Foi em Março de 2016 que o Banco CTT inaugurou os seus primeiros 52 balcões, aproveitando os espaços existentes nos correios nacionais. Dois anos depois, chegou aos 300 mil clientes, tem 255 mil contas de depósitos à ordem e está presente em 211 espaços.
Segundo uma nota de research publicada pela CaixaBI, é do Banco CTT, no médio prazo, que poderá vir a maior mudança no perfil de negócio da empresa. E é o Banco CTT que poderá vir a ser a principal alavanca para que a empresa aumente o desempenho operacional e suporte a remuneração aos accionistas.
Curiosamente, dois anos depois, apesar da história de sucesso e das expectativas elevadas depositadas no Banco CTT, os trabalhadores continuam sem beneficiar de um acordo colectivo de trabalho que clarifique as suas carreiras, ou mesmo de um acordo de empresa. Apesar de convidada em devido tempo a abrir negociações para o efeito, a administração dos CTT, liderada por Francisco de Lacerda, tem empurrado, de forma algo sobranceira, o assunto com a barriga.
Um desinteresse aparente pelos direitos dos trabalhadores que contrasta com a preocupação de Francisco de Lacerda com a remuneração dos accionistas. Desde a sua privatização, entre 2013 e 2014, os CTT têm vindo a remunerar generosamente quem neles investiu. No final do processo de privatização, o Estado encaixou cerca de 909 milhões de euros. Ora, nesta altura, os accionistas já receberam em dividendos cerca de 329 milhões de euros. A preocupação de Francisco de Lacerda com os accionistas é tanta que nos últimos anos tem distribuído dividendos acima dos lucros registados. Em 2017, a situação atingiu o limiar do escândalo com uma distribuição de dividendos que foi duas vezes superior aos lucros, i.e. um payout de 209%.
É verdade que os CTT já fizeram saber que vão regressar a uma política de remuneração accionista mais equilibrada e, por isso, baseada numa percentagem do resultado líquido gerado anualmente. Em todo o caso, importa que o regulador esteja atento perante sinais de aparente descapitalização da empresa.
Sejamos claros, os CTT, por iniciativa própria da sua administração ou por discreta intervenção das autoridades de supervisão, têm também de assegurar uma política de reinvestimento dos lucros e não apenas a remuneração prioritária dos accionistas.
Nestes últimos anos, os trabalhadores, nomeadamente os do Banco CTT, têm sido o elo mais fraco na hierarquia das prioridades de Francisco de Lacerda. Esta ordenação das prioridades, de forma tão assimétrica, estará mais próxima do modelo capitalista norte-americano, mas não seguramente da cultura europeia que privilegia outro tipo de equilíbrio entre os interesses dos trabalhadores e dos accionistas.
Por isso, ou também por isso, é inadmissível que os trabalhadores do Banco CTT continuem ainda hoje sem ter as suas carreiras devidamente clarificadas. Dirão alguns leitores que estarei a ser demasiado duro. Talvez assim seja. Compete a Francisco de Lacerda provar que estou errado.
O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.