A par da guerra na Ucrânia, as últimas notícias têm sido dominadas pela instabilidade económica e do sistema financeiro.
As subidas das taxas de juro, o controlo da inflação, o aumento do custo de vida, em especial no setor alimentar, os sinais de alarme dados por alguns bancos europeus e a falência de bancos americanos que tiveram de ser rapidamente intervencionados pelas entidades reguladoras de modo a evitar contágio e uma repetição da crise de 2008.
Graças à desregulação bancária promovida sob a égide da administração Trump, os bancos que hoje revelam má gestão de risco viram-se rapidamente fragilizados com a abrupta subida das taxas de juro.
Mas o propósito desta crónica não é analisar os meandros deste sistema, nem eu possuo conhecimentos sólidos para fazer essas análises. Posso apenas ler as notícias e tentar descortinar a realidade de um sistema que há muito se fechou no seu próprio mundo alternativo, com uma linguagem também ela alternativa. E isso não seria problemático não fosse o simples facto de muitas dessas decisões afetarem a vida das pessoas de formas que nem sempre conseguem controlar.
A linguagem hermética do “economês” inibe a população de tomar decisões mais esclarecidas e de estar mais consciente dos seus direitos. Todos nós ainda nos recordamos da devastação que se seguiu ao colapso do Lehman Brothers em 2008, que deixou marcas em todas as áreas.
A forma mais rápida de criar ressentimento popular contra as elites governantes é apontar as injustiças e desigualdades nos casos em que os bancos foram salvos ou nacionalizados. Aliás, ainda hoje o caso do ex-Banco Espírito Santo é uma espinha cravada na garganta dos portugueses, que causou danos irreparáveis que minaram a confiança dos cidadãos nas instituições. A revolta e a raiva, grande parte dela justificada, acaba por ser o combustível que dá palco aos demagogos-populistas.
E se tivéssemos uma sociedade mais informada e menos dada à iliteracia económica e financeira? Se compreendêssemos melhor o que está em jogo, teríamos previsto a crise e recessão de 2008? Se aprendêssemos desde cedo como o sistema funciona, em vez de deixarmos tudo nas mãos de uma minoria que se protege apenas a si própria, teríamos sido mais poupados à tempestade?
De acordo com dados divulgados pelo Banco Central Europeu, em 2020, Portugal ocupava a última posição do ranking de literacia financeira dos 19 países da zona euro. É um enorme problema que temos em mãos quando a população desconhece como desenvolver melhores hábitos de poupança, como tomar as decisões financeiras certas junto de instituições bancárias, como recorrer ao crédito sem riscos e com maiores precauções, como calcular o rendimento ou como identificar e compreender como funcionam certos impostos e taxas.
Dar mais conhecimento é dar mais poder de decisão às pessoas para controlarem as suas vidas e não serem apanhadas numa turbulência altamente prejudicial.
O mercado não quer promover inclusão financeira porque sabe que quanto mais ignorantes formos na altura de assinar papéis, mais facilmente os clientes caem numa rede que esconde os riscos e exagera os benefícios. E embora tenhamos visto alguns esforços de tornar a linguagem económica e financeira numa linguagem cada vez menos direcionada para especialistas, ainda temos um longo caminho a percorrer.
É demasiado perigoso manter este tipo de exclusão num mundo polarizado, em que a desinformação digital é deliberada e usada como arma pelo anarcocapitalismo.