Em 10 de Fevereiro, escrevi aqui um artigo intitulado “O Vietname deste Governo”, após uma sucessão de episódios espoletados pela pornográfica indemnização de Alexandra Reis na TAP, que desfizeram um ministro poderoso e maceraram a reputação de outro, deixando o Executivo num profundo descrédito, em que foi visível a falta de controlo político e da agenda mediática do próprio António Costa.
Na semana passada, a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) à TAP trouxe um gigantesco tsunami com as audições de Christine Ourmières-Widener e Alexandra Reis, que provaram a quem tinha dúvidas que a companhia aérea é, verdadeiramente, o “Vietname” deste Governo.
Foi um rolo compressor que atingiu mais dois ministros, João Galamba e Ana Catarina Mendes, e um manancial de leviandades, incompetências e falta de sentido de Estado que agravaram o clima de indignação e desconforto de qualquer português decente, a não ser dois ou três cartilheiros que agora a máquina de comunicação do Governo semeou nas televisões e que ainda tornam mais risível e odioso o deboche em que se tornou a TAP.
Para lá da pornochachada de um secretário de Estado, Hugo Mendes, que se revelou um verdadeiro mentecapto ao escrever um mail sobre um “favorzinho” que se devia fazer ao Presidente da República porque ele era “amigo do Governo”, como se Marcelo Rebelo de Sousa, com muitos defeitos que tenha, alguma vez fosse pedir para se prejudicarem outros clientes da TAP para facilitar a sua vida.
Um autêntico nojo, que expôs ao grau zero a necessidade de um escrutínio muito maior sobre indivíduos que são escolhidos para desempenharem funções públicas. Só que esta criatura até deu jeito para ser mostrada a sua cabeça (que já não estava no Governo) para acalmar as hostes.
No bailado de bodes expiatórios (como assim designei no podcast “Maquiavel para Principiantes”), este foi o bode expiatório mais útil neste momento, para tentar sacudir a água do capote do primeiro-ministro, que demorou uma semana a pronunciar-se. A única coisa que tinha dito antes da CPI foi que “a verdade tinha de ser apurada doa a quem doer”. Acontece que hoje essa proclamação soou ao histórico lavar de mãos de Pôncio Pilatos, como se não quisesse saber do assunto nem envolver-se nele, como os seus conselheiros de imagem o aconselharam para não se enlamear com a TAP.
Porém, António Costa devia saber que quando uma orquestra desafina e toca mal, a culpa não é apenas dos instrumentistas. O maestro é o principal responsável e é ele que tem de prestar contas e não apenas pedir desculpas.
Compreendo que esteja ele próprio indignado, face ao triste espectáculo que continua a decorrer. Compreendo que esteja visceralmente magoado e incomodado por Pedro Nuno Santos ter saído do Governo e mantido um ensurdecedor silêncio, quando foi ele o responsável máximo por tudo o que de mau aconteceu neste dossier, para lá da ausência de sentido de Estado na condução de um processo sensível por WhatsApp e emojis. E ainda falta o ex-ministro ir ao Parlamento…
Mas há uma certeza: um menino mimado que gere ao estilo de criança não pode ter credibilidade para ser líder num Governo de homens. António Costa era o único que já sabia disso de antemão.
O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.