A EDP foi durante anos um dos grandes polos de poder da economia portuguesa, juntamente com o Grupo Espírito Santo e a antiga Portugal Telecom. É, de resto, o único destes polos que sobreviveu ao terramoto que nos últimos anos abalou o tecido empresarial português. E a companhia permanece próspera: o mercado foi liberalizado há 20 anos, mas continuamos a ter uma incumbente a ser compensada pelas receitas que perdeu com a liberalização. Mas a EDP está agora no centro de um furacão, devido à investigação por suspeitas de corrupção no processo que determinou o valor dessa “renda”.
Vamos por partes. No que diz respeito à investigação judicial, deixemos as autoridades fazerem o seu trabalho e respeitemos o direito à presunção da inocência de todas as pessoas envolvidas neste caso. Uma questão será a existência, ou não, de matéria criminal. Esta só estará esclarecida quando o processo for arquivado ou der origem a condenações. Outra questão é do foro político e passa por saber se os contratos existentes defendem os interesses dos consumidores portugueses. E essa discussão, embora seja “old news”, deve ser retomada, dada a sua importância para o bem-estar das famílias e para a competitividade das empresas portuguesas.
Aqui chegados, importa reflectir sobre a forma como o Estado, que nos representa a todos, se portou nesta história. Sejamos claros: António Mexia e os acionistas da EDP têm o direito de tentar maximizar o valor para a sua empresa. Desde que o façam de forma legal, é perfeitamente legítimo que procurem assegurar a maior compensação possível no que toca aos CMEC. Afinal, estão a fazer o seu trabalho. Mas e o Estado? Qual foi o seu papel?
Em bom rigor, o Estado foi um dos principais beneficiados pelas “rendas” que atribuiu à EDP em 1995, 2004 e 2007. Enquanto acionista da energética nacional, o Estado português recebeu chorudos dividendos e outros montantes que lhe foram pagos pela EDP. E em 2011, quando privatizou a energética, esse mesmo Estado utilizou as “rendas” para convencer os chineses a pagarem mais pela participação na empresa. Daí que Passos Coelho e Vítor Gaspar tenham tirado o tapete ao secretário de Estado da Energia, Henrique Gomes, quando este começou a fazer faísca com a EDP.
O grande lesado pelas ditas “rendas” da EDP não é o Estado, mas sim o consumidor português, que continua a pagar a eletricidade mais cara da zona euro. O que não acontece apenas devido à EDP: como se explica que continuemos a pagar uma taxa audiovisual que representa 2% da fatura da eletricidade?
Nota: A Santa Casa entrar no Montepio é uma péssima ideia. Como alguém disse, é tirar aos pobres para pagar os erros dos ricos.