As subidas de taxas de juro pelo BCE estão a abrandar a economia da zona euro, tendo contribuído para uma recessão técnica no final do 1º trimestre. Ainda que Portugal tenha escapado, tendo mesmo tido um crescimento excepcional nesse trimestre, tem-se elevado as vozes contra aumentos adicionais das taxas de referência, pelo risco de afectarem as famílias e inclusive de criarem uma recessão mais profunda.

Na verdade, a maior parte destas declarações públicas não passa de manobras de puro marketing político, estando os seus autores mais do que cientes de que o banco central europeu tem que ser independente dos poderes políticos, tal como estes escolheram estabelecer no Tratado de Maastricht, em 1992. Por maioria de razão, não poderia ceder, sobretudo a pressões feitas na praça pública, às autoridades de um país que representa cerca de 2% do PIB da zona euro.

Mas será que, ainda assim, estas reclamações fazem sentido? O recente surto de inflação é, de longe, o mais significativo dos últimos 40 anos nos principais países que vieram a integrar a zona euro. Em Portugal, nos últimos 40 anos tivemos seis recessões (1984, 1993, 2003, 2009, 2011-2013, 2020), a mais suave das quais foi a de 2003, com uma queda de apenas 1% do PIB. Para além disso, será útil recordar que a inflação de 2022 produziu uma perda salarial de 6%, impensável num contexto de baixa inflação.

O BCE começou tarde a subir as taxas de juro e seria claramente mau que terminasse este ciclo de subidas de forma prematura, arriscando uma recaída, que voltaria a exigir novas subidas de taxas, prolongamento o sofrimento quer da inflação (a doença), quer da terapia.

Em termos económicos, é trivial dizer que a subida das taxas de juro gera o risco de recessão, porque o objectivo daquela subida é abrandar a economia. Num dos casos mais referidos, os EUA no início dos anos 80, a Reserva Federal assumiu o propósito de gerar uma recessão, que se revelou mais prolongada e profunda do que o inicialmente antecipado, sem ter havido hesitações sobre a dureza do tratamento.

Regressando à zona euro em 2023, correr o risco de ter a recessão menos pronunciada dos últimos 40 anos para corrigir o maior problema de inflação deste período não parece excessivo.

Na verdade, como o FMI já avisou, será até mais provável que o BCE tenha que vir a temperar o controlo da inflação com a estabilidade financeira, que está ameaçada pela subida das taxas de referência.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.