O pedido de destituição do Presidente João Lourenço por parte do Grupo Parlamentar da UNITA serve como uma excelente oportunidade para reafirmar a minha tese, segundo a qual o Presidente da República de Angola deve ser sempre líder do seu partido. Esta é uma regra subjacente à mecânica do sistema de governo e quem tentar alterá-la ficará sempre à mercê das jogadas do líder do seu partido.

Vejamos, por exemplo, o cenário de o Presidente João Lourenço ser confrontado com uma acção de destituição não sendo o líder do MPLA (hipoteticamente falando, claro). À luz da lógica formal subjacente ao princípio da separação de poderes, o Presidente não deve interferir nas decisões de um outro órgão de soberania, sobretudo no decurso deste processo. Podendo, em todo o caso, utilizar o mecanismo da auto-demissão e provocar novas eleições. Mas, depois da revisão constitucional de 2021, ao recorrer a este mecanismo ficaria impedido de concorrer para um novo mandato. Não obstante, este pedido de auto-demissão estaria, sempre, sujeito à sindicância do Tribunal Constitucional, conforme defende Marcy Lopes (Ministro da Justiça).

Quem reagiu de forma energética ao pedido da UNITA foi o Bureau Político do MPLA, que é presidido por João Lourenço. Demonstrando que a sua luta (interna) para conquistar a liderança do MPLA sempre esteve (e está) ligada à manutenção do seu lugar enquanto líder do sistema político angolano.

Este episódio político desencadeado pela UNITA deixa patente que quem defende uma separação estanque entre a eleição do Presidente da República e a realidade partidária não considera os efeitos do afastamento do PR da vida interna do seu partido na estabilidade governativa do país. Porque a actual configuração da eleição do PR serve, desde logo, para assegurar uma base parlamentar que garanta a realização da sua agenda governativa. Caso contrário, teríamos os mesmos efeitos político-institucionais do sistema presidencialista brasileiro, no qual o PR está obrigado a negociar com os diversos grupos parlamentares por cada iniciativa e onde a indecisão se torna regra e prática constante.

No caso angolano, a situação torna-se mais complexa devido à estruturação bipartidária – ou seja, os líderes do MPLA e da UNITA beneficiam de amplos poderes de orientação dos seus deputados. Por exemplo, Adalberto da Costa Júnior ordenou que os deputados da UNITA partilhassem 50% do subsídio da instalação.

Em Angola, ser presidente do partido, quando se foi eleito PR, é muito mais do que um exercício de vaidade política, é mesmo uma necessidade de garantia da estabilidade governativa.