Os dois acordos PS/PSD, sobre descentralização e fundos europeus, são, do ponto de vista político, bons para ambos os partidos.

Se quer alimentar a possibilidade de uma maioria absoluta nas próximas legislativas, António Costa tem de manter o PS como um partido moderado aos olhos dos eleitores. Se não tivesse esse cuidado que está a ter, o PS poderia ganhar votos à extrema-esquerda (como já ganhou ao PCP nas autárquicas), mas seguramente também perderia algum do voto moderado (que fugiu de Passos Coelho). E esse, como está em todos os estudos, foi sempre o voto que decidiu governos e elegeu Presidentes.

Mas, para além disso, este diálogo com o PSD permite a António Costa manter duas vias para continuar no poder se o PS for o partido mais votado, embora sem maioria.

O líder do PS, sendo hábil, pode sempre optar por construir uma “Geringonça 2.0”, que quase de certeza perderá o motor do PCP; mas também pode, desde já, começar a agitar aos seus ainda parceiros com o fantasma de um executivo de bloco central, ditado pelos superiores interesses do Portugal europeísta, ao qual PCP e BE torcem cada vez mais o nariz. Sobretudo Catarina Martins, neste momento em que o BE reflete entre optar por ficar a ‘marcar’ o PCP ou entrar definitivamente na área da governação, vai ter de pesar devidamente esta possibilidade política e histórica.

O PSD, obviamente, também ganha, mesmo que provar o contrário esteja a ser o grande objetivo das viúvas de Passos Coelho, com Luís Montenegro à cabeça, e de Santana Lopes, que nunca desistirá.

Rui Rio sabe que o seu partido sangrou com o prolongado casamento com o CDS/PP, mesmo depois da saída de Paulo Portas. E não sangrou especialmente quando teve de dirigir uma governação difícil debaixo da vigilância da troika. Isso os portugueses, de uma forma geral, com mais ou menos dificuldades, compreenderam. O PSD sangrou, sobretudo, porque se radicalizou nestes dois anos de legislatura, à espera do diabo que nunca chegou.

A estratégia do PSD pode ser resumida, de um ponto de vista minimalista, da seguinte maneira: o partido não pode estar refém do CDS, tem de abrir janelas de diálogo para ambos os lados. Foi assim que o PSD de Cavaco Silva teve duas maiorias, aparecendo como um partido com visão social, capaz de garantir estabilidade, disputando ao PS o espaço da moderação e da Europa. Ou seja, António Costa não está a enganar Rui Rio. Nem Rui Rio está a enganar António Costa.

Ambos os líderes são demasiado entrados na vida para cálculos tão simplistas ou intenções tão ingénuas. A única diferença entre ambos é que António Costa tem o seu espaço sob controlo e Rui Rio está a dar os primeiros passos de mudança no PSD, a instalar-se e a assustar tantos bons sociais-democratas que temem ficar de fora das próximas listas, de deputados e outras.

Neste momento, o que ambos os líderes estão a fazer é política, cálculos, a desenhar cenários e a tentar fazer crescer os respetivos campos. O PS comanda à esquerda. O PSD tem o mesmo poder à direita. Resta ver como, neste jogo de sombras e habilidade, conseguem dividir o centro. É nisso que estão, porque não se descortina nenhuma terceira via. Só mais à frente, nas urnas, se saberá quem ganhou e perdeu.