A crescente tensão entre os EUA e algumas instituições e países europeus pode contribuir para o reforço de uma Europa mais unida e politicamente mais determinada, em vez da fragmentação que alguns anunciam. A começar por Donald Trump, que tem real interesse na divisão, e continuando por aquele que não o anuncia mas deseja, Vladimir Putin.

O ambiente é sombrio e o ar rarefeito. Cercada por um Brexit que não se clarifica e do qual ninguém vai beneficiar, ou considerando o incremento da representação parlamentar de nacionalistas, extremistas e xenófobos, assentes num basismo primário que partiram da crise financeira e que, nos socalcos do “euro”, criaram as condições para instalar receios variados, não totalmente desvanecidos. Incluindo aqui as hesitações face à Rússia, que continua a condicionar a situação europeia, quer política quer economicamente.

O cenário parece ser de crise. O cinzentismo político britânico, a busca sucessiva de uma posição mais consensual, mesmo que minimalista, sobre os migrantes e refugiados, e o reforço das decisões da política orçamental e económica contribuem como nunca para que, assente no máximo denominador comum (ou no mínimo divisor comum), se possa engrossar fileiras e assumir posições conjuntas, nomeadamente em política externa.

O conflito comercial com que os EUA desafiam o mundo, permite que os europeus encontrem facilmente novos aliados: Japão, Canadá, Coreia e até a China, com quem poderão concluir com rapidez novos tratados comerciais e de cooperação mais próxima. Com as suas proclamações para consumo interno, e enquanto se entretém com os russos, os americanos regressam ao protecionismo bacoco que deu maus resultados num passado não tão distante.

A Europa pode assim estar à porta para entrar num trilho de oportunidade, na conquista de novos mercados, assumindo políticas concertadas e coordenadas com natureza duradoura. Serão marcadas por necessidade, mas também pela força da sua qualidade de concertação.

Fazer frente às posições americanas não agrada seguramente a alguns empresários, principalmente alemães e franceses. Mas tal não deve permitir que se transija na defesa dos pilares em que assentam os princípios fundamentais da carta europeia de solidariedade, liberdade e democracia.

Os dirigentes europeus, comunitários (Juncker, Tusk e António Tajani) e de estados membros (Macron, Merkel ou Conte) têm de fazer voz grossa e olhar duro às iniciativas unilaterais dos americanos.

Não é a primeira vez que os EUA assumem o protecionismo. Ciclicamente, nos últimos cem anos, os americanos fecharam-se ao mundo amarrotando-se a si mas beliscando os parceiros. Depois arrependem-se e regressam.

A Europa não tem de gritar ou sequer levantar a voz. Tem de ser firme perante todos os que apostam na sua divisão. Os governos europeus estão obrigados a entenderem-se, para bem dos seus cidadãos.

Não é tempo de romantismo. É tempo de oportunidade e calculismo. Momento raro de fixar uma nova cultura e espírito de união. Construído na adversidade, criando orgulho e respeito nacional e coletivo. Oportunidade de assumir a força acima das individualidades nacionais, para bem dos estados e dos cidadãos.