Num contexto de aumento das taxas de juro, o montante de novas operações de crédito à habitação, excluindo renegociações, foi mais baixo no quarto trimestre de 2022, face ao período homólogo, mantendo-se ainda assim acima do valor do mesmo trimestre em 2019, revela o “Relatório de Acompanhamento da Recomendação macroprudencial sobre novos créditos a consumidores” emitido esta sexta-feira pelo Banco de Portugal.
De acordo com o Inquérito aos Bancos Sobre o Mercado de Crédito, a partir do segundo semestre de 2022, os critérios de concessão de crédito à habitação tornaram-se ligeiramente mais restritivos e a procura pelo mesmo tipo de crédito reduziu-se. O montante destas novas operações reduziu-se de 3.707 milhões de euros no quarto trimestre de 2021 para 3.160 milhões no quarto trimestre de 2022, embora acima do valor do mesmo trimestre em 2019 (2.833 milhões de euros), segundo o mesmo relatório.
Já as novas operações de crédito à habitação, excluindo renegociações, caíram 14,8% no quarto trimestre de 2022, o que compara com um crescimento de 19,0% no quarto trimestre de 2021.
Por outro lado, o montante de novas operações de crédito ao consumo, excluindo renegociações, que ascendia a 1.203 milhões de euros no final de 2021, aumentou para valores em torno de 1.300 milhões de euros por trimestre e nos três primeiros trimestres de 2022. No entanto, no último trimestre do ano, este montante diminuiu para valores semelhantes aos do final de 2021 (1.187 milhões de euros). Para este tipo de crédito, a taxa de variação anual diminuiu desde o seu pico no segundo trimestre de 2021, de 79,6%, para -1,3% no último trimestre do ano.
O Banco de Portugal revela que, globalmente, o montante das novas operações de crédito às famílias, excluindo renegociações, diminuiu de 4.910 milhões no quarto trimestre de 2021 para 4.347 milhões de euros no mesmo trimestre em 2022. Ainda assim, este valor é superior ao observado no quarto trimestre de 2019 (4.295 milhões de euros).
Por outro lado, os bancos inquiridos reportaram uma diminuição significativa da procura de crédito por parte de particulares, mais forte no crédito à habitação, desde o segundo semestre de 2022.
O Banco de Portugal garante que é um problema de procura que caiu dado o contexto económico de subida de taxas de juros. “A diminuição da confiança dos consumidores, o aumento do nível geral das taxas de juro e, em menor grau, as perspetivas para o mercado da habitação foram os fatores identificados pelos bancos como os principais determinantes da redução da procura de crédito pelos particulares”, lê-se no relatório.
A maioria do crédito à habitação é concedida a taxa variável, sendo os contratos indexados à taxa Euribor os mais comuns. Atualmente, situando-se este indexante num nível muito baixo, os bancos são obrigados a calcular cenários de stress que incluem aumentos à taxa de juro e reduções ao rendimento no cálculo do DSTI (taxa de esforço).
O Banco de Portugal põe em cima da atual taxa de juro mais 300 pontos base para calcular a taxa de esforço dos clientes no momento de conceder crédito à habitação e isso pesa na fatura dos clientes, o que pode explicar a queda da procura. A possibilidade de esse cenário de stress, de 300 pontos base, ser revisto em baixa uma vez que a Euribor já está acima de 3%, foi admitido já pelo BdP. Mas não há datas para essa alteração da medida macroprudencial.
Tal como está descrito no site do BdP, a consideração no cálculo do DSTI de um aumento de 3 p.p. aplicado ao indexante de referência, em empréstimos a mais de 10 anos, pretende evitar que a subida esperada da Euribor coloque o empréstimo num patamar de risco excessivo, podendo conduzir ao incumprimento no crédito.
Para o cálculo do DSTI de empréstimos com maturidade inferior ou igual a 10 anos é considerado um aumento menor na variação da taxa de juro, uma vez que a probabilidade de a taxa Euribor registar um aumento de 3 p.p. num período de tempo mais curto é menor.
De acordo com o Inquérito aos Bancos Sobre o Mercado de Crédito, em 2022, houve, por um lado, um ligeiro aumento da proporção de pedidos de empréstimos rejeitados.
Novas operações de crédito à habitação concentradas em clientes com rendimento mensal líquido superior a 1.200 euros
Em 2022, à semelhança de anos anteriores, é possível ver que o crédito à habitação se encontra concentrado em devedores com rendimento líquido mensal superior a 1.200 euros, enquanto o crédito ao consumo se encontra mais concentrado em mutuários com rendimento líquido mensal entre 600 e 2.400 euros, segundo o inquérito levado a cabo pelo BdP.
Entre o terceiro trimestre de 2018 e o final de 2022, “observou-se uma tendência de redução da percentagem de novas operações de crédito à habitação, que se acentuou em 2022, associadas a mutuários com rendimentos mensais líquidos inferiores a 1.200 euros”, conclui o relatório que adianta que “em contrapartida, ocorreu um aumento da percentagem do crédito a mutuários com rendimentos mensais líquidos superiores a 2.400 euros, sendo mais expressivo o crescimento ocorrido no escalão de mutuários com rendimento superior a 4.600 euros”.
De 2018 a 2021, houve uma diminuição da percentagem de novas operações concedidas a mutuários com um rácio DSTI superior a 50%, calculado de acordo com a Recomendação, e com rendimentos líquidos mais baixos. Já em 2022, para os níveis mais baixos de rendimento, observa-se uma ligeira redução da percentagem de novos contratos de crédito à habitação concedidos a mutuários com um rácio DSTI superior a 50%.
Preços do imobiliário continuam a aumentar mas essa subida desacelerou no último trimestre
No mesmo período, os preços do imobiliário residencial continuaram a aumentar. Observou-se uma evolução distinta dos preços da habitação, relativamente à do crédito.
A taxa de variação anual dos preços da habitação aumentou nos três primeiros trimestres de 2022, de 11,6%, no último trimestre de 2021, para valores à volta de 13%. No entanto, no último trimestre de 2022 observou-se uma desaceleração dos preços da habitação com uma taxa de variação anual de 11,3%.
A percentagem de transações de imobiliário residencial financiadas por crédito interno permaneceu estável no período entre 2018 e 2022, em torno de 46%. Este valor é significativamente inferior ao registado no período anterior à crise da dívida soberana (76% em 2009-10). O período prolongado de baixas taxas de juro, o aumento da procura de habitação por não residentes e a oferta limitada de habitação contribuíram para este aumento, explica o relatório do Banco de Portugal.
No entanto, “conjuntura atual, caraterizada por um aumento do custo do crédito e de expectativa de continuação de subida das taxas de juro, e pela potencial perda do rendimento real das famílias, poderá traduzir-se numa moderação do crescimento dos preços do imobiliário residencial, através da redução da procura de habitação tanto pelos residentes como pelos não residentes”, refere o banco central.
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