Verão é sinónimo de férias, recomendo um par de leituras e alguns percursos culturais, qual companhia e alimento do intelecto. “Quem meteu a mão na Caixa” (Contraponto, Maio de 2018), da jornalista Helena Garrido, umas das mais experientes observadoras da realidade do sector bancário em Portugal. Com base em fontes públicas, e apenas estas, a autora deslinda como foi possível a Caixa Geral de Depósitos quase ter colapsado por sucessivas intervenções de pessoal político, pouco experiente e sabedor da coisa bancária. Estórias mirabolantes. O desrespeito pelos trabalhadores da Caixa e do seu saber e experiências. Leitura obrigatória para todos os cidadãos. Aqui se vê como alguns, alheios ao sector, têm vindo a fazer incidir sobre os bancários e os contribuintes, chamados a pagar com o seu posto de trabalho e os seus impostos, os desmandos desses personagens alienígenas ao sector financeiro.

Se com a obra supracitada percebemos que as maleitas que alguns bancos padeceram foram alheios os bancários, com “O ataque aos milionários” (Esfera dos Livros, 2ed, Abril de 2015), o jornalista Pedro Jorge Castro mostra-nos, entre outras coisas, como de desenrolou o impressionante ataque às famílias dominantes da época (Champalimaud, Mello, Espírito Santo) e aos seus interesses económicos. Terá, quiçá, passado despercebido um outro aspecto, que me interessou sobremaneira: os bancários como uma classe combativa e reivindicativa, nos anos quentes pós-revolucionários.

Claro que ninguém pode simpatizar com detenções arbitrárias, ou sem mandato judicial, como foi timbre nesse tempo, para citar apenas um dos aspectos menos salutares dos excessos cometidos. Mas ao ler os testemunhos dos sindicalistas bancários de 1975, transparece uma determinação, uma vontade de mudar e de corrigir assimetrias, que hoje encontramos em outros sectores profissionais: professores, médicos, enfermeiros, juízes, pilotos de aviação, entre outros. Talvez sem surpresa, aqueles que estão a conseguir recuperar alguns direitos e poder de compra, uns e outros tão maltratados durante a intervenção da troika. Sem espírito de corpo, sem determinação, não existem direitos sociais e políticos, nem uma classe média forte.

Em “Os vivos, o morto e o peixe frito” (Caminho, 2ª edição, 2014), o fabuloso escritor angolano, Ondjaki, prémio Saramago, dá-nos uma visão humorística da convivência da lusofonia em Lisboa, tendo como pretexto um jogo de futebol entre Angola e Portugal. Ou uma forma de nos recordar que tanto devemos aos emigrantes e imigrantes de que é feito Portugal. Isto é tanto mais importante quanto as pulsões nacionalistas parecem assolar a construção europeia. A inflexibilidade do euro, que impõe desvalorização de salários aos países do Sul da Europa como forma de ganhar capacidade concorrencial, e a recusa do estrangeiro, estão no cerne do risco de implosão da construção europeia. Construção europeia que tantos pensaram que seria eterna e sobre a qual assentou o “consenso social” português.

Entrementes, a Fundação Social Bancária promove, no dia 28 de Julho, uma visita à notável obra de arquitectura que é o Terminal de Cruzeiros de Leixões. E é parceira da Caminhada e Corrida do SAMS Quadros, em Belém, no dia 29 de Setembro. Duas actividades que sugiro aos leitores que reservem tempo na sua agenda.

Finalmente, saúdo uma medida do Banco de Portugal, ao introduzir uma “recomendação” na forma como os bancos devem apreciar os riscos e a concessão de crédito àhabitação. Pró-activo, inovador e muito profiláctico. Para o bem de todos. Doravante, talvez seja tempo de o Regulador olhar para a os créditos pessoais, instantâneos, por telefone e pela internet. Causa de miséria financeira nos EUA, e cuja filosofia e métodos estão a ser replicados neste cantinho à beira-mar plantado.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.