Depois de viver durante quase meio século num sistema autoritário de partido único, Portugal corre, agora, o risco de se transformar numa democracia de partido único, com o Partido Socialista a parecer querer eternizar-se no poder, atirando o Partido Social Democrata para a missão de simples muleta dos socialistas.
Desde a revolução de Abril de 1974, o nosso país tem conhecido uma saudável rotatividade entre dois partidos de poder, com mais pontos de contacto do que elementos separadores: o Partido Socialista e o Partido Social de Democrata. A normalidade tem sido que nenhum partido faça mais do que dois mandatos consecutivos, ainda que o segundo, tradicionalmente, possa ser uma liderança mais fragilizada, fruto de maiorias relativas que deixam o partido do poder à mercê de sempre difíceis entendimentos parlamentares.
Em final de 2015, António Costa rompeu com esta lógica, ao ignorar a vontade popular que havia dado a vitória eleitoral ao PàF (PSD/CDS), formando governo com o apoio dos partidos da esquerda radical. A partir desse momento, a bipolarização esquerda/direita ganhou um novo significado, com os eleitores a saberem que, no futuro, vão claramente ter de optar entre ser governados à esquerda (PS/CDU/BE) ou à direita (PSD/CDS).
O PSD passou, assim, de um momento para o outro, de partido de poder a partido de oposição, no sentido de que, muito dificilmente, voltará a assumir, pelo menos nos tempos mais próximos, a liderança de um governo. Na realidade, o PS está, atualmente, na confortável situação de poder ganhar ganhando ou ganhar perdendo. Senão, vejamos: se em 2019 ganhar as eleições, o que parece uma quase inevitabilidade, já que nem os incêndios o “chamuscam”, poderá escolher a muleta que o apoia, optando por continuar a governar à esquerda, com Jerónimo e Catarina, ou por fazer uma viragem à direita, utilizando Rio como seu novo parceiro; se perder para o PSD, poderá sempre socorrer-se da mesma estratégia que utilizou em 2015, atirando pela borda fora o vencedor, para, juntando-se, de novo, à esquerda radical, governar o país.
Dito de outra forma, o PSD só conseguirá voltar ao poder caso consiga, sozinho ou em coligação com o CDS, assegurar uma maioria absoluta na Assembleia da República. O tempo das maiorias relativas ficou, assim, definitivamente para trás, com o Partido Socialista a ser responsável por esta alteração estrutural do sistema político nacional, que faz com que os eleitores saibam, hoje e no futuro, que, independentemente do partido que escolham, a verdadeira decisão está entre a esquerda ou a direita.
O PSD que, tradicionalmente, figurava como ator decisivo do sistema político rotativo em Portugal, estará, pois, pelo menos nos tempos mais próximos, arredado da liderança do país, restando-lhe optar entre ser oposição à esquerda ou muleta do PS. Fica por saber qual a capacidade de aguentar um líder que promete, sem poder cumprir, que “joga apenas para o segundo lugar”, por não ter possibilidade de disputar o primeiro, ainda que vença o campeonato.
Em política, o que hoje é verdade amanhã é mentira, mas Portugal corre o risco, nos próximos anos, de viver numa democracia de partido único, estando a mercê do taticismo político de António Costa e seus correligionários.