Já sabemos que enquanto uns têm a EMEL à perna, a Madonna tem um terreno cedido pela Câmara Municipal de Lisboa.

Enquanto os encarregados de educação têm na sua morada fiscal o ponto determinante para inscrever os filhos na escola, a dos deputados é irrelevante para receberem os subsídios.

Enquanto no privado há despedimentos por extinção do posto de trabalho, no público há “bolsas de mobilidade”.

Enquanto os juízes do Tribunal Constitucional – sim aquele mesmo que garante a equidade entre os cidadãos – podem reformar-se aos 40 anos e 10 de trabalho, o comum cidadão só pode reformar-se aos 66 anos e 5 meses!

É este o país que temos. Para um pequeno grupo, tudo, para a vasta maioria, o suficiente para garantir o tudo do grupo anterior.

Agora temos de regresso o tema das 35 horas de trabalho semanais. Aquele número de horas que se aplica apenas a alguns porque, neste caso, nem sequer é transversal a todos os funcionários públicos.

Mas o que representam as 35 horas semanais?

De forma muito simples, representa uma redução de 12,5% do tempo de trabalho. Mas se o cálculo matemático é simples, já a sua repercussão na produtividade é complexa. Porque ou o número de horas de trabalho que se vê reduzido é compensado em produtividade – e não há história que o indique como possível –, ou a quantidade e qualidade dos serviços prestados deteriorar-se-ão (mais ainda). E, acredito, que de forma mais acentuada do que a sua proporcionalidade simples poderia antever.

De acordo com a Pordata, considerando-se 100 o índice de produtividade da UE28, Portugal situava-se em 2016 nos 68.3 (contra  67.3 em 1995). Já a Irlanda, que passou por um período menos bom também, assume um parâmetro de 178.7 (contra 105 em 1995). A Irlanda é aliás o nº 1 desta tabela. Também encontramos Itália com 101.8 e Espanha com 97.8. Não temos muito por onde nos orgulharmos, mas bastante para nos preocuparmos.

Mantendo-se a produtividade um problema em Portugal, como é que a redução das cinco horas por semana serão compensadas? A esquerda diz que com a criação de novos postos de trabalho. Sendo assim, teremos um dois em um. E todos beneficiam: os que trabalham passam a trabalhar menos tempo, e os que não trabalham passam a ter o seu emprego.

Aparentemente, o cenário não podia ser melhor. Não faltasse o dinheiro para pagar isto tudo. O mesmo valor por menos trabalho (uma vez que a produtividade dos trabalhadores não compensa a redução horária) e um valor adicional pelo novo trabalho.

As cinco horas de trabalho “extra” só podem ser compensadas de duas formas – ou novas contratações ou recurso a trabalho extraordinário. Neste último caso, seria curioso, ou seja, o trabalho “extra” só se torna uma impossibilidade quando não é pago ao preço a que o pretendem ver pago.  A questão não é por isso física, mas sim financeira.

Isto quando a questão se coloca essencialmente ao nível dos profissionais de saúde, e numa altura em que as greves atingem o maior número de sempre. Nem mesmo durante a troika assistimos a tantas graves.

Mais um aspecto onde a dualidade impera – as greves só acontecem no sector público. Sejam médicos, enfermeiros, professores ou motoristas, quase não tenho memória de uma greve no sector privado. Isto quando também sabemos que a média salarial na função pública é mais elevada que no sector privado… Há, pois, qualquer coisa neste país que me escapa.