O ano de 2023 foi mau para os prognosticadores. Aquilo que antecipavam como uma desgraça acabou por merecer um “suficiente mais”. Os papões da recessão, inflação, desvalorização de carteiras acabaram por não se concretizar. Não houve dilúvio, talvez porque alguém se esqueceu de pagar a conta da água, mas n’empêche…
Com efeito, o cenário traçado era de uma recessão generalizada, da economia americana à chinesa. Nove em cada dez estrelas davam por certo um hard landing dos EUA, que foi sucessivamente adiado até hoje ser defendido só por um punhado de irredutíveis.
A taxa de desemprego está ao nível mais baixo de décadas (quase metade da herdada de Trump), o crescimento a 4,9% homólogo e os salários reais aumentam moderadamente: 6,49% para 6,19% da média 1960-2023. A evolução é favorável também na inflação, que passou uma boa parte de 2022 acima dos 8% e era dada como impossível de domar a curto prazo. Já vamos nos 3,1%.
Olhando para trás, a experimentação de Bernanke na política monetária não convencional pagou, o que, diga-se de passagem, só tornou mais difícil a missão de Powell, que está às apalpadelas, no mais puro walrasianismo, a descobrir o caminho contrário. Powell que, diga-se, merece uma medalha por cumprir uma tarefa que poucos acreditavam realizável e que fez contra Trump, resistindo ao que só não foi um canto de sereia do Presidente porque ele não tem nada de sereia e só grita, não canta.
Mesmo se por um capricho do destino Trump ganhar as eleições (já esteve mais longe de o conseguir), não vai refazer o Make America Great Again que impôs no passado, face aos rearranjos regionais que estão em curso – e de que o plano chinês para integração de Taiwan anunciado em setembro é só mais um sinal.
As economias americana e europeia vão estar mais interdependentes que nunca, a todos os níveis, da economia à defesa, onde a NATO se torna cada vez mais imprescindível para os EUA e para nós, europeus. Até o Donald sabe que a única MAGA que teremos a médio prazo será a Patalógica.
Mas ainda não dobrámos o Cabo das Tormentas. Resta ver o que vai acontecer: como vamos lidar com os Houthis, que ameaçam 12% do comércio internacional e mais de 60% do movimento de contentores, e o que vai acontecer no Médio Oriente; como e com que apoio a Ucrânia vai resistir; se os EUA vão descobrir o caminho marítimo para um défice sustentável e que cabeçadas mais vai haver no Congresso; e quando vai a taxa de juro começar a descer. Prognósticos?