Afirmou recentemente André Silva (PAN) que “o leite é desumano”, referindo uma decisão da Advertising Standards Authority (ASA), supervisora do mercado publicitário no Reino Unido, a favor de permitir uma campanha da Go Vegan World, que afirmava que “o leite humanizado é um mito, não compre, os vitelos são separados desde muito cedo das mães”.
A decisão da aprovação da publicidade que o deputado do PAN não facultou é muito diferente da lenga-lenga anti-consumo de leite que este escreveu no seu texto de opinião. A campanha foi aprovada apenas porque não “engana materialmente o leitor”, porque para a ASA não é relevante se a separação do vitelo da sua mãe ocorre uma hora antes ou depois do regulamentado.
Pelo contrário, quem enganou o leitor foi André Silva. Começa por dizer que o “leite é desumano”, quando humano e desumano são adjectivos de qualidades intrínsecas do comportamento do ser humano com outros da mesma espécie. Humanidade é o género humano ou a natureza humana (Priberam), da mesma forma que os Direitos Humanos são Direitos inerentes a todos os seres humanos (ONU).
É óbvio que da natureza humana fazem parte qualidades como a compaixão, sendo que esta se manifesta primeiro com outros seres humanos. Ora, é aqui que o pensamento de alguns convivas da Humanidade parece ter perdido o fio à meada. Porquê? Porque se preocupam mais com o bem-estar do reino animal, criando leis e gastando quantidades inusitadas de verbas, enquanto milhões de seres humanos são vítimas, esses sim, de comportamentos desumanos e de atropelos diários aos Direitos Humanos.
Quer isto dizer que podemos ou devemos ser insensíveis ao sofrimento animal? Claro que NÃO. Devemos actuar com o respeito necessário a uma estabilidade duradoura com o reino animal e a Natureza? Obviamente que SIM, até porque a nossa sobrevivência depende disso. Mas tal não quer dizer, como afirmam muitos defensores do PAN, que o ser humano seja o permanente vilão do planeta.
Até parece que os humanos são os únicos a ter uma estrutura de predadores e presas e que no reino animal não existem actos de pura selvajaria, tais como progenitoras abandonarem os seus filhos à nascença, ou matanças em massa de crias acabadas de nascer por predadores, em suma, tal como seria de esperar de animais selvagens.
Os humanos, tendo evoluído para além da selvajaria, mantêm determinados comportamentos de selvajaria, alguns deles na indústria da produção de leite. Mas isso não afecta o consumo, por contraponto ao que afirmou André Silva sobre “consumidores mais conscientes”, por parte de países que são considerados os mais civilizados, como a Finlândia, Suécia, Holanda, Alemanha, Noruega, EUA e Reino Unido – os maiores consumidores de leite e derivados do mundo (FAOSTAT).
Mas se há comportamentos errados na produção, será que existe um motivo subjacente para além da lenga-lenga constante dos lucros? Se o Estado não apertasse tanto a corda dos impostos no pescoço dos contribuintes, que em Portugal subiram ao maior ritmo da UE (últimos 25 anos), se calhar seria possível ter leite obrigatoriamente produzido por processos menos dramáticos, porque os consumidores teriam capacidade para pagar um litro de leite a um euro, em vez dos 50 cêntimos actuais. Não haveria tanta pressão para reduzir custos e criar-se-ia espaço para uma produção mais sustentável.
O problema é que os deputados desumanos de São Bento não perdem muito tempo a pensar como libertar mais rendimento para o contribuinte, preferindo angariar cada vez mais receitas para sustentar as negociatas passadas, presentes e futuras. E nos tempos “livres” ainda têm espaço para criar leis onde os maus tratos a animais são criminalizados, o que concordo, ou que os animais de companhia possam entrar em restaurantes, sejam eles cobras ou iguanas, o que discordo em absoluto.
Já para criar leis de protecção aos idosos não há concórdia, ou para criar uma estrutura social que tivesse impedido o caso da IURD, a violência contra as crianças, a violência doméstica, ou resolver o problema dos sem-abrigo, ou uma supervisão que impeça as “Raríssimas” deste país, ou a corrupção generalizada, ou que tivesse impedido os mais de 20 mil milhões de euros em custos para os contribuintes dos buracos na banca que, recordo, são filhos de pai incógnito até hoje.
Portanto, caro André Silva e restantes parceiros de palácio, antes de negociatas pró-animais, pensem primeiro em como resolver os problemas dos humanos, porque a melhor maneira de garantir melhores tratos aos animais é ter melhores tratos entre humanos, mais humanidade e menos egocentrismo – até porque ter um animal é, em muitos casos, um acto de egoísmo e não de altruísmo.
O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.