O ‘timing’ escolhido por Rui Rio para apresentar o projeto do PSD sobre os incentivos de fomento aos nascimentos (”Uma política para a infância”) talvez não tenha sido o melhor. António Costa tinha acabado de falar da crise de natalidade durante o último congresso do PS. E estas casualidades, sendo óptimas para gerar episódios de intriga partidária, têm muitas vezes como consequência envenenarem discussões importantes, como esta sem dúvida é: vital para o País e para a própria União Europeia (UE), a tal “avó cansada” de que falou o Papa Francisco, em 2014, no Parlamento Europeu.
Os números não mentem.
Durante o ano de 2016, nasceram 5,1 milhões de bebés na UE, apenas mais 11 mil do que no ano anterior. As taxas de natalidade (nascimentos por 1000 habitantes) mais elevadas nesse ano, o último de que há números, foram apresentadas na Irlanda (13,5%), Suécia e Reino Unido (11,8%), enquanto as mais baixas foram registadas nos países do Sul: Itália (7,8%), Portugal (8,4%), Grécia (8,6%) e Espanha (8,7%), não por acaso os países mais afetados pela crise.
A baixa na natalidade é um problema dos países desenvolvidos, nos quais, entre outras razões que não cabem neste espaço abordar, se planeia com maior responsabilidade a vinda de um ser humano ao mundo. Consultando o sítio pordata.pt, qualquer pessoa pode visualizar como a natalidade tem caído a pique na Europa desde 1960. Portugal veio de 24,1% para os tais 8,4%, o que é brutal.
Neste momento, temos a segunda taxa de natalidade mais baixa entre os 28 Estados-membros da UE e somos (segundo o Eurostat) um dos países cuja população diminuiu. Tivemos, apenas, 87 mil nascimentos. É esta realidade que serve de base para as projecções do INE de um país cuja população tenderá a diminuir até 2060, dos 10,5 milhões de pessoas, em 2012, para 8,6 milhões. E também tenderá a envelhecer, até ao ponto de criar, muito antes dessa data, problemas graves de sustentação ao sistema de segurança social, tanto no pagamento de reformas como de outras prestações.
Quando se fala de natalidade, está, pois, a falar-se de economia e de justiça social. De futuro. É por isso que faz todo o sentido colocar a questão de um ponto de vista económico-financeiro, de investimento e de ajuda às famílias. Financiar em 10.722,50 euros por criança, até aos 18 anos, como defende Rui Rio, entre outras medidas, nem parece muito. E investir entre 400 a 500 milhões de euros anuais neste projeto, se esses forem os números finais, parece-me razoável tendo em atenção o que está em causa. Desculpem as pessoas mais sensíveis que coloque a questão nestes termos mas se os nascimentos são um bom negócio para o País, ao menos que não sejam um pesadelo para as famílias.
A discussão deste tema, e também da demografia de uma forma mais geral, é recorrente. Há quatro anos, já o governo de Passos Coelho patrocinara um estudo, elaborado por uma comissão independente e coordenado por Joaquim Azevedo, da Universidade Católica, que defendeu várias medidas de incentivo à natalidade. Como se sabe, ficou tudo na mesma…
Está na altura, agora, de traçar um plano que rasgue legislaturas. Se nem nesta questão puder haver consenso, e rápido, é porque os partidos ainda estarão mais podres do que parecem. Que raio: basta serem tão expeditos como são a analisar as questões chamadas de ‘fraturantes’. Não me parece que seja pedir muito.