Em questões sucessórias, por exemplo, a Igreja tem larga experiência. Quando um papa fica muitos anos na Cadeira de São Pedro, o seu sucessor é frequentemente um líder de transição. Um ancião consensual e respeitável, cuja partida deste mundo seja expectável num futuro mais ou menos próximo, de modo a que a seu tempo venha alguém capaz de conduzir a Igreja a um novo ciclo. Volta e meia, alguns desses papas de transição surpreendem, como João XXIII, que aos 80 anos convocou um concílio revolucionário, mas a maioria cumpre a missão sem levantar grandes ondas.

O PSD prepara-se para eleger o novo líder, que poderá ser um “papa” de transição. Esgotado o ciclo de Pedro Passos Coelho, do memorando da troika e da austeridade, o partido de Sá Carneiro procura agora alguém que aguente o barco pelo menos até às eleições legislativas de 2019, numa altura em que, com excepção da questão dos incêndios florestais, quase tudo parece correr de feição ao Governo.

É certo que Santana Lopes e Rui Rio não se revêem na figura de líderes de transição. Mas será este o papel que a História lhes reserva, a menos que nos próximos dois anos a vida corra muito mal ao Governo. E ao País.

Mas o principal problema que Rio e Santana enfrentam, para além do bom desempenho da economia, que mantém o diabo ao largo, é a irritante sensação de “mais do mesmo” com que o cidadão comum fica ao olhar para estas eleições no PSD. Basta recordar que, há vinte anos, tanto Rui Rio como Santana Lopes já eram vistos como potenciais líderes do partido. O que trazem de novo?

Comecemos por Rui Rio. Paradoxalmente, o ex-autarca do Porto tem contra si aquela que é uma das suas principais qualidades, que é a imagem de homem de rigor e de contas certas. O que há alguns anos seria uma vantagem é agora um ponto fraco, se não for bem gerido do ponto de vista comunicacional. A economia está a crescer, os rendimentos estão a ser devolvidos aos portugueses e já ninguém quer ouvir falar em austeridade e défice zero.

O líder do maior partido da Oposição tem de ser capaz de mobilizar a sociedade portuguesa para implementar uma agenda reformista. Ora Rui Rio, com este discurso fora de tempo, terá dificuldade em fazê-lo. Tal como Passos, Rio é o homem que chamamos quando faz falta pôr a casa em ordem, não quando as coisas aparentam estar bem. O diabo pode até estar ao virar da esquina, mas um líder que fique sozinho a alertar para a vinda iminente do mafarrico não é eficaz. E, não sendo eficaz, de pouco lhe serve ter razão. Tragicamente, é o próprio Rui Rio que se coloca a si mesmo nesse papel, como quando afirma que teria feito “igual ou pior” do que Maria Luís.

Já Santana Lopes é diferente. É um político colorido, vivaço e bom orador, que consegue falar para além da economia e que, nos últimos anos, ganhou o que se costuma chamar de consciência social, à frente dos destinos da Santa Casa. Mas o que nos oferece de novo Pedro Santana Lopes, para além de uma versão mais madura, com um pouco mais de gravitas, do “menino guerreiro” de há 12 anos’?

Claro está que, tal como João XXIII, tanto Rio como Santana podem surpreender. Mas esperemos que, qualquer que seja o vencedor, o PSD aproveite os próximos anos para preparar uma nova geração de líderes, a pensar no pós-2019.