Se tudo correu como esperado, a reserva Federal dos EUA (Fed) não mexeu na taxa de juro. Na véspera da decisão a probabilidade é 98,2%, contra 1,8% de a descer um quarto de ponto. Desta vez, mais do que nas outras, o que é importante não é o que vai ser feito, é o que vai ser dito – to talk is cheap, until you are the president of the Federal Reserve.
A política monetária americana está numa encruzilhada. Por um lado, o caminho é claro: há que continuar o unwind do quantitative easing, inflação – presente e futura – oblige. Mas por outro, mexer na taxa de juro hoje é ir ao casino.
Os sinais são confusos: a taxa de inflação em setembro permaneceu nos 3,7%, enquanto se esperava uma descida para 3,6%, mas já a taxa core cumpriu as expectativas; o PIB do trimestre cresceu em termos anuais 4,9%, um valor que não se via em mais de dois anos, desde a recuperação do Covid, mas 3,6% são explicados pelo consumo (diz o “New York Times” que a Fed não assustou os halloween shoppers) e 1,3% vêm da variação de stocks, com o investimento (incluindo residencial) a contribuir com quase nada, um perfil menos saudável.
Somando as incertezas da situação na Ucrânia e no Médio Oriente, Powell e Cia. ficam sem saber para onde se virar. Portanto, a Fed dirá “passo”, como fez o BCE e vai fazer o Banco de Inglaterra. Não vai haver a falada última subida dos juros, face ao risco de um hard landing, e ficamos com uma inflação um pouco mais alta, mas isso até dá jeito ao governo americano, pois reduz em termos reais os encargos com a dívida pública.
Porém, esta é apenas a ponta do icebergue. A Fed tem tentado arrefecer a economia (implementou a mais rápida subida da taxa de juro em décadas), que continua a crescer vigorosamente, criando uma procura de trabalho que varia de 1,5 a 2 vezes o desemprego. A inflação responde devagar e pouco, claro. E a política fiscal é insustentável – há um défice orçamental em pleno emprego –, o que devia estar a agir pelo lado das expectativas. Portanto, a questão é, mesmo dentro da Fed, se os modelos económicos tradicionais não estão ultrapassados? No fim de contas, é bem possível que as experiências não convencionais tenham deixado marcas, sem falar na Lucas Critique.
Isto vai dar um interesse redobrado à conferência de Powell depois do anúncio dos juros: que vai acontecer a partir daqui? Será o momento Alan Turing, tentar descodificar o fedspeak de Powell, que quem mais depressa e certo adivinhar vai fazer muito dinheiro num mercado de capitais que tem estado debaixo de pressão.