Que o Banco de Portugal tenha falhado na crise do BES não é novidade. Entre outras coisas, o supervisor tem sido acusado de ter agido tarde, ter imposto ao GES/BES um ‘ring fencing’ que não resultou e ter dado a cara por uma polémica medida de resolução que, na verdade, resultou de uma decisão política do Governo de Passos Coelho. Medida esta que, tal a sua eficácia, jamais voltou a ser aplicada em bancos europeus de igual dimensão.

No complexo enredo do caso BES, o governador transformou-se numa figura semi-trágica. Bem intencionado, Carlos Costa teve de resolver a maior crise bancária das últimas décadas, da melhor forma que conseguiu e com a margem que o poder político da altura lhe concedeu. É verdade que o Banco de Portugal falhou em vários aspetos e o autor destas linhas foi um dos primeiros jornalistas a apontar isso em artigos de opinião, poucos dias após a resolução do BES, em agosto de 2014. Mas é difícil concluir, face ao desempenho dos seus antecessores, que outro governador teria feito melhor que Carlos Costa naquelas circunstâncias.

Por outro lado, as falhas do supervisor no BES já se conhecem desde 2014 e a recente reportagem da SIC, “Assalto ao Castelo”, apesar de expor alguns factos novos, não veio alterar essa percepção. Daí que seja difícil justificar o cerco que o PS e os seus aliados à Esquerda estão a fazer ao governador Carlos Costa, neste ano da graça de 2017. Porquê agora? O que há de novo que ainda não se sabia em 2016, 2015 e 2014?

A resposta é quase nada. A nomeação de membros do conselho do supervisor precisa do ‘OK’ do Governo e António Costa aproveita estas ocasiões para desviar as atenções de outros assuntos e para enfraquecer a posição do governador do Banco de Portugal, instituição que tem sido um dos raros pólos de poder que escapam ao controlo da maioria de Esquerda. Neste enredo, o PS, mostrando-se cauteloso, faz o papel de polícia bom, admitindo que nunca gostou do governador, cuja recondução lhe foi servida como um facto consumado, mas prometendo continuar a trabalhar com ele; enquanto o PCP e o Bloco fazem de polícias maus, invocando a “falha grave” prevista na lei como situação excepcional para justificar o afastamento de um governador que, tal como os juízes, deve ser inamovível.

O problema é que dificilmente este queimar em fogo lento da figura do governador do Banco de Portugal será do interesse do país. Concorde-se ou não com a forma como Carlos Costa lidou com a crise no BES, fragilizar o governador não contribui para reforçar a confiança na supervisão e no sistema financeiro nacional. Assim, a menos que o governador deixe o cargo pelo próprio pé, o que se espera do Governo é que faça uma de duas coisas: invoca a “falha grave” e afasta de vez Carlos Costa (assumindo os previsíveis riscos para a imagem do país que uma decisão dessas traria), ou desiste da guerrilha institucional contra o governador. Se a primeira opção fosse possível, António Costa já teria seguido por esse caminho. Assim sendo, resta a segunda.