Há muitos anos tomei uma decisão consciente de não adquirir um carro. Sou e sempre fui apologista da mobilidade pública e ecológica. Senti que podia viver a minha vida a depender de metro, elétrico, autocarro ou comboio. Mas Lisboa, ao contrário de outras cidades europeias com uma rede extensa de transportes públicos, é uma cidade com circulação bastante intensa no centro bem servido de transportes, mas, para os que vivem na periferia, a escolha é insuficiente. Atualmente, com os preços das casas no centro da cidade a disparar devido ao fluxo turístico que ameaça bater todos os recordes este ano, torna-se uma utopia conseguir habitar no centro de Lisboa.

Remetidos à periferia do “império”, os habitantes veem-se a braços com problemas de mobilidade gritantes. Para quem vive nos concelhos de Loures, Odivelas, Amadora ou Oeiras, Sintra e Cascais – sendo estes os mais próximos do concelho de Lisboa –, infelizmente não é possível ter qualidade de vida sem um carro. E isso constitui uma falha grave para uma cidade europeia que pretende captar startups londrinas após o Brexit, mas possui uma mobilidade medieval.

No caso de Oeiras, o exemplo com o qual estou mais familiarizada, o concelho é servido ao longo da costa pelo comboio e por uma rede de autocarros da VIMECA que, na prática, equivale a carreiras lentas que passam pelas vilas do interior do concelho de hora a hora. Isto para não falar da circulação nocturna ou ao fim-de-semana, que é ainda mais deficiente.

A trabalhar no Taguspark desde agosto do ano passado, a aventura para chegar e partir é imensa. Construído em Porto Salvo, o parque de ciência e tecnologia localiza-se num sítio isolado com um mini-clima ventoso. Trabalhar no Taguspark sem carro é, no minímo, um ato de coragem. Táxis, só mesmo chamando por um. Tem varias carreiras a passar de hora a hora até às 19h e exceto uma, nenhuma faz o trajecto em menos de 45 minutos quando, de carro, leva apenas dez minutos. A maioria das paragens no meio de estradas secundárias não contém informações do percurso ou do tempo de espera.

Recordo-me que houve a tentativa do SATUS, uma espécie de elevador que ligava Paços de Arcos ao Oeiras Parque, mas foi abandonado após alguns anos. Tivesse o projeto sido completado até ao Taguspark, como previam, e certamente teria sido mais rentável.

Nestas condições, e à falta de alternativas mais eficazes, sou forçada a assumir derrota e a ponderar a compra de carro. Serei mais uma a contribuir para o problema do trânsito, da poluição e caos, mas, infelizmente, só mesmo quem vive e trabalha no centro tem a ganhar com uma aposta em transportes públicos.

Dizem-me que os próximos anos vão trazer grandes transformações no campo da mobilidade, mas ainda estão restringidas aos centros. Esquecem-se que grande parte da população é empurrada para a periferia. Ora, por mais que tentem maquilhar a cidade, Lisboa nunca fará parte das grandes capitais europeias se os municípios e o Estado não apresentarem planos para um futuro sem dependência de carros.