Nuno Crato foi um dos ministros mais contestados do XIX governo constitucional. Assumiu a tarefa ciclópica de juntar educação, ensino superior e ciência num mesmo ministério, afrontou os interesses instalados, submetendo alguns dos candidatos à docência a uma odiada prova de acesso, apostou na matemática e no português como disciplinas estruturantes, impôs rigor e exigência. Quatro anos depois de se ter sentado na 5 de Outubro, Crato saiu sem glória, sendo considerado por muitos opositores como um dos piores ministros da Educação de sempre.

Trabalhei com Nuno Crato durante dois anos. Não o conhecia pessoalmente. Tinha em comum comigo o facto de ser independente, não estando ligado às máquinas partidárias. Era, como eu, um sonhador, pensando, quiçá utopicamente, ser possível fazer mudanças profundas, implementar novas ideias, apontar novos rumos, nas suas palavras, “implodir o Ministério da Educação”.

Rapidamente, percebeu, por ser um homem inteligente, que não iria conseguir alcançar a esmagadora maioria dos objetivos. Prisioneiro de um sistema viciado, onde a máxima que ecoa em que esquina é “para quê mudar, não está já suficientemente mau assim”, Crato viu-se na necessidade de reduzir o número de batalhas a travar, de encolher as ambições, de selecionar cirurgicamente as metas a atingir. Uma das suas principais preocupações era instalar no sistema educativo a meritocracia, de premiar a exigência de professores e alunos. Para ele, a escola não era, ao contrário do que agora apregoa o novo ministro, Tiago Brandão Rodrigues, um espaço de lazer, onde crianças (alunos) e adultos (professores) devem, acima de tudo, ser felizes.

A escola deveria, em primeiro lugar, ser um espaço onde se transmitem e apreendem conhecimentos, mais do que competências. Um local destinado a professores que têm no ensino a sua vocação e não àqueles que vêm neste uma simples saída profissional, um sítio onde se aposta decisivamente em dar aos alunos ferramentas essenciais em domínios estruturantes, como a matemática e o português, onde as metas curriculares são rigorosamente definidas e onde os alunos são frequentemente avaliados.

A educação e o saber são, inquestionavelmente, os mais poderosos elevadores sociais. O reforço da exigência e da igualdade de oportunidades, fazem com que, independentemente da sua origem social, os alunos possam afirmar o seu mérito, conquistar um lugar ao sol, igualar ou mesmo ultrapassar aqueles que foram bafejados pela sorte de nascerem em berço dourado.

Um ano após ter saído da 5 de Outubro pela porta pequena, Crato vê o seu trabalho e a sua aposta serem objetivamente reconhecidos, numa altura em que Tiago Brandão Rodrigues já desmantelou praticamente toda a obra que ele havia deixado, desejoso, desde o primeiro dia, de não deixar pedra sobre pedra do edifício que Crato tão afanosamente havia conseguido erigir.

Os resultados do PISA de 2015, que colocam os alunos portugueses de 15 anos pela primeira vez acima da média da OCDE, e dos testes TIMMS (Trends in International Mathematics and Science Study), que guindam os alunos portugueses do 4º ano de escolaridade a uma posição invejável na área da matemática – superando a emblemática Finlândia –, dão a Crato a satisfação de saber que o caminho gizado estava certo, de que a exigência perene deve superar a felicidade fugaz. Isto porque um indivíduo só consegue ser verdadeiramente feliz se se realizar pessoal e profissionalmente e isso só é possível se se for útil e produtivo.

Não temos dúvida de que o mérito não pertence apenas a Crato, os seus detratores dirão mesmo que ele existe apesar de Crato. Estamos conscientes de que a estratégia que permitiu alcançar estes resultados já vem do início do século XXI, mas, politiquices à parte, porque a educação é algo de demasiado sério para se deixar enredar numa teia de interesses, o PISA e os TIMMS 2015 provam que a exigência é imprescindível para se melhoraram os resultados e que o laxismo que atualmente parece prevalecer nas nossas escolas transmite um sinal errado aos nossos jovens, fazendo com que Portugal continue, no futuro, a segurar a lanterna vermelha da produtividade europeia.