A “Super Convenção”, denominada Convenção Multilateral para Prevenir a Erosão das Bases Tributáveis e a Transferência de Lucros (ou MLI, acrónimo de Multilateral Instrument), entrou oficialmente em vigor a 01 de julho de 2018, após o depósito dos primeiros cinco instrumentos de ratificação junto da OCDE.

Apesar de representar um marco importante no combate da erosão da base tributável e da transferência de lucros, qual será na prática o impacto deste instrumento multilateral nos operadores económicos?

As convenções bilaterais para evitar a dupla tributação sempre tiveram um papel relevante nas decisões dos operadores económicos, ao estruturarem os seus negócios e nas decisões sobre a escolha do destino dos seus investimentos. Portugal é signatário de 77 destas convenções.

Por oposição às convenções bilaterais, que se pautam por longas negociações seguidas de procedimentos constitucionais de ratificação, o MLI vem permitir a alteração de um vasto conjunto de convenções bilaterais através de uma única negociação e aplicação, representando assim uma muito útil ferramenta de atualização automática da rede de convenções de cada estado signatário.

Em junho de 2017, os estados participantes (incluindo Portugal) procederam às respetivas escolhas das diversas medidas incluídas no MLI (algumas opcionais), tomando assim a sua posição técnica relativamente a diversos dos preceitos e afirmado eventuais reservas à sua aplicação. Antecedendo a formalização do MLI, todas as jurisdições passaram por um processo autodenominado speed-dating, que permitiu ajustar as escolhas às características da respetiva rede de convenções.

Entender a forma como o MLI afetará cada convenção não é fácil. No entanto, com as primeiras alterações de tratados a perspetivarem-se já em janeiro de 2019, começarão a dar-se os primeiros passos concretos.

Relativamente a Portugal, será apenas uma questão de tempo para que se iniciem os procedimentos internos de ratificação. Quando estes estiverem concluídos e o instrumento de ratificação depositado junto da OCDE, o MLI será, em termos gerais, aplicável no ano seguinte à sua entrada em vigor, afetando apenas as convenções com jurisdições que tenham também depositado a ratificação.

O MLI foi desenhado para ser flexível e acomodar posições diferentes dos estados em todas as disposições que não representem standards mínimos.

Do ponto de vista prático, o top 3 de preceitos do MLI que devem ser tidos em conta pelos operadores, são:

(1) Prevenção do uso abusivo de uma convenção sob a forma do Principle Purpose Test (PPT): trata-se de um standard mínimo e de uma mudança de paradigma como mecanismo dirigido a evitar situações de treaty shopping; 

(2) Alteração da definição de estabelecimento estável, em especial, relativamente ao conceito de agentes dependentes. As normas do MLI procuram especialmente prevenir a formação de estruturas comissionistas e outras estratégias com o escopo de elidir uma presença tributária no estado da fonte. Importa salientar que um considerável número de estados (entre os quais Portugal) não acolheu este preceito;

(3) Mecanismo de arbitragem tributária obrigatória e vinculativa. O mecanismo de arbitragem visa acelerar a resolução de disputas, através de um painel independente de arbitragem, cuja decisão é vinculativa.

Não restam dúvidas de que o MLI terá grande impacto na substância e na forma das convenções tributárias, pelo que se torna fundamental monitorizar a interpretação dos preceitos do MLI numa base individual de modo a entender o impacto real desta “Super Convenção”.